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2006-10-31
O relatório sobre o impacto econômico do aquecimento global apresentado na segunda-feira (30/10) em Londres afirma que o aquecimento pode causar o mais profundo e extenso dano à economia mundial já visto. E, uma vez que o estudo é solidamente fundamentado em argumentos científicos, fica difícil discordar. O documento foi escrito por Nicholas Stern, um renomado economista, que já foi economista-chefe do Banco Mundial.

Stern não é um homem dado a exageros. Mesmo assim, ele diz que “nossas ações nas próximas décadas podem causar danos imensos à atividade econômica e social, neste século e no próximo, com efeito similar ao que tiveram as grandes guerras e a depressão econômica na primeira metade do século 20”. Seu relatório indica alguns caminhos a serem seguidos para minimizar os possíveis problemas sócio-econômicos.

O seu principal argumento é o de que gastar grandes somas de dinheiro agora para reduzir as emissões de carbono trarão dividendos numa escala colossal. Logo, seria completamente irracional não gastar esse dinheiro já. Contudo, ele alerta para o fato de que já estamos atrasados para evitar todas as conseqüências deletérias do problema. As perspectivas são mais sombrias para a África e para os países em desenvolvimento, e que as nações mais ricas têm que prover suporte financeiro e tecnológico para enfrentar o problema.

Decisões duras
Stern acredita que é viável ter como meta uma estabilização dos níveis das emissões de carbono na atmosfera entre 500 a 550 ppm (sigla de partes por milhão, medida de concentração de gases) de dióxido de carbono por volta do ano de 2050.

Esse valor é equivalente ao dobro da era pré-industrial e é comparável aos 430 ppm existentes hoje. Mas mesmo assim, os efeitos das emissões de carbono serão sentidos na mudança climática. Para atingir esses números, as emissões de carbono por unidade de produto interno bruto (PIB) na atmosfera precisam ser cortadas em cerca de 75%.

Mais pobres devem ser os mais atingidos pelo aquecimento global
Além de diminuir a dependência de carbono que o setor energético ainda tem em cerca de 60% a 70%, será necessário interromper o processo de desflorestamento, que responde por 18% das emissões totais – mais do que todas as emissões de transporte. E também serão necessários cortes profundos nas emissões de transporte. O custo de todas essas medidas deve chegar a 1% do PIB global até o ano de 2050. Em outras palavras, o mundo será 1% mais pobre do que poderia ser, uma cifra considerável, mas longe de ser proibitiva.

Para ser claro, o mundo não vai ficar 1% mais pobre de uma vez, mas o crescimento global será mais lento. O melhor modo de se olhar para esse 1% é como um investimento, porque o preço de não se tomar medida nenhuma é incrivelmente mais alto.

Estimativas erradas
O cenário inicial de Nicholas Stern é o modelo econômico usado em outros estudos, onde um acréscimo de 2 a 3 graus na temperatura levaria a uma perda de até 3% da produção global, comparado com o que esta seria se o clima não tivesse mudado. Mas Stern diz que essas estimativas estão erradas.

Ele acredita que uma subida de cinco a seis graus na temperatura do planeta é uma “possibilidade real” para os próximos cem anos. Tendo usado probabilidade de diferentes níveis de aquecimento global no seu modelo, o economista diz que “manter a produção como está” levaria a uma redução permanente no consumo per capita em cerca de 5%.

Só que essa estimativa não inclui o custo financeiro do impacto direto na saúde humana e no meio-ambiente por parte do aquecimento global, ou dos custos desproporcionais nas regiões pobres do mundo. A previsão anterior também ignora os chamados “mecanismos de resposta”, pelos quais o efeito estufa passe a ser mais intenso conforme a temperatura se elevar.

Preço injusto
Colocando todos estes fatores juntos, Stern chega à sombria conclusão de que se nada for feito para se combater a mudança de clima, a redução de consumo por pessoa pode chegar a 20%. Em outras palavras: todas as pessoas do mundo teriam 1/5 a menos do que teriam tido sem a questão climática.

Pior ainda, diz Stern, é o fato de que nem as conseqüências do problema seria divididas igualmente, mas os países pobres seriam os mais afetados. Logo, a saída mais lógica, segundo Stern é: gaste 1% do PIB mundial hoje para ser 20% mais rico no futuro. É simples assim. Há uma outra maneira de se apresentar essa relação custo-benefício.

Stern diz que se você pegar, em valores de hoje, os benefícios de se estabilizar o “efeito estufa” até 2050, e tirar os gastos, você ainda acaba com um “lucro” de US$ 2.5 trilhões (R$ 5.34 trilhões, aproximadamente). Olhando pelo aspecto econômico, o combate imediato do aquecimento global parece um excelente negócio.

Obstáculos
Para Stern, corte nas emissões de carbono teriam de ser de 75%. Dito isso, há grandes obstáculos para colher esses dividendos. Um problema óbvio é o de que requer uma ação coordenada e coletiva de todos os governos do mundo – e chegar aos consensos necessários pode não ser assim tão fácil.

Para ser imparcial, Stern diz que os países ricos deverão assumir entre 60% e 80% da redução de emissões de carbono entre 1990 e 2050. Mas ainda que se chegue a um acordo sobre isso, qual a melhor maneira de corrigir o imenso rombo econômico que está nos levando para um caminho de pobreza? Como começaríamos a pagar um preço pelas emissões de carbono que realmente reflita com precisão os custos econômicos e sociais ou um preço que inclua o valor de uma mudança no clima que acontecerá no futuro?

Segundo Stern, há duas alternativas:
A primeira é por meio da cobrança de um imposto. A outra, por meio de um racionamento das emissões de carbono que todo negócio terá – individual ou não – criando um mercado global. Essa medida permitiria que aqueles que quisessem fazer mais emissões do que o permitido pudessem comprar esse direito – e os que fossem emitir menos, de vender.

Outro fator fundamental é o de fazer com que os governos passem a encorajar pesquisa e desenvolvimento de tecnologias “limpas”. Este encorajamento viria através de legislações – como a imposição de padrões mais rigorosos para consumo de energia – ou educação.

Problemas adiante
Podemos nos preparar para uma série de choques causados pelos efeitos da mudança de clima – porque eles parecem inevitáveis. Provavelmente ocorrerão mais secas e enchentes, um número maior de tempestades é esperado e há um risco de aumento da fome em regiões mais pobres, e assim, seria uma boa idéia monitorar melhor as condições climáticas ou então, nos adaptar para este novo mundo.

Isso significaria reforçar as estruturas dos edifícios para que eles agüentem condições climáticas mais extremas, investir em novos diques e dar suporte aos mercados financeiros para viabilizar novas apólices de seguro contra desastres ligados ao clima. Tudo isso sera muito caro – especialmente para os países pobres. Logo, diz Stern – e é difícil discordar – há uma obrigação moral por parte dos países ricos em ajudar os pobres a se proteger.
(Por Robert Peston, BBC, 30/10/2006)
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