Moscou emperra megaprojeto da Shell
2006-10-02
As autoridades russas continuam intensificando a pressão sobre as grandes companhias estrangeiras envolvidas no gigantesco projeto petrolífero e gasífero Sakhalin 2, avaliado em US$ 20 bilhões. Os controles ambientalistas que ameaçam interromper este projeto "baseiam-se exclusivamente nas exigências formuladas pela lei", disse o chanceler russo Sergei Lavrov, em uma conferência para 300 investidores reunidos nesta ilha do Extremo Oriente russo, muito rica em hidrocarbonetos.
Com isto, Lavrov justificava a firmeza do governo de Moscou, mas amenizou os termos: "A idéia de que os estrangeiros estão sendo expulsos do mercado russo de energia carece de fundamento". Nesta semana, o presidente russo, Vladimir Putin, pediu a seu governo que "adote medidas" contra as companhias que "não respeitam os acordos de licenças". A promotoria russa anunciou na semana passada que anulava "por decreto" um documento sobre a proteção do meio ambiente que permitia à Royal Dutch Shell prosseguir seu projeto em Sakhalin 2. Esta anulação acarreta de fato a suspensão dos trabalhos.
A decisão do governo de Moscou gerou maciços protestos no exterior, e especialmente no Japão. A anulação deste informe é "injusta, unilateral", além de carecer de "transparência", deplorou o embaixador japonês na Rússia, Yasuo Saito. Sakhalin 2, controlada em 55% pela Royal Dutch Shell, e em 25% e 20% respectivamente pelas empresas comerciais japonesas Mitsui e Mitsubishi Corporation, é o maior investimento privado jamais realizado no mundo no setor energético. O projeto, decidido em 2003, pretende exportar por navio, a partir do verão boreal de 2008 e durante mais de 20 anos, gás natural liquefeito (GNL) para grandes companhias japonesas de eletricidade e de gás.
O Japão, a segunda economia mundial que depende quase exclusivamente do instável Oriente Médio para abastecer-se de energia, busca atualmente diversificar suas fontes de fornecimentos. O projeto Sakhalin 2 inscreve-se no âmbito desta diversificação.
As perdas, em caso de atraso, poderão chegar a US$ 10 bilhões e causarão "danos sem precedentes à reputação da Rússia como fornecedora confiável de energia", ressaltou Ian Craig, diretor do consórcio Sakhalin Energy, que supervisiona o projeto. Por sua vez, os ecologistas aplaudiram a decisão das autoridades russas, destacando que já é hora de as grandes companhias estrangeiras respeitarem as normas ambientais na ilha, dotada de um ecossistema frágil. No entanto, muitos analistas duvidam da sinceridade das preocupações ecológicas do governo russo.
Sakhalin tem reservas avaliadas em 45 bilhões de barris de petróleo, destinados a alimentar um mercado asiático em plena expansão. O gigante russo do gás controlado pelo Estado, Gazprom, firmou um acordo com Royal Dutch Shell, Mitsui e Mitsubishi, para obter uma cota de 25% no projeto. Contudo, as modalidades deste acordo continuam sendo objeto de conversações. Além disso, Moscou está em conflito com o consórcio Sakhalin Energy desde o anúncio de que o custo do projeto passará de US$ 10 bilhões para US$ 20 bilhões, o que atrasará a entrega para o Estado russo da parte dos benefícios que espera, uma vez que os investimentos iniciais se paguem.
Vários analistas acreditam ainda que a Rússia tenta, com este conflito, fortalecer seu controle sobre Sakhalin 2, e pressiona a Shell para atender aos interesses da Gazprom. "O objetivo, depois dos argumentos ecológicos, é ajudar a Gazprom a fazer um negócio melhor" em suas transações com a Shell, afirma Stephen O’Sullivan, do banco de investimentos Deutsche UFG, localizado em Moscou. Valeri Garipov, um ex-ministro de Energia da Rússia, atualmente funcionário da Câmara de Comércio russa, admitiu que o principal problema do megaprojeto Sakhalin 2 é que ele "não é russo".
kicker: Sakhalin tem reservas avaliadas em 45 bilhões de barris de petróleo, destinados a alimentar um mercado asiático em plena expansão.
(Gazeta Mercantil, 02/10/2006)
http://www.gazetamercantil.com.br/integraNoticia.aspx?Param=9%2c0%2c1%2c231420%2cYTRE