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efluentes hospitalares tratamento de efluentes
2006-11-16
João mora há 25 anos na orla do Guaíba, em uma casa construída dentro do terreno do clube Veleiros do Sul, onde trabalha como porteiro. O local é limite entre os bairros Cristal e Vila Assunção, em Porto Alegre. Exatamente embaixo da casa, ele encontrou uma tubulação que despeja efluentes fétidos diariamente, das 22h à meia-noite. Para o consultor ambiental do clube náutico, Israel Barcellos de Abreu, o despejo é feito por condomínios da região e pelo Hospital da Brigada Militar (HBM), que lança efluentes in natura no Guaíba.

O HBM não é exceção. Nenhum estabelecimento de saúde da cidade trata seu esgoto, embora a legislação seja clara: "Os efluentes de hospitais e outros estabelecimentos, nos quais haja despejos infectados por microorganismos patogênicos, deverão sofrer tratamentos especiais independente de seu número de coliformes" (artigo 5º do Decreto Municipal 12.961/2000).

E ainda: Os resíduos líquidos provenientes de esgoto e de águas servidas de estabelecimento de saúde devem ser tratados antes do lançamento no corpo receptor ou na rede coletora de esgoto, sempre que não houver sistema de tratamento de esgoto coletivo atendendo a área onde está localizado o serviço (Resolução RDC Anvisa nº 306/2004).

O AmbienteJÁ perguntou para Secretaria de Meio Ambiente de Porto Alegre (Smam), órgão fiscalizador dos efluentes hospitalares, e para o Departamento Municipal de Águas e Esgotos (DMAE) quais hospitais estariam obrigados a realizar o tratamento, já que somente 27% do esgoto em Porto Alegre são tratados. O primeiro disse não ter a informação e pediu para que a reportagem entrasse em contato com o segundo, que seria o responsável pelo "mapeamento". O DMAE afirmou que nunca existiu mapeamento e que a questão cabe somente à Smam – "responsável por emitir as licenças ambientais dos hospitais". Fica a impressão de que se a Smam quisesse começar a multar amanhã, não saberia quem precisa e quem não precisa tratar seus efluentes.

Segundo o porteiro João, a poluição na área piorou com os anos. "Quando cheguei, pescava peixes enormes. Você nem acreditava na beleza que era isso aqui. Hoje, o cheiro é horrível. Às vezes a coloração da água que vem do cano é vermelha. O pessoal do clube já denunciou várias vezes, mas nunca tomam uma providência", comenta.

Peso na consciência
O diretor administrativo do HBM, Major Freitas, confirma que a casa de saúde não possui estação de tratamento de esgoto (ETE). Disse desconhecer o destino final dos efluentes do hospital. "Sabemos sobre o dano provocado. Contudo, as verbas para as obras serão discutidas apenas em fevereiro", afirma.

O mesmo sentimento de peso da consciência foi manifestado pela chefe do setor de higienização do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Ana Helena Ramalho. Quando perguntada sobre o cumprimento da legislação, suspirou e disse: "Não tratamos, infelizmente. E não há previsão para tratarmos, os custos são elevados".

O clima de pesar chegou até a Smam. O secretário-adjunto da pasta, Walter Koch, também reconhece a importância do tratamento. Em sua opinião, a legislação sobre o tema é boa – o problema estaria justamente na cobrança e conseqüente penalização dos estabelecimentos de saúde: "É inviável fechar um hospital por ele não estar cumprindo com esse tipo de norma ambiental. E ainda há a carência de espaço físico e de recursos na saúde. Os hospitais do município deveriam ser exemplo, mas não se faz investimento nesse tipo de questão. Só se apaga incêndio".

A discussão acerca dos efluentes tomou corpo a partir de 2004, com a publicação da última normatização da Anvisa sobre resíduos hospitalares. O AmbienteJÁ perguntou para Smam e para Departamento Municipal de Águas e Esgotos (DMAE) quais hospitais estariam obrigados a realizar o tratamento, já que somente 27% do esgoto em Porto Alegre são tratados. O foco dos trabalhos se concentrou em resolver primeiro a questão dos resíduos sólidos, que hoje estaria bem encaminhada, na opinião dos entrevistados.

Ana Helena conta que a destinação correta dos dejetos sólidos deve ser encarada como uma vitória, embora acredite que alguns pontos da legislação dêem margem à má interpretação por parte da comunidade médica: "A aplicação prática da lei, no que se refere a sólidos, é prejudicada pela correria diária de um hospital - ainda há muito a evoluir. As capitais brasileiras estão bem, mas o interior está defasado. Quanto aos efluentes, já há discussão, mas pouco foi feito".

Koch se defende alegando estar cansado de "perder tempo licenciando pastelaria de oito metros quadrados" - atividades de baixíssimo impacto. Para o secretário-adjunto, o foco da pasta deveria ser o licenciamento de atividades de maior potencial poluidor, como a Saúde, e disse que a questão está sendo revista em conjunto com os demais órgãos de meio ambiente.

Em outubro, representantes da Smam e do Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre se reuniram para discutir a implementação de um projeto de lavanderia industrial que atenderia a todos os estabelecimentos de saúde do município. A iniciativa ajudaria a reduzir gastos e facilitaria o monitoramento de parte dos efluentes produzidos diariamente. Koch não quis adiantar detalhes porque a notícia ainda não é oficial. Fora esta, nenhuma novidade.

Faltam estudos sobre o tema
Outro agravante é o fato de a academia brasileira pouco estudar o assunto. A opinião é do professor Luiz Olinto Monteggia, do Programa de Pós-Graduação em Recursos Hídricos e Saneamento do Instituto de Pesquisa Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Em 2002, ele orientou a dissertação de mestrado da aluna Isabel Teles Silveira, que hoje é chefe da divisão do Serviço de Licenciamento e Monitoramento das Indústrias da Fepam e professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

A pesquisa consistiu em construir, através de projeto-piloto, uma Estação de Tratamento de Efluentes (ETE) no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), com R$ 80 mil doados pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa). A equipe do IPH fez o monitoramento do efluente e testou a sua desinfecção. São gastos diariamente cerca de 1 milhão de litros de água no HCPA.

O estudo comparou o esgoto do hospital com o doméstico em três enfoques: águas residuais (matéria orgânica), nutrientes (como a presença de hidrogênio e fósforo) e microorganismos. O IPH constatou que os efluentes são similares nos dois primeiros pontos e diferentes no último. "O hospitalar é muito mais contaminado do que o doméstico. Ele apresentou toxicidade elevada em todas as análises, especialmente de bactérias resistentes, como os streptococcus", afirma Isabel.

Contudo, a equipe não conseguiu provar a toxicidade por números. "Os resultados variam. O trabalho precisa ter valor estatístico para ter relevância científica", admite Monteggia. Eles atribuem a culpa ao pouco tempo de acompanhamento (dois anos), à bibliografia escassa e ao tipo de análise feita, que não detectava a presença de vírus e quimioterápicos nos efluentes, por exemplo.

Esse foi o único projeto de ETE em hospital apoiado pela Funasa. Tampouco o IPH tem realizado outras pesquisas sobre o assunto. Isabel Teles Silveira disse estar tentando introduzir o assunto no curso de Engenharia Química, da PUCRS.

Para Monteggia, os esgotos domésticos, hospitalares e industriais são igualmente perigosos. "Não se leva saneamento básico a sério no Brasil. Puxam a descarga e esquecem, falta conscientização. O que dá mais voto: iluminação pública ou saneamento?", polemiza. Exemplificou sua posição com a polêmica que envolveu a Corsan e os municípios de Cachoeirinha e Gravataí, no ano passado. A companhia fez as obras de saneamento, mas os deputados barraram a cobrança da taxa de esgoto dos moradores.

Química verde seria solução
O professor do IPH Luiz Olinto Monteggia e o ambientalista e engenheiro agrônomo Jacques Saldanha, responsável pelo site Nosso Futuro Roubado levantam a mesma questão: existem mais doentes fora do que dentro dos hospitais. Os dejetos de quem ingere remédios em casa também vão para a tubulação sem tratamento.

Monteggia e Isabel questionam a legislação vigente no que se refere à dispensa de tratamento dentro dos hospitais caso haja ETE em toda extensão do município. A funcionária da Fepam faz um alerta: os microoganismos presentes no efluente hospitalar têm a característica de contaminar o esgoto domiliciar quando misturados.

"Quem garante que a tecnologia fará a desinfecção de orgânicos, nutrientes e microorganismos de forma adequada? O mais seguro seria a combinação dos dois tratamentos", afirma o professor.

Jacques Saldanha também discorda da legislação. Em sua opinião, o problema está nos produtos químicos sintéticos usados como remédios, e não na falta de ETEs nos estabelecimentos de saúde: "O que se medica aos pacientes vai para o meio ambiente? Há tratamento eficaz para esse líquido contaminado? Estão aparecendo resíduos de fármacos, como o Prozac, na água", destaca.

Na opinião do ambientalista, o contrasenso está no fato de os "verdadeiros culpados" pelo problema – empresas que fabricam os medicamentos – não serem culpabilizados. "Como um hospital vai resolver a questão, se a molécula é comprada como medicamento? Vai se analisar quando já está feito, no ambiente. É preciso ir na fonte. Quando já é um problema, não há mais solução", opina.

Poucos laboratórios no mundo são capacitados para detectar a presença de substâncias tóxicas no corpo humano. Ele diz conhecer apenas um, na cidade de Vancouver, no Canadá, que faz o exame de sangue ao preço de U$ 15 mil. Saldanha acredita que a única saída é a adoção da química verde, que usa compostos biodegradáveis, além do incentivo às terapias medicinais alternativas, como a acupuntura.
(Por Ana Luiza Leal Vieira, AmbienteJÁ, 16/11/2006)

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