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2006-10-26
Uma recente liminar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que liberou a construção da hidrelétrica Paranatinga II no rio Culuene, no Mato Grosso, causou revolta no Parque Indígena do Xingu. Em carta divulgada na semana passada, diversas lideranças xinguanas manifestam indignação e angústia quanto aos impactos da obra sobre o Culuene - um dos principais formadores do rio Xingu -, a reprodução dos peixes, a dieta alimentar das comunidades indígenas, a fauna e flora locais e o patrimônio cultural dos índios do Alto Xingu.

A decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF) de liberar a construção da Pequena Central Hidrelétrica Paranatinga II, tomada no último dia 20 de setembro, caiu como uma bomba no Parque Indígena do Xingu. Em carta divulgada na semana passada, diversas lideranças xinguanas manifestam preocupação quanto aos impactos da obra sobre o rio Culuene, a reprodução dos peixes, a dieta alimentar das comunidades, a fauna e flora locais e o patrimônio cultural do Alto Xingu. Leia a carta na íntegra.

Parque do Xingu, 18 de outubro de 2006.
Nós, povo Indígena do Xingu, vimos por meio deste, manifestar toda nossa indignação e angústia diante de decisão liminar proveniente do Tribunal, na qual foi permitida a continuidade da obra da Pequena Central Hidrelétrica de PARANATINGA II até a produção de decisão de mérito sobre a questão. A comunidade indígena se vê ameaçada por esta realidade alarmante que reflete uma política governamental focada em interesses da elite econômica, a qual vai flagrantemente de encontro aos direitos socioambientais constitucionalmente assegurados.

É desesperadora a perspectiva dos graves impactos que serão gerados se a PCH PARANATINGA II vier a se efetivar. Somos Povos da Floresta e a relação de respeito que mantemos com meio ambiente propicia a manutenção da vida e da biodiversidade. A tão falada sustentabilidade, que os não-índios colocam como fundamental à sobrevivência e a existência das próximas gerações, mas poucos fazem para efetivar, foi por nossos antepassados, e é por nós, naturalmente buscada, pois nossos modos e cultura não se pautam por práticas degradantes, visando interesses utilitaristas de uma classe, e sim ações que atendam aos interesses do coletivo e que não ocasionem danos ao meio natural que nos envolve e nos fornece toda a riqueza que necessitamos para viver.

Logo, contraditório nos parece, que o Estado Brasileiro, do qual fazemos parte, realize ou legitime práticas que atentam contra a existência de nossa coletividade. Nossa diversidade e nossa contribuição para a vida no Planeta não são reconhecidas e respeitadas. Apesar do ordenamento jurídico nacional e internacional determinar o dever estatal de proteção das comunidades indígenas o modo de vida do homem branco é colocado como referencial e a as diferenças são vistas como ameaças a serem, aos poucos, eliminadas.

Lutamos contra este estado de coisas. Os gritos do Xingu devem ser ouvidos! Temos o direito de participar e decidir sobre projetos que interfiram em nossas terras, em nossas culturas, em nossas crenças, em nosso modo de vida.

Não queremos que o Rio Kuluene seja poluído com o óleo eliminado pelas turbinas. Não queremos que os peixes desapareçam devido à barreira artificial que está sendo construída e que impedirá a subida de inúmeras espécies, que fazem parte da dieta alimentar do povo xinguano. Não queremos ter nosso regime alimentar fique comprometido pela falta dos peixes. Não queremos o restante da fauna terrestre desapareça; Não queremos que espécies da flora desapareçam. Não queremos que o local sagrado do primeiro surgimento de Kuarup seja inundado. Não queremos uma obra que está voltada para os interesses de um empresariado que somente objetiva acumular riquezas às custas da morte.

NÃO QUEREMOS A PCH PARANATINGA II!

E sim queremos que a Constituição Federal, a Convenção n° 169 da OIT e a Carta da Terra, com seu conjunto de Princípios - entre eles, Princípio do Direito à Vida Saudável, Princípio da Dignidade, Princípio da Participação social, Princípio do Respeito à Diversidade, Princípio da Proteção do Meio ambiente-, sejam efetivadas!

Somos povos resistentes! São mais de cinco séculos de opressão -fruto da estupidez do homem branco que não considera que diversidade é evolução. Continuaremos na luta!

Finalizamos esta carta atentando para a responsabilidade e o compromisso do Poder Judiciário com a Justiça Social, a fim de que práticas abusivas e desumanas não se tornem lugar comum em nosso País.

Amigos e amigas autoridades do país, defensores da natureza, solicitamos apoio de todos para preservamos juntos a nossa grande riqueza: rios, matas, peixes e flora do nosso país que resta de pouco em nossa reserva do Parque do Xingu.
Por favor, nos ajude!
COMISSÃO INDÍGENA DO MOVIMENTO DO PARQUE DO XINGU agradece desde pelo apoio de todos e solidariedade.
(Instituto Socioambiental/ISA, 24/10/2006)

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