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2006-11-17
O lodo que resta do tratamento de água pode remover em até 100% a quantidade do fósforo presente no esgoto lançado nos rios. Esse tipo de aproveitamento do lodo, inédito no Brasil e no mundo, foi testado numa pesquisa realizada na Escola Politécnica (Poli) da USP, que empregou o resíduo no fim do tratamento de esgoto. O procedimento pode trazer muitos benefícios para o meio ambiente, além de de ser uma alternativa mais barata para a remoção do fósforo - prática importante para a saúde dos mananciais de água.

"O fósforo é apontado como o principal responsável pelo enriquecimento nutricional de mananciais de abastecimento público", diz a engenheira civil Iara Soares Chao. A presença excessiva de nutrientes, como o fósforo, na água leva à proliferação de algas (eutrofização), muitas delas capazes de liberar toxinas que podem ser fatais, e resulta numa água com gosto e odor. Assim, "a remoção de fósforo passa a ter grande significado para a saúde pública e para o meio ambiente", completa a engenheira.

Os rios, fonte de água para abastecimento, sofrem duplamente com o lançamento de esgoto e do lodo. Na sua forma bruta, o esgoto contém entre 6 mg/l (miligramas por litro) e 7mg/l de fósforo e, mesmo quando passam por estações de tratamento convencionais, que removem pouco os nutrientes, lançam nos rios em torno de 3 a 4 mg/l de fósforo, quantidade considerada grande. "Os padrões internacionais determinam lançamento limite entre 0,5mg/l e 1mg/l", aponta Iara. O lodo, por sua vez, pode poluir, causar assoreamento (diminuição da profundidade) dos rios e gerar impactos na vida aquática. Em seu mestrado, Iara avaliou a possibilidade de unir esses dois males num resultado benéfico.

Para que o lodo possa ter um destino que não os rios, uma alternativa é tratá-lo, ou seja, secá-lo para obter um produto sólido - que pode ser aproveitado, por exemplo, na fabricação de tijolo e cimento. Mas, na maioria das vezes, o lodo sólido termina nos rios ou em aterros sanitários.

"Existem 7.500 ETAs no Brasil e, delas, menos de 1% faz o tratamento desse lodo. Na Região Metropolitana de São Paulo, existem 8 grandes ETAs, mas apenas uma (a Taiaçupeba, pertencente à Suzano) trata o resíduo", complementa a pesquisadora.

Apesar de não apresentar riscos de contaminação, o lodo não é degradado pela natureza, o que contribui para o aumento da montanha de lixo. O aproveitamento proposto no estudo conta com a vantagem de não necessitar da secagem - o que favorece também o barateamento do processo.

Toque de midas
Iara realizou testes em laboratório, simulando uma estação de tratamento de esgoto terciária utilizando o lodo da Estação de Tratamento de Água (ETA) do Alto Cotia e o esgoto da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Barueri. "Essa terceira fase, para remoção do fósforo, é fácil de ser implantada, mesmo em estações já prontas", afirma a pesquisadora.

Em Barueri, assim como em outras ETEs de grandes metrópoles, que usam as próprias bactérias do esgoto para degradar a matéria orgânica, o tratamento convencional (secundário) consegue eliminar entre 40% e 50% do fósforo, apenas, e a legislação (Decreto Estadual nº 8468/76) não prevê a remoção total.

A alta capacidade de aderência do fósforo ao lodo, aplicada em outras formas de aproveitamento, mostrou-se eficaz para "segurar" o fósforo presente no efluente. Depois de 180 testes, com dosagens diferentes de lodo e variação dos parâmetros que influenciam essa sua capacidade, Iara chegou a uma condição capaz de remover 100% da substância. "Os resultados obtidos sinalizam uma alternativa tecnológica, que pode vir a ser utilizada em projetos sustentáveis, em que as estações de tratamento de esgoto e de água sejam planejadas de forma integrada", diz a pesquisadora.

Depois de ter sido usado no tratamento de esgoto, o lodo transforma-se de "resto" a fonte de nutrientes, pois fica rico em fósforo e pode ser aproveitado na agricultura para fertilização do solo. Esse dado é relevante quando se tem em mente que as fontes naturais de fósforo "estarão exauridas até 2035, segundo estudo internacional", alerta a pesquisadora.

Além de ser benéfico para o meio ambiente, o tratamento terciário com aplicação de lodo é mais barato, pois utiliza matéria-prima reaproveitada. Se a ETE e a ETA forem integradas, os custos com transporte são reduzidos e a economia pode ser ainda maior.
(Por Aline Moraes, Agência USP, 16/11/2006)

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