Coréia do Norte: Falcões dos EUA querem um Japão nuclear
2006-10-17
Estimular o Japão para que fabrique armas atômicas e realize operações secretas de sabotagem na Coréia do Norte são algumas das últimas receitas dos neoconservadores norte-americanos para responder aos desafios de Pyongyang. Em artigos para o jornal The New York Times, os “falcões”, a ala mais belicista do governo do presidente George W. Bush, afirmam que o teste atômico norte-coreano da última segunda-feira confirma sua posição de que as negociações com os Estados aos quais chamam de “rebeldes” são inúteis, e a única solução é uma “mudança de regime”, por meios militares, se necessário.
“Com nossa tão irregular informação de inteligência sobre a Coréia do Norte, a doutrina dos ataques preventivos deve ser retomada”, escreveu Dan Blumenthal, especialista em Ásia do Centro acadêmico conservador American Enterprise Institute (AEI), e que trabalhou para o secretário de Defesa, Donald rumsfled, no primeiro mandato de Bush. “Toda tentativa de restaurar as conversações da Seis Partes (China, Coréia do Norte, Coréia do sul, Estados Unidos, Japão e Rússia) deve encontrar resistência”, acrescentou.
O teste nuclear norte-coreano “despojou de toda verossimilhança os argumentos de que negociar com ditadores é algo que funciona”, segundo Michael Rubin, especialista em Oriente Médio do AEI, que também afirmou que o governo Bush está diante de um momento-chave das relações com países que desafiam Washington nos últimos anos. “A crise ano é apenas com a Coréia do Norte, mas, também com Irã, Síria, Venezuela e Cuba. Bush tem agora duas opções: responder energicamente e mostrar que qualquer desafio terá sua conseqüência, ou passar a imagem de que a atitude desafiadora tem seus frutos e que a vontade internacional é uma ilusão”, afirmou Rubin.
O presidente norte-americano “agora deve decidir se seu legado será a nação ou a liderança, (o ex-primeiro-ministro britânico Neville) Chamberlain ou (seu sucessor, Winston) Churchill”, afirmou, referindo-se ao debate na Grã-Bretanha nos anos anteriores à Segunda Guerra Mundial (1939-1945) sobre a política de “contemporização” do primeiro e a ação enérgica do segundo. Os neoconservadores, cuja influência na administração Bush diminui desde o final de 2003, quando ficou claro que a guerra do Iraque que tanto haviam defendido era um fracasso, ainda mantêm certo poder, sobretudo através dos escritórios de Rumsfeld e do vice-presidente, Dick Cheney.
Os “realistas”, concentrados no Departamento de Estado, preferem ação multilateral e dão prioridade ao fortalecimento das alianças tradicionais de Washington, especialmente com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Por sua vez, os neoconservadores são hostis aos processos multilaterais, em geral, e à Organização das Nações Unidas, em particular. Seus postulados sobre política externa rejeitam o pragmatismo e apresentam os conflitos em termos morais.
A maioria destes últimos é de judeus de direita, muito ligados ao conservador partido Likuk, no poder em Israel. São políticos, analistas e acadêmicos belicistas, e defendem que a política antiterror de Washington aponte contra todos os grupos e países que consideram ameaças para os interesses israelenses. O Oriente Médio tem sido historicamente a maior preocupação dos neoconservadores, mas, ultimamente, também expressam especial temor a qualquer contemporização com a Coréia do Norte, bem como com seu principal aliado e fornecedor de ajuda econômica: a China.
Para eles, Pequim sempre teve o poder de obrigar Pyongyang a renunciar ao seu plano de desenvolvimento nuclear, e que o fato de não fazê-lo demonstra que a China é em si mesma um “rival estratégico” de Washington. David Frum, ex-redator dos discursos de Bush, escreveu uma coluna para o jornal The New York Times na qual chama o governo a tomar uma série de medidas para “castigar a China” por não ter freado a Coréia do Norte. Frum, membro do AEI e a quem é atribuída a criação do conceito “eixo do mal” (formado por Coréia do Norte, Irã e Iraque), exortou Washington a interromper toda ajuda humanitária internacional a Pyongyang, pressionar a Coréia do Sul a fazer o mesmo e obrigar a China a “assumir o custo para evitar” o colapso econômico norte-coreano.
Além disso, propôs que Austrália, Coréia do Sul, Japão, Nova Zelândia e Cingapura se somem à Otan e que Taiwan, país que a China considera uma província renegada, envia observadores às reuniões dessa organização. Também reclama que Washington “estimule o Japão a renunciar ao Tratado de Não-proliferação Nuclear e construa sua própria dissuasão atômica”. Um “Japão nuclear é o que mais temem China e Coréia do Norte, depois, talvez, de uma Taiwan ou uma Coréia do Sul nuclear”, afirmou. Ajudar Tóquio a obter armas nucleares “não seria apenas um castigo para China e Coréia do Norte, mas também contribuiria para atingir a meta de dissuadir o Irã” em suas tentativas de obter armamento atômico, acrescentou.
(Por Jim Lobe, IPS, 16/10/2006)
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