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2006-11-13
Se a crescente crise mundial da água continuar sem solução, a comunidade internacional corre o risco de perder sua longa batalha contra a pobreza, a fome e a doença, alertou a principal agência da Organização das Nações Unidas em matéria de desenvolvimento. Mais de um bilhão dos seis bilhões de habitantes do planeta carecem de água limpa, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) em seu Informe sobre Desenvolvimento Humano 2006. “Para alguns, a crise mundial da água se refere à escassez física”, mas, suas causas profundas são “a pobreza, a iniqüidade e as relações desiguais de poder, bem como as políticas viciadas de manejo aqüífero que exacerbam a escassez”, disse o administrador do Pnud, Kemal Dervis.

A palavra “crise” costuma ser usada em excesso em questões de desenvolvimento, mas, quando se trata da água é o termo adequado, afirmou Dervisw, ex-vice-presidente do Banco Mundial. Por não se entender a situação, os avanços para o cumprimento até 2015 dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio serão prejudicados, acrescentou. Estes Objetivos foram estabelecidos em setembro de 2000 por unanimidade em uma sessão especial da Assembléia Geral da ONU, na presença de numerosos chefes de Estado e de governo.

As oito metas estabelecem objetivos claros para a redução da pobreza, da fome, das doenças, do analfabetismo, da contaminação ambiental e da discriminação das mulheres. Entre os objetivos com prazo estabelecido para 2015 figuram garantir educação universal para meninos e meninas e reduzir pela metade, em relação a 1990, da proporção de pobres, famintos e pessoas sem acesso à água potável nem meios para custeá-la. Outras metas estabelecidas em 2000 pelos 189 países que então integravam a ONU são promover a igualdade de gênero, reduzir a mortalidade infantil, melhorar a saúde materna, combater o HIV/aids, a malária e outras enfermidades e garantir a sustentabilidade ambiental.

Porém, a implementação do programa dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio tem sido lenta e esporádica, em particular por duas razões: a escassez de recursos financeiros e a falta de vontade política. O Informe sobre Desenvolvimento Humano 2006 pede cerca de US$ 10 bilhões em investimentos anuais para atingir os objetivos de acesso à água potável e ao saneamento, dos quais estão privados 2,6 bilhões de pessoas. “Parece uma grande soma de dinheiro, mas deve ser colocada sem seu contexto. Representa menos de cinco dias de gastos militares mundiais e menos da metade do que os países ricos gastam por ano em água mineral” engarrafada, diz o estudo.

O informe de 442 páginas, intitulado “Mais além da escassez; Poder, pobreza e a crise mundial da água”, indica que este fenômeno não chega às manchetes dos jornais nem galvaniza ações internacionais concertadas, com ocorre com guerras e desastres naturais. Mas, trata-se de uma crise que retarda o avanço da humanidade e condena grandes porções da população do planeta à pobreza, à vulnerabilidade e à insegurança. O estudo reclama a elaboração de um plano de ação global com a liderança do Grupo dos Oito países mais poderosos do mundo (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Itália, Japão e Rússia), “urgentemente necessário para resolver a crescente crise da água e do saneamento que causa quase dois milhões de mortes de crianças todos os anos”.

“Quando se trata de água e saneamento, o mundo sofre um superávit de conferências e um déficit de ações factíveis”, disse Kevin Watkins, principal autor do Informe sobre Desenvolvimento Humano 2006. Anders Berntell, diretor-exucutivo do Instituto Internacional da Água de Estocolmo, aplaudiu o Pnud por vincular explicitamente a água e o saneamento com a melhoria da condição de vida da humanidade. “A falta de acesso dos pobres a serviços de água e saneamento básicos não é atribuível à quantidade de água disponível no planeta, mas aos governos e às instituições que não enfrentam o desafio”, disse Berntell à IPS. Os países ricos têm escasso interesse político em priorizar a melhoria destes serviços em sua cooperação ao desenvolvimento, acrescentou.

“O que há de novo?”, ironizou o presidente do Centro Terceiro Mundo para o Manejo da Água, Asit K. Biswas, ao ser consultado sobre o informe. As conclusões do estudo são bastante óbvias, acrescentou. “Temos em nossas mãos uma crise no manejo da água e não uma crise de escassez da água. Até agora, minha posição era minoritária. Quase todas as agências da ONU e o Banco Mundial atribuíam, no passado, a crise à escassez. E até falaram de guerras pela água”, acrescentou. Tais afirmações conseguem atrair a atenção dos meios de comunicação, mas, “são puro escombro” científico, concluiu.
(Por Thalif Deen, IPS, 10/11/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=24522

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