Governo tenta driblar ações contra obra no São Francisco
2006-11-08
Numa tentativa de driblar as ações judiciais que paralisam a transposição do rio São Francisco, o governo federal decidiu dividir a superlicitação de R$ 3,3 bilhões e lançar logo um novo edital para iniciar a parte do negócio que trata do detalhamento do projeto.
A obra com que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva gostaria de marcar seu primeiro mandato foi suspensa há mais de um ano por liminares judiciais. Desde outubro de 2005, aguarda uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).
O edital lançado pouco antes da suspensão da obra pela Justiça dividia a construção de canais de concreto projetados para levar parte das águas do rio São Francisco a quatro Estados - Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba - em 14 lotes a serem disputados pelas empreiteiras.
O edital incluía os chamados projetos executivos, com preço estimado em R$ 90 milhões e que serão objeto de um novo edital a ser lançado até o final do mês. Para o governo, o bloqueio da Justiça não atinge o detalhamento do projeto básico da obra. A divisão em lotes é mantida, assim como o desenho geral da transposição.
"O objetivo ao desmembrar a licitação é ganhar um pouco de tempo enquanto não se derruba a liminar", disse o ministro Pedro Brito (Integração Nacional). Ele mantém a expectativa de que o STF a libere até dezembro. Só então o ministério poderá retomar a principal parte da licitação e, a partir do seu resultado, dar início às obras.
Se vencer a batalha judicial, a transposição do São Francisco terá de lidar com obstáculos financeiros. O projeto de Orçamento da União para 2007, sob análise do Congresso Nacional, prevê gastos de cerca de R$ 200 milhões no projeto. O valor equivale a menos da metade dos gastos autorizados neste ano e é insuficiente para iniciar a construção dos canais. "É pouca coisa, mas há possibilidade de uma autorização extra de gastos", ponderou Brito.
Nos últimos dois anos, apesar de a obra não ter saído do papel, a transposição do rio São Francisco já custou aos cofres públicos cerca de R$ 466 milhões, de acordo com o Siafi (sistema de acompanhamento dos gastos federais). A maior parte do dinheiro foi paga ao consórcio Logos-Concremat, que venceu licitação para administrar o projeto, a começar pelas licenças ambientais.
Em 2005, antes de a Justiça conceder liminares paralisando a obra, o governo chegou a pagar indenizações a uma pequena parcela das famílias que serão deslocadas para a passagem dos canais de concreto, também registra o Siafi.
Também foi feita licitação para a compra de um conjunto de nove bombas, que elevarão as águas do rio a uma altura de até 300 metros, no trecho mais acidentado da transposição.
Os planos de Lula de dar início às obras durante o primeiro mandato degringolaram a partir de setembro do ano passado, quando o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) se preparava para conceder a licença de instalação.
O bispo de Barra (BA), Luiz Flávio Cappio, fez dez dias de greve de fome para tentar reabrir o debate do projeto, que enfrenta oposição de regiões banhadas pelo rio e que cederão parte de suas águas, sobretudo a Bahia. Em seguida, o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual da Bahia obtiveram liminares para paralisar o projeto.
(Por Marta Salomon, Folha de S.Paulo, 07/11/2006)
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u86391.shtml