Modelagem do Impacto de Modificações da Cobertura Vegetal Amazônica no Clima Regional
2006-11-10
Tipo de trabalho: Tese de Doutorado
Instituição: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)
Ano: 2005
Autor: Francis Wagner Silva Correia
Resumo:
Efetuou-se um estudo de modelagem numérica para avaliar as conseqüências climáticas decorrentes de modificações da cobertura vegetal da Amazônia Legal de acordo com três cenários de desflorestamento: (i) alterações atuais (PROVEG); (ii) previstas para o ano de 2033 (CEN2033) e (iii) desflorestamento total da Amazônia (DESFLOR). Utilizaram-se o Modelo de Circulação Geral da Atmosfera (MCGA) do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) e o Modelo Regional ETA. Inicialmente, calibraram-se alguns parâmetros do esquema de superfície SSiB, os quais foram inseridos nos modelos atmosféricos. Obteve-se, também, uma nova condição de água no solo em escala global, a
qual foi gerada a partir de um modelo simples de balanço de água. Na segunda etapa, fizeram-se simulações com o MCGA, para três anos, considerando três membros e utilizando os três cenários. Similarmente, fizeram-se simulações com o ETA, considerando tempo de integração de um ano e um membro em cada experimento. A calibração de parâmetros do
SSiB resultou em melhores ajustes nos fluxos de calor latente e de calor sensível. O desempenho do modelo hidrológico foi avaliado comparando-se os resultados obtidos com a climatologia de água no solo utilizada nos modelos atmosféricos do CPTEC, resultando, de modo geral, uma boa correspondência entre a média anual do grau de saturação obtido com o
modelo e a da climatologia, com as maiores diferenças ocorrendo sob condições úmidas. Resultados das simulações: (A) Com o ETA, os impactos mais significativos nos balanços de radiação e de energia, para todos os cenários, ocorreram no período seco da região, sendo a redução no comprimento das raízes após o desflorestamento a principal causa desse
resultado, pois menos água no solo estava disponível para a vapotranspiração. O aumento da cobertura de nuvens conduziu a reduções da radiação solar incidente nos cenários CEN2033 e PROVEG, contribuindo para reduzir ainda mais o saldo de radiação à superfície. Em nenhum dos cenários observou-se o mecanismo de nuvens, em que o aumento da
radiação solar refletida é balanceado pelo aumento na radiação solar incidente, causando redução na nebulosidade. Nos três cenários, grande parte da energia disponível foi direcionada para aquecer a atmosfera (calor sensível), mas com magnitude inferior à daquela observada em experimento de campo na Amazônia Legal. Praticamente em todos os cenários as mudanças na razão de Bowen tiveram a mesma magnitude, enquanto as mudanças no ciclo hidrológico dependeram especificamente de cada cenário. Nos três cenários, observou-se o mecanismo de retroalimentação negativo, com maior quantidade de umidade sendo
transportada para a região desflorestada. O aumento da convergência de umidade foi maior que a redução na evapotranspiração nos cenários CEN2033 e PROVEG, conduzindo a um aumento na precipitação devido, em geral, a um aumento local na convergência de umidade.
Situação diferente foi observada no cenário extremo DESFLOR, que resultou num aumento local na convergência de umidade, o qual não foi intenso o suficiente para gerar aumento na precipitação, fazendo com que a redução na reciclagem local de água fosse o efeito dominante nesse cenário. Portanto, até certo ponto, o desflorestamento parcial na Amazônia Legal pode até levar a um acréscimo na precipitação em escala local; contudo, se o processo de desflorestamento permanecer, essa condição não será sustentável, conduzindo a uma condição mais seca sobre a região e, conseqüentemente, a uma redução na precipitação. (B)
Com o MCGA, as mudanças decorrentes dos três cenários afetam significativamente os balanços de radiação, de energia e de água, bem como a estrutura dinâmica da atmosfera e, conseqüentemente, a convergência de umidade e de massa em baixos níveis, principalmente na estação seca, pois o solo estava sob estresse hídrico. A redução do saldo de radiação, nos três cenários, foi governada pelo aumento da perda de radiação de onda longa causado por mudanças significativas na temperatura da superfície. Nos cenários DESFLOR e CEN2033,
o aumento na radiação solar incidente, devido à redução na nebulosidade, praticamente balanceou o aumento da radiação refletida – mecanismo de nuvens. Observou-se, nos três cenários, um mecanismo de retroalimentação negativo, pois o aumento na convergência de
umidade agiu no sentido de minimizar os efeitos da redução na evapotranspiração. No cenário PROVEG, a convergência de umidade e a evapotranspiração agiram em sentidos contrários, e o aumento da convergência de umidade sobrepujou a redução na evapotranspiração, conduzindo a um aumento na precipitação local. Os outros dois cenários
levaram a redução na precipitação, decorrente da diminuição na reciclagem local de água. Por outro lado, também resultaram mudanças climáticas em escala global. Assim, com o cenário DESFLOR, as mudanças mais significativas ocorreram no Hemisfério Norte, com redução no movimento ascendente em torno de 10oN, e um enfraquecimento da circulação meridional em direção ao pólo até a latitude de 50oN. Finalmente, os resultados obtidos corroboram outros estudos que indicam que, se o desenvolvimento sustentável e as políticas de conservação não forem no sentido de deter o aumento da degradação ambiental na
Amazônia, as mudanças nos usos da terra podem conduzir o sistema clima-bioma a um novo estado de equilíbrio mais seco, levando à savanização de algumas partes da Amazônia.