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2006-10-10
Os criadores de salmão em mar aberto matam um grande número de peixes silvestres, ameaçando várias espécies deste gênero, afirma um estudo feito pela província canadense de Columbia Britânica. A pesquisa mostra que o piolho marinho, um parasita dos peixes existente nos criadouros de salmão localizados ao longo da costa desta província, mata mais de 95% das crias que nadam para mar aberto. “É uma conclusão alarmante”, disse a bióloga Alexandra Morton, da Sociedade de Pesquisa Raincoast e co-autora do estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences. “Neste ritmo, não teremos mais salmão silvestre”, disse Morton à IPS.

O estudo apresenta a quase certeza de que a fonte de infestação de piolhos marinhos e a aqüicultura, em auge na Columbia Britânica, onde dezenas de milhões de salmões de uma espécie autóctone do Oceano Atlântico são criados, em redes, em mar aberto ao longo da costa do Oceano Pacifico. “O debate terminou”, afirmou a bióloga. O impacto de mais de cem grandes criadouros na costa dessa província canadense foi muito questionado na ultima década. A região é a quarta produtora, registrando vendas acima de US$ 300 milhões ao ano, principalmente para os Estados Unidos.

A espécie cultivada, por não ser originaria do Pacifico, é propensa a infestar-se de piolhos marinhos – pequenos parasitas que se alimentam das membranas da mucosa e da pele – que normalmente não são encontrados em grandes quantidades, exceto nos criadouros de peixes, onde cerca de um milhão de indivíduos podem ser contagiados. Por outro lado, o salmão adulto originário do Pacífico vive em mar aberto. Mas remonta os rios e cursos de água de muitas montanhas da região para desovar na primavera e no outono,antes de morrer. Pouco depois de nascer os jovens salmões descem a corrente para as desembocaduras e entradas de rios e cursos de água, onde se encontram com os criadouros e com nuvens subaquáticas de piolhos marinhos.

O padrão de imigração das crias as mantêm afastadas dos adultos, portadores dos piolhos, disse o co-autor do estudo Martin Krksek, doutorando do Centro de Matemática Biológica da Universidade de Alberta. “Mas os criadouros costumam estar nos piores lugares”, afirmou à IPS. Os pesquisadores seguiram a trajetória dos peixes ao longo de sua rota migratória, por mais de cem quilômetros, tomando amostras a cada dois quilômetros. Encontraram piolho marinho em mais de 14 mil peixes. “Pode-se ver como aumenta a infestação na medida em que se aproximam dos criadouros”, afirmou Krkosek.

O piolho do mar pode se deslocar mais de 50 quilômetros para investar um hospedeiro, segundo a nova pesquisa da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia. Krkosek e outros cientistas usaram modelos matemáticos sofisticados para saber se a concentração de piolhos do mar procede dos criadouros ou de outras fontes prováveis, e concluíram que eles são a causa principal. “O trabalho é de um impecável alto nível e será muito difícil de ser questionado”, disse Andy Dobson, epidemiologista da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, especializado em doenças relativas à fauna e à flora natural. Além disso, junta muitas pontas soltas de outros estudos sobre o parasita e quantifica seus impactos, destacou Dobson.

Para determinar as conseqüências, foram feitos testes de mortalidade com mais de três mil peixes. “Basta somente um, ou dois, piolho do mar para matar uma cria de salmão vermelho”, disse Krkosek. “As crias são muito vulneráveis por serem muito pequenas, medem entre três e cinco centímetros de comprimento”, explicou. “No melhor dos casos, um aumento de 10% na mortalidade causada pelo piolho do mar presente nos criadouros para colocar a reserva de peixes em alerta máximo,” afirmou o biólogo John Volpe, co-autor de uma pesquisa da Universidade de Victoria. “Creio que nosso estudo mostra claramente que há graves problemas com o cultivo do salmão em mar aberto”, afirmou Krkosek.

Está pesquisa é a mais detalhada já feita até agora, mas os especialistas já sabiam, ou suspeitavam, que o piolho do mar existente nos criadouros estava diretamente implicado na redução das populações de peixes silvestres da Escócia, Irlanda e Noruega, os principais centros de criação de salmão. “Sacrificaram seu salmão silvestre pelo de criadouro”, afirmou. Mas a situação é muito diferente na Columbia Britânica, onde todo o ecossistema natural da costa oeste depende das abundantes reservas de salmão selvagem. “O salmão é o alimento de águias, ursos, baleias, lobos e, inclusive, florestas”, explicou Krkosek. A história do salmão do Pacífico é extraordinária, pois passa dois anos se alimentando em mar aberto para depois voltar à sua água natal para desovar e morrer.

Várias espécies de outros animais se alimentam de peixes moribundos que, por sua vez, deixam grandes quantidades de restos na floresta. Os corpos mortos em decomposição enriquecem o solo e servem de adubo para muitas plantas, como o imponente cedro vermelho da região e a pícea - também chamado abeto falso - de Sitka. Os pesquisadores encontraram nutrientes procedentes do salmão em folhas da copa de árvores de dois mil anos, contou Krkosek. A cria do salmão não se alimenta até chegar ao oceano.

A infestação do piolho pode ser reduzida com o uso de inseticidas, mas os produtos químicos prejudicam os camarões e outros organismos. Além disso, o tratamento é caro e o parasita pode se tornar resistente. Já não é possível cultivar o salmão em sistemas fechados para que a indústria trate os dejetos de forma adequada, em lugar de jogá-los ao mar, reconheceu Morton. Isso seria muito caro, mas a aqüicultura prejudica a ecologia oceânica enquanto obtém benefícios das correntes marinhas que limpam suas redes sem nenhum custo. Um foco de piolho do mar em criadouros no arquipélago Brougthton, ao norte da ilha de Vancouver, em 2001, exterminou 99% dos peixes autóctones salmão vermelho, entre 3,5 milhões e cinco milhões de exemplares.

Apesar disso, o governo de Columbia Britânica pôs fim, um ano depois, a uma moratória de sete anos sobre a ampliação do cultivo do salmão. O governo local nega o problema do piolho do mar, disse Morton. Doenças e infestações podem aparecer em qualquer lugar onde há grande concentração de peixes de criadouro ou outros animais em recintos de engorda e estabelecimentos de criação intensiva de gado, disse Dobson. “Quando veremos os primeiro humanos doentes por culpa da aqüicultura?”, perguntou.
(Por Stephen Leahy, Envolverde, 09/10/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=23285&edt=1

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