A globalização traz riqueza e oportunidade para várias pessoas ao redor do mundo, mas para a massa pobre que vive na, praticamente, falecida Costa do Marfim, o progresso vem trazendo doenças horríveis e morte. Após toneladas de lixo com alta-taxa de contaminação, que é enviado por países do outro lado do mundo, terem sido jogadas discretamente nas áreas próximas de Abidjan, cerca de 90 mil pessoas ficaram doentes e outras oito morreram. Isso não precisava e nem deveria acontecer.
Como reportado na segunda-feira, no New York Times, por Lydia Polgreen e Marlise Simons, o lixo – uma mistura fumegante de petroquímicos e soda cáustica – que saiu do Mediterrâneo e parou na África, poderia ter sido depositado seguramente em outro lugar durante a jornada, mas a Trafigura, a companhia suíça que alugou o transporte, não quis pagar os preços Europeus.
Os detalhes e responsabilidade legais estão sendo investigados, mas a lição ficou clara. Sem regras internacionais restritas sobre depósitos de lixo e cargas perigosas, as empresas sempre irão atrás do jeito com menos resistência, custos mais baratos, e menos regulação, arriscando a vida de pessoas nos países pobres do mundo.
Essa história começou em julho, quando um petroleiro panamenho, também alugado pela Trafigura, parou em Amsterdã e tentou se livrar de seu lixo lá, mas foi impedida , pois uma companhia holandesa que foi contratada para fazer o trabalho de retirar o lixo do petroleiro e o levar para algum local segura faria o trabalho por US$ 15 mil, mas descobriu muito mais material nocivo do que havia sido levada a acreditar. Ao contrário da conta inicial, o transporte seguro do lixo custaria US$ 300 mil, mais os gastos adicionais.
Isso fez a Trafigura procurar por alternativas mais baratas, mas para uma companhia com uma receita de US$ 28 bilhões no ano passado, o preço cobrado pela empresa holandesa não era proibitivo. Então o navio foi para vários portos, acabando em Abidjan, onde a Trafigura contratou a companhia local de transporte de lixo que fez um aterramento noturno.
A Trafigura alega que as autoridades da Costa do Marfim haviam dito que a companhia poderia fazer o trabalho seguramente. Se isso for verdade, estas autoridades foram perigosamente incompetentes. De qualquer forma, um sistema de leis internacionais mais duras – apoiadas pela aplicação de multas e outras penalidades – deve forçar a Trafigura a ponderar diversas vezes antes de contratar qualquer uma.
A não ser que tais regulamentações sejam melhoradas, os enfermos e mortos na Costa do Marfim não terão servido para nada, e toda essa história será repetida em algum outro país onde os custos são baixos, as regras são fracas, e, como um resultado inevitável, a vida humana é barata.
(The New York Times / Último Segundo, 04/10/2006)