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2006-10-03
Os Estados Unidos passaram a última década no papel de vilão ambiental. O país, campeão de emissões de gases responsáveis pelo fenômeno do aquecimento global, se recusava a tomar medidas para tornar o futuro ecologicamente mais saudável. Nos últimos meses, porém, uma onda verde tomou conta dos EUA. No alto dela, ressurge um político que parecia ter sido deixado de lado: Al Gore. Em 2000, o ex-vice-presidente conseguiu a maioria dos votos na eleição para presidente. Mas perdeu para George W. Bush pela complexa contagem de pontos vigente no país. Abalado, recolheu-se à fazenda da família, no interior do Tennessee, e retomou uma atividade que mantinha desde 1992: reunir material científico sobre o efeito estufa.

Com uma apresentação abastecida pelas mais recentes evidências dos pesquisadores, Gore rodou o mundo. Suas palestras foram transformadas no filme Uma Verdade Inconveniente, que estreará em novembro no Brasil. O livro de mesmo nome está há dois meses no topo da lista dos mais vendidos do New York Times. Gore, que vem ao Brasil no dia 17 entregar o Prêmio Eco, promovido pela Câmara do Comércio Americana, admite que está em campanha. Embora não para a Presidência.

Senhor Gore, que tipo de carro o senhor dirige?

Al Gore - Há cerca de um ano, comprei um híbrido (movido a eletricidade e gasolina). Mas não dirijo muito. Mudamos completamente nosso estilo de vida. Tomamos a decisão de eliminar qualquer contribuição de gás carbônico ao meio ambiente. Até o filme (Uma Verdade Inconveniente) foi produzido em parte usando energias alternativas e tecnologias que não emitem gás carbônico. A Paramount, que o distribui, decidiu se certificar de que a turnê e as atividades promocionais fossem feitas com o mínimo de emissão de gás carbônico possível.

Mas seu compromisso nobre parece ser apenas uma gota no oceano. O senhor mesmo diz que temos apenas dez anos antes que as mudanças climáticas comecem a destruir a humanidade.

Gore - Bem, eu acho que vamos resolver essa crise. Mas, para isso, realmente precisaremos promover muitas mudanças rapidamente.

O senhor divulga Uma Verdade Inconveniente como, "de longe, o filme mais aterrorizante que você algum dia verá". Mas o aspecto mais amedrontador é como os americanos parecem mal informados sobre o aquecimento global. Como o senhor explica isso?

Gore - O propósito do filme e do livro é mudar isso. O que importa é o motivo da desinformação. As empresas petrolíferas e de carvão têm influência demais nos Estados Unidos.

E a razão para essa influência é as indústrias estarem tão intimamente ligadas ao governo americano? Seu sucessor, o vice-presidente Dick Cheney, era, afinal, presidente da Halliburton, uma empresa petrolífera.

Gore - Sim. Liderança realmente faz diferença na forma de pensar do grande público. Bush e Cheney nos levaram para a direção errada. Mas também é verdade que muitos democratas resistem a mudar de postura nesse assunto. Acho que isso tem relação com nossa história política e cultural. Tem a ver com nossa "mentalidade de fronteira", que costumava significar desbravar novos horizontes. Agora isso faz parte de nosso hábito de percorrer grandes distâncias de carro.

O estilo de vida típico americano envolve carrões, mansões, pilhas de fast-food e ar-condicionado por todos os lados. Esse estilo de vida precisará mudar?

Gore - Um dia os Estados Unidos assinarão o Protocolo de Kyoto (que limita as emissões de gás carbônico dos países) ou algum outro tratado importante. Aí, então, as pessoas terão de pensar duas vezes. Agora as pessoas de outros países se sentem bem com seu padrão de consumo, em parte porque contrasta com o dos americanos. Quando nós mudarmos, todos precisarão ter certeza de que estão fazendo o suficiente. Essa é outra razão para que os Estados Unidos se unam à comunidade mundial. Só então o mundo poderá seguir adiante na próxima rodada de grandes mudanças.

Com todo o respeito a seu otimismo, a Guerra do Iraque não foi travada para garantir suprimentos adequados de petróleo para os Estados Unidos?

Gore - O sistema funciona mais ou menos assim, se você olhar o padrão como um todo: os Estados Unidos pegam dinheiro emprestado da China para comprar petróleo no Golfo Pérsico e queimá-lo em casa de um modo que destrói o planeta. Isso não é bom. Precisamos mudar todas essas coisas.

O senhor acha que Cheney continua agindo como o líder de uma empresa petrolífera?

Gore - Bem, preciso alertá-lo de que começo a sentir que estou perdendo minha objetividade nesta entrevista, com essas perguntas sobre Bush e Cheney.

Esses problemas poderiam ser resolvidos mais facilmente se a pessoa responsável fosse um ambientalista?

Gore- Aonde você quer chegar com essa pergunta?

O senhor parece entender. Sejamos mais diretos: o senhor vai concorrer à Casa Branca em 2008?

Gore- Sou um político em restabelecimento. Concorri em quatro campanhas nacionais. Já fiz isso. Agora encontrei outras maneiras de servir a meu país e gostei delas. Quando estou apresentando meu slide show, vejo olhares de reconhecimento na platéia. Depois ouço como as pessoas estão mudando a vida por conta dessa apresentação ou do filme. Estou satisfeito com isso. E me sinto bem porque acredito que estou conseguindo progressos.

Onde o senhor vê esse progresso?

Gore- Acho que as mudanças estão em andamento. Oitenta e cinco pastores conservadores evangélicos, há muito aliados do presidente Bush, acabam de anunciar sua oposição às políticas ambientais dele. E chamaram suas congregações para resolver essa crise. Alguns líderes de grandes empresas que antes apoiavam Bush, incluindo o presidente da General Electric, agora romperam com ele nesse tema. Cerca de 230 cidades, muitas delas com prefeitos republicanos, ratificaram independentemente o Protocolo de Kyoto. Organizações populares em todos os Estados estão juntando assinaturas e se organizando. Tudo isso me faz acreditar que a mensagem está tendo um impacto. E agora há outra voz no debate: a mãe natureza está falando.

O senhor se refere a desastres naturais como o furacão Katrina?

Gore - Isso foi como um despertador para milhões de americanos.

O senhor fez mais a respeito das mudanças climáticas quando esteve na Casa Branca?

Gore - Gostei de fazer parte da administração Clinton-Gore. Tenho orgulho do trabalho que fiz. Ajudei a conseguir um resultado na conferência de Kyoto. E trabalhei duro para fazer mudanças na política ambiental americana. Mas não era a minha administração. Eu a compartilhei. E aprendi nesse processo que a necessidade mais urgente era mudar a mentalidade do povo americano. Porque os políticos, ecologistas ou não, só serão capazes de fazer mais ou menos dependendo de como as pessoas se sentem em relação à crise ambiental.

O senhor quer transformar a crise das mudanças climáticas de assunto político em um tema moral?

Gore - Sim. O movimento dos direitos civis nos Estados Unidos começou a fazer progressos quando foi redefinido como um assunto moral. E a crise climática deveria ser vista como um tema moral e uma responsabilidade ética em vez de um assunto político. Porque a sobrevivência da civilização humana está em risco. Nós só temos um planeta. Temos um futuro comum e ele não é republicano ou democrata, conservador ou liberal.

Alguns republicanos diriam que o senhor é um abraçador de árvores, que está distante dos problemas da classe média americana.

Gore - Primeiro, é um mito dizer, como às vezes eles dizem, que você precisa escolher entre o meio ambiente e a economia. Bilhões de dólares são gerados por empresas que trazem soluções para essa crise. Os antigos modelos econômicos não são agradáveis mesmo e envolvem coisas como ficar parado nos congestionamentos ou respirar fumaça. Preferiria ter sistemas ferroviários leves e transporte de massa confortável. Podemos melhorar a qualidade de vida, criar mais trabalhos e aumentar salários à medida que limpamos o meio ambiente. Olhe para a indústria automobilística. Os republicanos argumentam que os Estados Unidos devem ter os piores níveis mundiais de quilômetro rodado por litro de combustível para ajudar a General Motors e a Ford. E o que está acontecendo com a GM e a Ford?

Estão perdendo mercado.

Gore - Sim. E as empresas que estão se destacando são companhias como a Toyota, que produz o Prius (carro híbrido). Há uma longa lista de espera para comprar os carros que elas produzem.

Alguns grandes poluidores já começaram a mudar. A empresa de petróleo Exxon Mobile começou a usar temas ambientais em suas propagandas.

Gore - A Exxon Mobile está fingindo dizer algo positivo sobre o meio ambiente. Isso é chamado green-washing (lavagem verde). Eles são os piores inimigos nesta crise. Gastam milhões de dólares por ano para disseminar informações falsas a respeito do aquecimento global. É realmente chocante. É o que as empresas de cigarro fizeram para iludir as pessoas sobre a relação entre o fumo e as doenças pulmonares. Eles deveriam ter vergonha.

Quem será o líder dos democratas em 2008 se o senhor não estiver disponível? Hillary Clinton?

Gore - Não sei. É muito cedo para dizer.

A revista Vanity Fair colocou o senhor na capa de sua edição sobre meio ambiente...

Gore - ...junto com Julia Roberts e George Clooney.

O senhor não se sente pelo menos um pouco lisonjeado de ser considerado por todos um candidato para 2008?

Gore - Claro. Sou humano. Mas sou também velho o suficiente agora e já passei por coisas suficientes em política para não levar isso tão a sério. Já estou em campanha, mas não por uma candidatura. É uma campanha por uma causa. E a causa é mudar a mente das pessoas no mundo todo, especialmente nos Estados Unidos, sobre a necessidade de resolver esta crise climática. Se não fizermos isso, o resto não importará em nada. Não importa como você será lembrado nos livros de História se não houver livros de História. E ninguém para lê-los! (Risos.)

Quando o senhor descobriu seu senso de humor negro? Depois da eleição de 2000?

Gore - Dizem que muita comédia nasce da dor. Meu senso de humor sempre se dá bem com baixas expectativas.
(Andreas Borcholte e Martin Wolf, Der Spiegel/Época, 02/10/2006)
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG75408-6014-437-1,00.html

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