Projeto da Comissão de Meio Ambiente da Câmara sobre segurança nuclear tem sua eficácia questionada
2006-11-01
Figura como prioritária, na pauta da reunião da Comissão de Minas e Energia da Câmara Federal nesta quarta-feira, a votação do Projeto de Lei 7068/06, apresentado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
O PL obriga a instituição reguladora e fiscalizadora da área nuclear – no caso, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) - a permitir o acesso público a dados e informações sobre o setor. A Cnen deverá tornar públicos documentos, expedientes e processos administrativos que tratem de radioproteção, salvaguarda e segurança nuclear.
O projeto autoriza ainda qualquer pessoa a ter acesso às informações, desde que apresente requerimento escrito no qual assuma a obrigação de não utilizá-las para fins comerciais. Permanecem assegurados, no entanto, os sigilos comercial, industrial, financeiro ou qualquer outro protegido por lei, assim como o relativo às comunicações internas dos órgãos e entidades governamentais.
O deputado Luciano Castro (PL-RR), que encaminhou o projeto à Comissão de Meio Ambiente, destaca que a publicidade constitui um dos princípios básicos da administração pública garantidos na Constituição. Ele lembra que negar publicidade a atos administrativos caracteriza improbidade administrativa. "Não é aceitável motivar o sigilo sob o argumento de evitar o pânico da população", disse à Agência Câmara.
O relator, deputado Paulo Feijó (PSDB-RJ), recomenda a aprovação do projeto e o justifica com uma série de argumentos: “permite que o cidadão esteja seguro de não existir instalação que enseje riscos radioativos sem o conhecimento da comunidade afetada; o amplo conhecimento sobre a localização e a natureza de tais instalações proporciona também uma fiscalização mais eficaz, certamente com a participação da população e de diversos segmentos organizados da sociedade e facilita também o planejamento e a implementação de medidas de segurança, tanto preventivas como emergenciais”.
Paulo Feijó alega ainda que “a medida proposta será também salutar para as instituições de alguma forma envolvidas com fontes de radiações ionizantes, conferindo maior credibilidade a suas atividades”.
Questionamentos
Em tese, a aprovação do PL 7068/06 contemplaria uma demanda exposta pela Associação dos Fiscais de Radioproteção e Segurança – Afen -, em matéria publicada por AmbienteBrasil no dia 22 de agosto passado.
A entidade cobrou mais transparência por parte do Ministério de Ciência e Tecnologia, cujas posições, no entender do diretor presidente da Afen, Rogério dos Santos Gomes, “estão consolidadas pela influência de uma filosofia de caráter miliciano, focada em soberania e defesa nacional quando, ao contrário, deveria adotar uma postura mais moderna e democrática de segurança da população e do meio ambiente”.
Na prática, porém, a almejada transparência pode estacionar no terreno das boas intenções. Segundo Rogério Gomes, o Grupo de Trabalho instituído pela Comissão Nacional de Energia Nuclear – Cnen – elaborou o Plano Diretor de Proteção ao Conhecimento Sigiloso da instituição, prestes a ser implantado, que faculta aos cargos comissionados o poder de definir se um documento é sigiloso ou não. E, em caso positivo, não é preciso apresentar os motivos pelos quais o teor deste não poderia chegar ao conhecimento público.
“Estamos hoje numa luta interna por causa disso”, diz ele, que enviou, em nome da Afen, um ofício ao presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear, Odair Dias Gonçalves, questionando a legitimidade desse arbítrio.
“A autoridade pública é obrigada a apresentar o rol de argumentos para a classificação de qualquer documento como sigiloso. Tal motivação deve estar expressa em procedimento administrativo que deverá ser público”, coloca o documento, que acusa o Plano Diretor de Proteção ao Conhecimento Sigiloso da Cnen de “inconstitucional”.
Lembrando que o PL 7068/06 resguarda os sigilos comercial, industrial, financeiro ou qualquer outro protegido por lei, assim como o relativo às comunicações internas dos órgãos e entidades governamentais, e na hipótese da Cnen poder classificar como sigilosos documentos sem explicar o porquê disso, é bem provável que a população continue tendo pouco ou nenhum acesso aos trâmites e procedimentos relativos à segurança nuclear no Brasil.
AmbienteBrasil tentou obter a posição da Cnen sobre os questionamentos da Afen, mas foi instruído a mandar correspondência por escrito ao presidente da Comissão, Odair Gonçalves, encaminhando essa demanda.
(Por Mônica Pinto, AmbienteBrasil, 31/10/2006)
http://www.ambientebrasil.com.br/noticias/index.php3?action=ler&id=27584