Quando multar, hoje (19/10), seis indústrias por terem despejado abusivamente produtos tóxicos
no Rio dos Sinos, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) não escapará da crítica.
Se as empresas forem as culpadas pela morte de 85 toneladas de peixes, ocorrida há 12 dias,
terá falhado a prevenção. Se não forem, o fracasso recairá sobre a investigação.
Não há dúvida de que produtos industriais desencadearam o desastre ambiental. A principal
suspeita em relação ao episódio é que uma ou várias fábricas do Arroio Portão tenham aberto
tanques com produtos tóxicos, diante de uma previsão de chuva que camuflaria a irregularidade.
Como a precipitação foi fraca, só teria arrastado o caldo de veneno para o Sinos.
- Quando a produção de uma fábrica é maior do que a prevista no seu licenciamento, as
dimensões da estação de tratamento não são suficientes. A chuva disfarça o despejo desta sobra
- explica o biólogo Uwe Schulz, especialista em qualidade de água da Universidade do Vale do
Rio dos Sinos (Unisinos).
Especialista alerta para ameaça ao abastecimento
No comando de um projeto chamado Monalisa, desenvolvido nos dois últimos anos, Schulz mapeou
os canos que tornaram o Sinos um valão de resíduos industriais e domésticos.
- Todos afirmam que não houve perigo para a população, mas há substâncias químicas que passam
pelo tratamento de rotina. A Fepam chegou com um dia de atraso ao local da mortandade. Tivemos
sorte - acrescenta Schulz, que já não recomenda o consumo de peixes do rio.
Conforme a bióloga Viviane Nabinger, as toxinas que chegaram ao Sinos pelo Portão fluem também
nos arroios Luiz Rau e Pampa, em Novo Hamburgo. Nos três, centenas de canos sem identificação
despejam líquidos multicoloridos na bacia. Para descobrir ligações clandestinas que burlem as
análises das estações de tratamento, seria necessário vistoriar cada uma.
- Já pegamos situações de uma empresa estar com um mangote saindo do sistema principal -
reforça o capitão Rodrigo Gonçalves dos Santos, da Patrulha Ambiental da Brigada Militar.
Para o presidente da Instituto Martim Pescador, Henrique da Costa Prieto, que há 40 anos
defende o rio, o maior desafio está realmente nos arroios.
- (O arroio) Portão é hoje uma cloaca, e a Fepam tem carência de equipamento, de fiscais e de
carros - constata.
O presidente da Associação Patrulheiros Ecológicos de São Francisco de Assis, Francisco Miler,
é mais duro na avaliação:
- Falta profissionalismo e competência, para dizer o mínimo. Já participei de operações para
flagrar quem polui rio e, por coincidência, os canos pararam de jorrar naquela madrugada. É
estranho - desabafa.
Contraponto
O que diz Jackson Müller, diretor técnico da Fepam, sobre as falhas apontadas:
A operação no rio
Fomos avisados às 17h do sábado (dia 7) sobre a mortandade. Como não havia tempo para sair com
os barcos, deixamos para o domingo. De manhã, já estávamos com a emergência no local.
Investigação
Não vamos multar seis empresas para pulverizar (a responsabilidade), mas porque elas
contribuíram de alguma forma (com o desastre).
Automonitoramento
É criticável, mas é a forma de controlar as empresas periodicamente. Alguém pode mesmo diluir
algo na amostra de efluente para enganar, não temos como saber. Mas em algum momento será
descoberto, e os técnicos serão responsabilizados por compactuar com a fraude. Não há como
visitar todas as empresas periodicamente.
Estrutura
Temos apenas 40% do quadro de funcionários (necessário). São cerca de 170 técnicos, 40 deles
no controle da poluição industrial. Estaria satisfeito se nos fosse permitido gerenciar o que
arrecadamos, cerca de R$ 17 milhões ao ano, que vão para o caixa único.
Envolvimento de funcionários e empresas
A Polícia Federal investiga dois funcionários da Fepam. Eles já foram afastados, embora uma
sindicância interna não tenha apontado irregularidades. Esta investigação não tem a ver com a
mortandade dos peixes. Queixas contra empresas ou técnicos podem ser feitas pelo (51)
3225-1588 ou no site www.fepam.rs.gov.br
(Por Rodrigo Cavalheiro,
Zero
Hora, 19/10/2006)