América Central entra para a lista dos poluidores
2006-11-20
A região da América Latina e do Caribe não está preparada para enfrentar o aquecimento global, fenômeno que é um obstáculo ao seu desenvolvimento e para o qual contribui com uma crescente emissão de gases causadores do efeito estufa, alerta um informe apresentado na quarta-feira no México pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). O documento, intitulado “Mudança climática na América Latina e no Caribe 2006", indica que falta informação “sobre a maneira de considerar a adaptação” ao fenômeno, há incerteza a respeito da interação entre mudanças climática e outras pressões, um horizonte de planejamento a curto prazo e carências de mecanismos para a participação pública.
“A região avançou muito em medidas de defesa civil para enfrentar os desastres derivados da mudança climática, mas não fez o mesmo quanto à adaptação, um assunto que vai mais além”, disse à IPS Ricardo Sánchez, diretor regional do Pnuma para América Latina e Caribe. O aquecimento global, que altera a temperatura e os padrões de clima do planeta, é produzido pelos gases que causam o efeito estufa derivados principalmente do uso de combustíveis fósseis, com carvão, petróleo e gás.
Na região se expressa no aumento da intensidade e freqüência de furacões no Caribe; mudanças nos padrões de chuva, aumento dos níveis de rios principalmente no Brasil e na Argentina, e redução das geleiras na Patagônia e cordilheira dos Andes. O relatório, elaborado entre o Pnuma e ao Ministério do Meio Ambiente e Recursos Naturais do México, alerta que nos países latino-americanos e caribenhos há poucos conhecimentos econômicos, jurídicos e institucionais para se adaptar à mudança do clima, bem como faltam ferramentas e procedimentos para avaliar um processo desse tipo.
No futuro, “a mudança climática será, cada vez mais, um problema de desenvolvimento” para a região, que já sofre ingentes perdas econômicas e humanas por sua causa, acrescenta o informe. “É que a mudança climática deixou de ser ficção cientifica, é algo que nos golpeia e, no momento, é inevitável”, disse Sánchez. O furacão Stan açoitou, em outubro de 2005, vários países centro-americanos, em particular Guatemala e El Salvador, causando, pelo menos, 1.620 mortes, enquanto que o Katrina fez estragos enormes no sul e centro dos Estados Unidos dois meses antes, se constituindo em um dos mais devastadores registrados na história recente desse país.
Os países da América Central e do Caribe são especialmente afetados pelos furacões. Em 1998, Mitch afetou cerca de 1,2 milhão de pessoas entre mortos e desaparecidos e deixou prejuízo de, aproximadamente, US$ 8,5 bilhões, cifra que supera o produto interno bruto anual combinado de Honduras e Nicarágua, os dois países mais afetados. Outros desastres foram o furacão George, que atingiu a República Dominicana também em 1998, deixando 235 mortos; e o furacão Ivã de 2004, que atingiu Barbados, Trinidad e Tobago, San Vicente e Granadinas, Jamaica, Granada, Cuba e Estados Unidos, causando mais de cem mortes e enormes perdas econômicas.
É certo que os furacões agora são melhor enfrentados com medidas de emergência, mas, também é necessária uma adaptação global que implica planos a longo prazo, recursos, desenvolvimento de fontes alternativas de energia e combate à pobreza e ao desmatamento, disse o diretor do Pnuma. O documento “Mudança Climática na América Latina e no Caribe 2006” afirma que a responsabilidade da região no aquecimento global é baixa em relação aos países desenvolvidos, mas, alerta que está aumentando. Calcula-se que contribua com 7% das emissões globais, e se seguir nesse ritmo em 2050 representará 9%.
Apesar desse escasso aumento previsto, há “dados preocupantes” indicando que as emissões de dióxido de carbono na região (derivados de processos industriais) aumentaram 75% entre 1980 e 2004 e seguiriam aumentando, diz o documento. Pouco mais de 70% das emissões dos gases causadores do efeito estufa provêm do Brasil, México, Venezuela e Argentina. O Pnuma se preocupa que essas emissões, até agora escassamente compensadas com investimentos e projetos em energias renováveis, e, também, com a pobreza e o desmatamento que afetam a região, dois fenômenos que elevam o impacto da mudança climática.
As mais altas taxas de desmatamento da região correspondem a pequenos países, como Santa Lucía e Haiti. Na América Central, o corte vai desde taxas de 4,6%, em El Salvador, até 0,8%, na Costa Rica. Na América do Sul, os índices mais altos de desmatamento correspondem ao equador, que enfrenta uma forte pressão populacional, e à Argentina, que as perde devido ao aumento do uso das terras agrícolas, enquanto nos demais países são moderados. Embora o Brasil, onde se concentram 56% das florestas da região, já não seja o principal lugar de desmatamento, o documento lembra que o corte de árvores na Amazônia brasileira aumentou 32% na última década, passando de 14 mil para mais de 18 mil quilômetros quadrados por ano.
Quanto aos problemas sociais, o documento diz que a desigualdade e a pobreza imperantes dificultam a manutenção de pautas de desenvolvimento que levem “a uma sustentabilidade capaz de responder aos desafios ambientais do presente e para as gerações futuras”. Na região, 10% da população rica recebe 35% da renda total, enquanto os 40% mais pobre recebem apenas 10% da renda.
“Estes indicadores permanecem estáveis na maioria dos países, apesar das melhorias no desempenho econômico e, salvo em pouquíssimos casos, também apesar das políticas dominantes de desenvolvimento social”, diz o estudo. “As falhas na adaptação e a vulnerabilidade aumentaram devido à pobreza, à degradação dos recursos naturais, à carência de planos para o uso do solo e pela falta de preparação de um plano importante para enfrentar os danos causados pelos desastres relacionados com o clima”, acrescenta o documento.
(Por Diego Cevallos, IPS, 17/11/2006)
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