Debate sobre incentivo à conservação florestal não termina na conferência sobre mudanças climáticas
2006-11-07
O debate sobre a proposta brasileira de “premiar” países em desenvolvimento que reduzirem suas taxas de desmatamento não deve ser concluído na 12ª Conferência das Partes da Convenção sobre Mudança Climática (COP-12), em Nairobi, no Quênia. A avaliação foi feita pelo pesquisador Marcelo Rocha, membro do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Escola Superior de Agricultura Luís de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP) e da Organização Não-Governamental Instituto de Pesquisas Ecológicas (Ipê).
A proposta apresentada pelo governo brasileiro consiste, em linhas gerais, na adoção voluntária de indicadores de acompanhamento das taxas de desmatamento em países em desenvolvimento, com metas pré-estabelecidas. As nações que conseguirem manter a redução seriam beneficiadas pelos países ricos com transferência de tecnologia e doações voluntárias para projetos de desenvolvimento sustentável.
“Como é um tema bastante complicado, não é de se esperar um resultado concreto para esta reunião”, afirmou Rocha, que é doutor em Economia Aplicada e especialista em mercado de carbono. “Incentivar a redução do desmatamento é um processo antigo de negociação no âmbito da convenção, que ainda vai levar alguns anos para ser concluído”.
O assessor especial da Coordenação Geral de Mudanças Climáticas do Ministério da Ciência e Tecnologia, Haroldo Machado Filho, que está participando da COP-12, contou à que durante o processo de regulamentação do Tratado de Quioto, o desmatamento evitado foi um dos pontos de maior polêmica. Pelo tratado, que entrou em vigor em fevereiro de 2005, os países desenvolvidos se comprometeram a reduzir em média 5,2% das emissões de gás carbônico até 2012, tomando 1990 como ano de referência.
Para cumprir a meta, eles podem contar com o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que permite a compra de “créditos de carbono” (tecnicamente chamados de Reduções Certificadas de Emissão - RCEs) gerados pelos países em desenvolvimento, a partir da adoção de projetos que comprovadamente reduzam as emissões de gases de efeito estufa. Mas na área florestal apenas o plantio de árvores (reflorestamento e florestamento) fazem parte do MDL - ou seja, embora a floresta em pé seja um reservatório de carbono, sua conservação não entra nesse mercado.
“A proposta brasileira atual busca incentivar o combate ao desmatamento no âmbito da convenção, mas ela não se dá dentro do Protocolo de Quioto. Não é um mecanismo de mercado, trata-se de uma contribuição espontânea, que não gera obrigações nem punições”, esclareceu Rocha. “Não adianta conservar as florestas se os países desenvolvidos continuarem queimando combustível fóssil, porque as árvores continuariam ameaçadas pelos impactos do aquecimento global”.
Rocha lembrou que a queima de combustíveis fósseis é a principal causa do aumento da concentração de gases de efeito estufa na atmosfera. Mas no Brasil, o quarto país na lista dos maiores emissores, o desmatamento e as queimadas respondem por cerca de 75% das emissões. “A destruição das florestas é significativa para as mudanças climáticas, contribuindo com 10 a 30% das emissões mundiais (há divergências entre os cientistas sobre esse percentual). Mas o aquecimento global é sobretudo um problema de matriz energética”, ponderou.
Machado Filho também destacou a necesidade de os países desenvolvidos liderarem o combate ao aquecimento global. “As mudanças climáticas globais são um problema comum, mas com responsabilidades diferenciadas. As emissões de um norte-americano equivalem às de 368 paquistaneses”, informou. “A Convenção diz que os países desenvolvidos devem assumir essa liderança. Mas os países em desenvolvimento, apesar de não terem objetivos quantificados de reduções, estão adotando medidas que contribuem significativamente para mitigar o problema.”
(Por Thais Brianezi, Agência Brasil, 06/11/2006)
http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2006/11/06/materia.2006-11-06.3997263112/view