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2006-10-24
Esgoto correndo a céu aberto por todo lado. Essa é a realidade dos moradores da Vila Aparício de Moraes, no bairro Camobi. Lá, a água podre com ratos, moscas e sapos faz parte da rotina. Mais que isso, está na porta das casas. Para não colocar o pé no lodo, o jeito é colocar tábuas improvisadas como ponte.

- Entra político e sai político e continua tudo do mesmo jeito. Em dias de chuva, eu não posso nem ir no mercadinho. A água invade tudo. Isso aqui é uma imundície - conta a aposentada Aneli Gonçalves, 76 anos, equilibrando-se em cima das tábuas que levam da casa dela à rua.

Segundo os moradores, a cada eleição, as promessas de redes de esgoto para a vila se repetem. Mas passada a campanha, eles são esquecidos, e o esgoto segue correndo ao relento. Para a população de lá, não vale aquele velho ditado que diz que "esgoto não dá voto porque está debaixo da terra e não é visto". Mas todos estão cansados de implorar por uma solução.

- Não adianta falar. Mas está na hora de fazerem alguma coisa. Há muitas crianças aqui e pessoas idosas com problema de saúde como eu - acrescenta a aposentada, no momento em que recebia um santinho de um cabo eleitoral de um candidato a presidente da República.

Mas o esgoto a céu aberto não é um problema só da Vila Aparício de Moraes. Só metade das 42 mil residências da cidade tem seus resíduos tratados. Quase todo o bairro Camobi não tem esgoto cloacal (que sai das cozinhas e dos banheiros). Dentro do bairro, considerado um dos maiores de Santa Maria, só a Cohab Fernando Ferrari tem esse privilégio.

Segundo a Sociedade Amigos de Camobi (Saca), a população dos sem-esgoto na região chega perto dos 20 mil habitantes. Mesmo assim, Santa Maria ainda ostenta um dos melhores índices do Estado no quesito saneamento básico, mas bem longe de Caxias do Sul, que tem 99% das residências com esgoto tratado.

Camobi está lutando para entrar no grupo dos com-esgoto, mas não está fácil. O projeto para a construção da rede está estimado em R$ 25 milhões, e a Companhia Rio Grandense de Saneamento (Corsan) tenta um financiamento do Ministério das Cidades. Por enquanto, não veio resposta. A Corsan acredita que a decisão ficará para 2007, quando o novo governo assumir. O superintendente regional da Companhia, Elias Pacheco, diz que obras são caras, e que a Corsan "não tem receita própria".

Vila está fora de projeto do esgoto
Boa dos moradores de Camobi tem esperança de ver a tão sonhada rede de esgoto virar realidade num futuro próximo. Já os sofridos habitantes da Aparício de Moraes não terão a mesma sorte: a vila ficou fora do projeto de R$ 25 milhões. O jeito é torcer para que o novo governador olhe com carinho para o problema dos moradores. Nessa torcida, também se juntam outras vilas como Urlândia e Nossa Senhora do Trabalho.

Dois caminhos se apresentam como opção para amenizar a vida dos que vivem todos os dias cercado pelo esgoto: o de Yeda Crusius (PSDB) e o de Olívio Dutra (PT). Os aspirantes ao Piratini têm em seus planos de governo propostas para o tratamento de esgoto (veja quadro). Cabe ao eleitor analisar e escolher a alternativa com melhor chance de deixar sua vizinhança livre do mau cheiro e das doenças.

Realidade a céu aberto
Como é o esgoto
O esgoto pode ser recolhido separadamente pelas redes pluvial (água da chuva) e cloacal (que sai de cozinhas e banheiros)
O esgoto também pode ser recolhido por redes mistas. Ainda não há nenhuma desse tipo em Santa Maria
Há um projeto para construir uma rede de esgoto cloacal em Camobi, mas, por enquanto, está longe de sair do papel. A obra custa R$ 25 milhões, e a Corsan não tem dinheiro. A empresa está tentando um financiamento
Atualmente, a Corsan é responsável pela rede de esgoto cloacal, e a prefeitura, pela pluvial Quem paga as obras de esgoto
As obras de saneamento básico devem ser feitas pelo Estado (Corsan) com a ajuda dos municípios A Corsan entra com 75% do total da obra, e a prefeitura, com 25%. Os percentuais não precisam ser todos em dinheiro. Podem ser com máquinas e mão-de-obra por exemplo
Como as obras são caras e a Corsan alega não ter dinheiro para fazer obras de esgoto, o jeito é buscar financiamento em órgãos do governo federal como o Ministério das Cidades
Onde o problema é mais grave
Nestes locais, o esgoto cloacal não existe ou ainda é em pouquíssima quatidade
Bairro Camobi
Bairro São José
Bairro Cerrito
Vila Ecologia
Vila Jockey Club
Vila Nossa Senhora do Trabalho
Vila Renascença
Vila Santos
Vila Urlândia
Vila Lorenzi
Bairro Passo das Tropas
Fonte: União das Associações Comunitárias (UAC)
Promessa de candidato
Os dois candidatos ao Piratini, Olívio Dutra (PT) e Yeda Crusius (PSDB), têm em seus planos de governo algumas propostas para resolver os problemas de saneamento básico. Confira abaixo:
Olívio
Fortalecer a Corsan como empresa pública, reafirmando o valor da água como bem comum da humanidade
Isentar a tarifa de água e esgoto para aqueles que vivem abaixo da linha da pobreza Fomentar Consórcios Intermunicipais para coleta, tratamento e disposição final de resíduos sólidos
Promover e apoiar ações de planejamento urbano, com atenção especial para o controle de cheias, controle de doenças e arborização
Yeda
Estimular a otimização da gestão e da operação, com a ampliação dos atuais programas a todas as áreas e unidades de atendimento da Corsan
Incentivar a inserção de novas localidades no sistema, dentro da lógica dos programas de saúde preventiva Apoiar, via ação política institucional, a busca de recursos em nível federal e internacional, a custos condizentes, visando à excelência no abastecimento de água e viabilizando a implantação de projetos
Estimular a expansão da rede de esgoto sanitário, por meio de sua conceituação como vetor de saúde pública, apoiando a inserção de novas localidades
Buscar recursos para esgotamento sanitário como parte de programas mais amplos de saúde preventiva, sob os quais se reduzem as pressões de retorno financeiro

Podridão nos trilhos
Há 23 anos, o pedreiro Flávio dos Santos Pereira, 38 anos, mora na Vila Aparício de Moraes e não tem muita esperança de ver a situação melhorar. Ele diz que, como os moradores não têm rede de esgoto, a única alternativa é largar a água que sai dos banheiros e das cozinhas às margens dos trilhos.

- O pessoal tem de despejar ali, porque não tem o que fazer. No verão, isso aqui é uma podridão - critica.

Medo de doença
Com o recém-nascido Erick Henrique nos braços, a adolescente Érica Martins, 16 anos, teme que doenças causadas pelo esgoto possam prejudicar seu bebê. Quando chove, a água podre vai parar embaixo da casa. No calor, a moradia é invadida pelo mau cheiro e pelas moscas.

- Esses dias teve um pessoal fazendo campanha aqui e disseram que vão arrumar, mas não sei - diz.

Vento traz mau cheiro
A 600 metros da Aparício de Moraes, fica a casa do aposentado Valdir Mendonça Freitas, 58 anos, na Vila Jardim. Lá, o cenário é bem diferente: a rua é calçada, e o esgoto não fica exposto. Depois de passar pela fossa construída no pátio, a água desemboca na rede da rua. Mas nem assim Freitas escapa do mau cheiro:

- Em dia de vento norte, vem um cheiro que não dá para agüentar.
(Por Jaqueline Silveira, Diário de Santa Maria, 23/10/2006)

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