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2006-11-10
"A luta contra a Aracruz é apenas o modelo. Ela é o diabo; queremos destruir todo o inferno". A frase é de João Pedro Stédile, líder da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que deu a tônica ao Seminário Deserto Verde, Imprensa Marrom. O evento, que aconteceu ontem (09/11) à noite, reuniu um público de 200 pessoas - formado por estudantes, em sua maioria -, que lotou o auditório da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (FABICO) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Também integraram a mesa Marco Aurélio Weissheimer, jornalista da Agência Carta Maior, e Vanderléia Daron, do Movimento de Mulheres Camponesas. A pauta do encontro foi a reação da grande imprensa à ação das mulheres da Via Campesina na Aracruz Celulose, no dia 8 de março de 2006, em Barra do Ribeiro/RS.

As duas horas e meia de debate foram marcadas por muitos "abaixo ao capital estrangeiro das transnacionais" e pouca reflexão acerca da cobertura da mídia sobre as questões socioambientais. Mais do mesmo. Os destinatários dos ataques - grande imprensa gaúcha e nacional, governo, papeleiras – não compareceram.

Enquanto o discurso de Vanderléia, que abriu os trabalhos da noite, girou em torno da defesa das mulheres camponesas, vítimas da "sociedade neoliberalista patriarcal", Stédile optou por uma fala que não tinha por objetivo "falar mal das RBS, Globo". O líder do MST preferiu recontar aos presentes a história econômica do Brasil, do pau-brasil aos transgênicos, de forma crítica, e dar um panorama do que é polêmica nos dias atuais, como a pretensa "sustentabilidade" do biodiesel. Colocou o eucalipto em pé de igualdade com as demais monoculturas que ameaçam a biodiversidade brasileira, a exemplo da soja, do arroz, da cana-de-açúcar etc.

"Chegamos a uma situação em que dez ou 12 empresas, como a Monsanto, são as todas-poderosas da agricultura no Brasil. Essas transnacionais controlam todo o ciclo de produção: do laboratório que produz a semente transgênica, à definição do preço do grão, e impõem isso aos pequenos produtores", declara.

Para Stédile, o governo mente quando diz que os agricultores bateram recordes de exportação de soja. "Quem bate recorde no país é a Bunge e as outras três que dominam o mercado da oleogianosa. São essas as empresas que vendem o grão e atingem as cifras", polemiza.

O líder do MST também levantou a questão da padronização global dos alimentos, que seria uma marca da ação econômica das transnacionais. Segundo dados que trouxe para o seminário, até o ano de 1500, a humanidade se alimentava de cerca de 300 vegetais. Nos 1900, caiu para 33: "E hoje, a maioria da alimentação é baseada em cinco produtos: soja, trigo, arroz, feijão e milho. Você come isso aqui e em qualquer lugar no mundo".

Denuncismo não é a solução para a luta dos movimentos sociais
Segundo o jornalista da Agência Carta Maior Marco Aurélio Weissheimer, o fenômeno da cobertura da grande imprensa ao 8 de março de 2006 deve ser enxergado dentro do contexto global dos conglomerados de mídia, que já é realidade no Rio Grande do Sul. "Parece óbvio repetir isso, mas a Aracruz investe muito dinheiro em publicidade e em relacionamento com a imprensa. E tudo é apresentado de forma bem natural pela mídia, como se não influísse no conteúdo do que está sendo veiculado", relata.

Na opinião do jornalista, o movimentos sociais devem estar preparados para a cobertura mais negativa possível por parte da mídia. "É inocência nossa achar que, algum dia, será feita uma matéria favorável. Não se pode continuar batendo na mesma tecla do denuncismo", defende.

Weissheimer acredita que esse estágio poderá ser superado com a identificação dos braços econômicos que sustentam os grupos midiáticos. "A situação só mudará quando realizarmos estudos analíticos sérios sobre essas empresas, além de continuarmos investindo na construção instrumentos de comunicação do lado de cá", acredita.

Quando perguntado pelo AmbienteJÁ sobre a forma como seria feita a "comunicação do lado de cá", respondeu, evasivo: "A mídia alternativa ainda é muito precária, mas está melhor do que há dois, três anos. A saída é a internet, aliada à criatividade do pessoal que vai para a Comunicação".
(Por Ana Luiza Leal, AmbienteJÁ, 10/11/2006)

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