Além de minimizar as emissões de gases, é preciso se adaptar ao aquecimento global, diz Koffi Annan
2006-11-21
A adaptação aos padrões climáticos alterados é chave nos esforços para enfrentar o aquecimento do planeta, sem deixar de lado as iniciativas para reduzir as emissões de gases que causam o efeito estufa. Está é a conclusão de um informe apresentado ao término da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que terminou sexta-feira na capital do Quênia. As políticas em relação ao clima se concentram até agora em tentar minimizar esse fenômeno global reduzindo as emissões dos gases estufa, diante da urgência de reduzir os efeitos, diz o documento “Tecnologias para a Adaptação à Mudança Climática”, da Secretaria da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, de 1992.
Entretanto, delegados presentes ao encontro de Nairóbi afirmaram que minimizar e adaptar-se devem estar de mãos dadas caso se deseje lidar de forma efetiva contra a mudança climática, uma visão compartilhada pelo secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Koffi Annan, que deixará o cargo no próximo mês. “Embora tenhamos de tentar reduzir as emissões, ao mesmo tempo devemos fazer mais para nos adaptarmos ao aquecimento global e aos seus efeitos. Devemos dar máxima prioridade à incorporação dos riscos que supõe a mudança climática em estratégias e programas que visam o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da ONU”, afirmou Annan na semana passada em entrevista coletiva.
Os chefes de Estado e de governo dos países-membros das Nações Unidas se comprometeram na Cúpula do Milênio de 2000 a superar os desafios fundamentais do desenvolvimento, sintetizados em oito objetivos a serem atingidos até 2015, em relação a valores e índices registrados em 1990.
Os oito objetivos incluem reduzir pela metade a proporção de pessoas que vivem na indigência e sofrem fome, bem como conseguir a educação primaria universal, promover a igualdade de gênero; reduzir a mortalidade infantil em dois terços e a materna em três quartos; combater a expansão do HIV/aids, da malária e outras doenças; assegurar a sustentabilidade ambiental e gerar uma sociedade global para o desenvolvimento entre o Norte e o Sul.
Porém, muitos governos africanos carecem do dinheiro necessário para implementar os programas de adaptação, disse Richard Odingo, professor de geografia especializado em climatologia na Universidade de Nairóbi. “A África é sensível aos acontecimentos climáticos extremos e tem limitados recursos financeiros. Os países do continente precisam de financiamento externo para contarem com programas de adaptação que funcionem”, afirmou. A maioria dos cientistas concorda que o aquecimento da Terra se deve a atividades humanas, sobretudo aos gases liberados pela queima de petróleo, gás e carvão, sendo que o dióxido de carbono é o principal.
Esses gases vão se acumulando na atmosfera e, pela sua grande capacidade de reter o calor dos raios solares, acentuam o chamado efeito estufa. A conseqüência desse aquecimento é uma mudança climática global com manifestações regionais e locais, como o derretimento de gelos polares e glaciais, elevação do nível do mar, secas, tempestades, furacões e inundações. Embora os Estados Unidos gerem 25% das emissões dos gases estufa, o governo do presidente George W. Bush retirou a assinatura que seu antecessor, Bill Clinton (1993-2001) colocou no Protocolo de Kyoto, único mecanismo internacional contra a mudança climática. Bush argumenta que o acordo pode afetar a economia de seu país.
Em Nairóbi também ocorreu a segunda Conferência das Partes que atua como Reunião das Partes do Protocolo de Kyoto (COP/MOP 2) em conjunto com a décima-segunda sessão da Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 12), a respeito das emissões registradas em 1990. Dos 189 Estados signatários, 165 ratificaram o Protocolo de Kyoto, acertado nessa cidade japonesa em 1997. No Quênia, os representantes norte-americanos foram duramente criticados e instados a ratificar o Protocolo.
Além da falta de recursos financeiros, outro problema que a África deve enfrentar é a falta de tecnologia. “Não temos tecnologia para nos beneficiarmos de poços pouco profundos, quando os rios variam pelas mudanças de estação, para armazenar água da chuva em grande quantidade e aproveitar a água dos oceanos para uso industrial”, disse à IPS Juma Mgoo, do Ministério de Recursos Naturais da Tanzânia.
O encontro de duas semanas reuniu cerca de seis mil delegados para analisar formas de enfrentar a mudança climática, que se prevê afetará em especial as nações pobres, mal preparadas paras seus efeitos, que causam escassez de água e falta de alimentos. “Pedimos aos nossos sócios dos países desenvolvidos ocidentais que se preocupem porque, mesmo quando querendo apoiar as nações em desenvolvimento seu apoio não dará resultado se não nos preocuparmos com a mudança climática”, afirmou George Krhoda, secretário permanente do Ministério de Meio Ambiente e Recursos Naturais deste país.
“A mudança climática acaba com nossos investimentos. Além da perda de vidas e propriedades, faz com que o país volte ao ponto de partida ao ter de substituir as pontes que foram arrastadas ou as estradas cortadas pelas inundações”, disse Krhoda à IPS, acrescentando que para o governo custa cerca de US$ 14 mil a construção de um quilometro de rodovia. Seus comentários coincidem com as fortes inundações que afetam a região costeira do Quênia, que causaram a interrupção da estrada que liga esse país à Tanzânia. Além dos fundos necessários para a reconstrução de estradas, o governo precisa de milhões de dólares para ajudar as famílias afetadas pela seca, um fenômeno recorrente neste país da África oriental.
(Por Joyce Mulama, IPS, 20/11/2006)
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