Uso a expressão de Al Gore "É tempo das conseqüências", sobre o desastre provocado em New
Orleans, EUA, pelo furacão Katrina, para descrever o que ocorre com o Lago Guaíba e seus
contribuintes. A mortandade de peixes no Rio dos Sinos; o Gravataí, quase que desaparece nos
verões; e o Caí, Taquari e Jacuí não fogem à regra.
O Guaíba tem características que transformam o manancial em um frágil recurso da natureza:
conforme a direção do vento, o escoamento da água se dá no sentido inverso, de jusante para
montante, retendo por mais tempo os poluentes lançados. O lago é receptor das águas drenadas
pelas bacias, fazendo com que a qualidade seja dependente não somente das ações no seu
entorno, mas também das havidas nas bacias dos rios que a ele afluem. O aporte de carga,
principalmente dos rios Gravataí e Sinos, que sofrem com o lançamento de efluentes, provoca um
progressivo decréscimo da qualidade das águas. O surgimento das algas nos períodos de verão é
sintoma dessas conseqüências. O florescimento decorre dos produtos químicos lançados em
excesso, seja pelas atividades produtivas dos setores primário e industrial, seja pelos
esgotos cloacais não tratados.
A ONU mencionou Porto Alegre como exemplo notável na distribuição de água a preços acessíveis.
A capital e o Dmae foram citados, por conseguir melhorar, de forma drástica, as receitas e
reduzir as perdas de água na cidade. Demonstra que o poder público, com uma gestão
responsável, pode prestar serviços de qualidade, como cita o próprio relatório, "...é um
exemplo de que é possível reestruturar o setor sem privatizar os serviços". Este
reconhecimento se deve, sobretudo, à gestão profissional, que envolve diretamente 2,3 mil
funcionários entre técnicos, operadores e pesquisadores que trabalham para distribuir água de
qualidade para a população porto-alegrense.
Alcançamos a universalização da água. Mas o próximo desafio repousa sobre o tratamento de
esgotos. Um tema latente, assim como a distribuição de água, já superada por Porto Alegre.
Atualmente, a Capital trata 27% do esgoto coletado, com proposições de aumentar em 50% este
percentual. Esta é a razão pela qual a prefeitura está se empenhando ao máximo para viabilizar
o Programa Socioambiental (Pisa). Porto Alegre tem bom índice de recolhimento do esgoto
cloacal, mas está atrasada em termos de tratamento. É uma obra inadiável e para concretizá-la
precisamos de todos os níveis governamentais. O governo estadual deve colocar o Pisa no centro
de uma estratégia para recuperação do lago e de seus contribuintes, articulando os municípios
da Região Metropolitana e a União, que já está apoiando financeiramente o programa, deverá
facilitar a contratação do empréstimo junto ao BID, para que se viabilize em um curto espaço
de tempo. Se chegou o tempo das conseqüências é também tempo de agir.
(Por Flávio Ferreira Presser, diretor-geral do Departamento Municipal de Água e Esgotos -
Dmae,
Zero
Hora, 17/11/2006)