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2006-11-09
"Um pouco antes de se chegar ao Rio Preto descortina-se do alto de um outeiro uma vista bonita. As montanhas recuam bruscamente, formando uma garganta larga e profunda onde se vêem algumas choças...”

Um dos primeiros a registrar as belezas do Arraial de Rio Preto, hoje município de Rio Preto (MG), foi August de Saint Hilaire, o famoso naturalista francês, pouco antes de retornar ao seu país. Nessa mesma paisagem, Marilda Cruz Lima da Silva e seu marido João contemplam a natureza. Eles são proprietários da Fazenda São Lourenço do Funil. Nesse pedacinho de Mata Atlântica, o casal tem uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) de 25 hectares, um dos motivos que os incentivaram a criar o Instituto Sul-Mineiro de Estudos e Conservação da Natureza. A intenção é expandir as reservas particulares, pois a maior parte do que resta de remanescente de Mata Atlântica está nas mãos de proprietários privadas. Minas Gerais conta hoje com 68 RPPNs, espalhadas em mais de 20 mil hectares.

O casal pretende criar um Centro de Estudos Ambientais dentro de sua RPPN para estimular a preservação e formas sustentáveis de manejo. “É gratificante subir os quase 1.400 metros do Serrote São Gabriel e lembrar da descrição feita por Saint-Hilaire,” revela Marilda, uma das coordenadoras da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA).

Além do prazer do proprietário em desfrutar das belezas naturais, esse tipo de Unidade de Conservação traz vantagens práticas, como isenção do Imposto sobre Propriedade Territorial Rural, prioridade na análise de projetos pelo Fundo Nacional do Meio Ambiente, preferência nos pedidos de concessão de crédito agrícola junto a instituições oficiais de crédito e possibilidades de cooperação com entidades privadas e públicas na proteção, gestão e manejo dessas áreas.

Já no Paraná as leis são tão avançadas que os donos das áreas recebem recursos públicos para a manutenção de suas RPPNs. O Paraná é o recordista no número de reservas privadas: das 189, 61 são federais e 128, estaduais. As razões do sucesso são os estímulos oferecidos, como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) Ecológico. Uma lei permite que os municípios que possuem UCs tenham um repasse maior do imposto estadual.

Outro fator que contribui para esse cenário, é o decreto estadual do Sistema de Manutenção, Recuperação e Proteção da Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanentes (Sisleg), que obriga os proprietários a preservar 20% da sua propriedade, já que a legislação que obriga os 20% de Reserva Legal não é seguida como deveria. “Sem isso, o proprietário fica impossibilitado de participar de programas como o ICMS Ecológico”, explica Anderson Tosetto, analista técnico da Associação Paranaense de RPPNs. Lá, até a burocracia é bem-vista. “Ela é importante porque traz exigências que atestam a qualidade do processo de criação de RPPNs”, diz.

ONGs abrem caminhos
Quem está começando a trabalhar com RPPNs pode aproveitar a experiência de entidades pioneiras. Na Bahia, o Instituto de Estudos Socioambientais do Sul da Bahia (Iesb), já transformou muita terra em RPPN.

O secretário executivo do Iesb, Marcelo Araújo, conta que a idéia surgiu para formar corredores ecológicos entre UCs públicas e as reservas privadas. A entidade é proprietária de quatro reservas _ totalizando 2.100 mil hectares _ todas no Sul da Bahia, região de maior biodiversidade e endemismo da Mata Atlântica. É lá que fica o Ecoparque de Una, ao lado da Reserva Biológica de Una.

O Ecoparque foi criado em 1997, uma das primeiras RPPNs brasileiras, e trouxe inovações, como passarelas entre as árvores (arvorismo) que estão ancoradas em grandes árvores – copaíba, angelim-pedra, angelim-côco, jatobá e massaranduba. São cem metros por onde passa uma pessoa de cada vez, em um estreito caminho amparado por redes camufladas. Abaixo, o visitante pode observar árvores de menor porte e a fauna da região.

“Era preciso reverter o quadro econômico provocado pela queda da lavoura cacaueira, buscando alternativas que atendessem às necessidades de geração de renda população e evitassem o desmatamento”, argumenta Araújo. Hoje o Ecoparque recebe cerca de dois mil visitantes por ano.

Avanços dependem do Ibama
Neste ano, foi regulamentada a legislação para criação de RPPNs. Conforme o presidente da Associação Brasileira de RPPNs, Alexandre Martinez, o decreto presidencial de abril de 2006, trouxe alguns avanços como a definição de critérios e usos. Segundo ele, a RPPN é o único tipo de UC que, para ser criada, necessita ter um plano de manejo. Uma das críticas é o fato do decreto de abril não ter revogado o anterior. As RPPNs integram o grupo de UCs de proteção integral. Isto quer dizer que o seu gerenciamento precisa obedecer a uma série de restrições.

A Associação aponta entre as dificuldades para criação de novas RPPNs a burocracia do Ibama. “Atualmente estamos fazendo termos de cooperação técnica para apoiar a sistematização dos processos, para ver se a coisa deslancha”, explica.

O próximo passo será juntar toda documentação das 14 associações estaduais para apresentar um programa de apoio a RPPNs, ainda neste ano. “Hoje, mais de 60 RPPNs aguardam parecer do Ibama, algumas há mais de quatro anos”, estima.

A Assessoria de Imprensa do Ibama em Brasília, argumenta que cada gerência estadual tem técnicos responsáveis pelas RPPNs, além da procuradoria jurídica e de outros especialistas. Atualmente o Ibama já criou 427 RPPNs, o que equivale a 440 mil hectares.

Estados enfrentam dificuldades
O Rio Grande do Sul é um dos mais atrasados em relação a criação de RPPNs. Apenas no começo de outubro os proprietários conseguiram criar uma Associação, cujo nome é Charrua. Lisiane Becker, coordenadora-presidente da ONG Mira-Serra, critica a atuação do Ibama e aponta a burocracia do órgão ambiental como um dos empecilhos na criação de mais reservas particulares.

Segundo Carlos Henrique Dias, chefe da Divisão Técnica da gerência gaúcha, muitas vezes a documentação apresentada é insuficiente. O assunto vem sendo debatido na Assembléia Legislativa gaúcha há um ano, quando foi formado um Grupo de Trabalho, que elaborou o Projeto de Lei n°225/2006 sobre RPPNs. O projeto estabelece critérios para a criação de RPPNs no Rio Grande do Sul e tem como objetivos o controle e a fiscalização do entorno das reservas.

A Mira-Serra, com sede em São Francisco de Paula, ainda sofre represálias por tentar manter a integridade de sua RPPN. Tanto pesquisadores quanto seus proprietários já receberam várias ameaças, inclusive de morte, por um vizinho que têm provocado danos ambientais na região. O vizinho chegou a construir uma pocilga, cujos dejetos acabam na reserva. “Esperamos que pelo menos na Justiça isso possa ser barrado”, argumenta Lisiane.

ES, BA e AL buscam alternativas
Na Bahia, a Associação de Proprietários de Reservas Particulares (Preserva) trabalha no apoio à implementação e à criação de novas reservas, inclusive em Sergipe, onde as dificuldades se repetem e existe apenas uma RPPN federal.

Segundo o presidente da Preserva, Henrique Berberti Carvalho, a maioria das RPPNs criadas em solo baiano, foi fruto da “natureza conservacionista” de seus proprietários. “Quase 100% deles decidiu criá-las porque querem preserva-las para suas futuras gerações”, afirma. Conforme Carvalho, ainda existem aqueles que protegem parte de suas terras de maneira informal, devido a burocracia e morosidade do Ibama, ou ainda, por puro desconhecimento. “Oferecemos cursos de capacitação, onde mostramos as vantagens de regularizar essas áreas”, acrescenta.

Na tentativa de agilizar os processos, o governo da Bahia, vem desde maio deste ano, reconhecendo a criação de RPPNs. O programa de financiamento da Aliança para a Conservação da Mata Atlântica formado pela Fundação SOS Mata Atlântica e Conservação Internacional ajudou proprietários a criar ou implementar áreas já existentes. O programa já contemplou 19 reservas na Bahia. O Estado já tem 57 RPPNs, num total de 24 mil ha.

O Espírito Santo também conta com leis para criação de reservas particulares estaduais desde fevereiro deste ano. “A criação de RPPNs surge com o desejo e a conscientização do produtor em potencializar a conservação de seus remanescentes florestais para que sejam desenvolvidas atividades de pesquisa científica, ecoturismo, recreação e educação ambiental”, explica Robson de Almeida Britto do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). Os capixabas já dispõem de três RPPNs estaduais.

Em Alagoas, quem está ajudando a preservar são aqueles que mais a destruíram Mata Atlântica. Os usineiros são os maiores proprietários de RPPNs. “Como eles são os únicos que ainda têm remanescentes propomos que recuperassem essas áreas e fizessem trabalhos de educação ambiental”, conta Fernando Pinto do Instituto de Preservação Ambiental (IPMA). A ONG convenceu-os a criar 22 RPPNs, mais dez já estão em fase de reconhecimento. O outro passo foi a restauração das margens das barragens das usinas. Para isso, o IPMA montou um centro de mudas nativas.

Outra iniciativa foi a criação de um programa de adoção de mascotes. Cada usina deveria escolher um animal nativo como seu “bichinho de estimação”. A escolha foi feita através de concurso. O sucesso do programa gerou uma situação curiosa. Ao pedir que escolhessem um animalzinho, determinado usineiro “quase surtou” quando as crianças elegeram a preguiça para sua empresa. “O sujeito me ligou desesperado porque não podia adotar um bicho com essa fama”, recorda Pinto. No final, deu tudo certo. O usineiro ficou com o sabiá como mascote. E a preguiça? Bom, ela foi ser o símbolo de um hotel, bem mais apropriado para sua fama...
(Por Carlos Matsubara, 8/11/2006)

Publicado originalmente na segunda edição da Revista Rede Pela Mata, da Rede de ONGs da Mata Atlântica - RMA.

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