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2006-09-29
As caras sonolentas não escondiam quão cedo aquelas 196 pessoas tiveram que acordar para embarcar em uma inusitada navegação pelo rio mais poluído da cidade de São Paulo: o Tietê. Ao desembarcarem dos cinco ônibus que os levaram até o chamado Cebolão, não houve quem não tapasse o nariz. "Que cheiro horrível!", tentavam ser elegantes os adultos. "Ai que fedor!", diziam, despudoradas, as crianças da Escola Nossa Senhora das Graças no mais novo projeto de educação ambiental do colégio.

A empolgação de entrar em um barco com capacidade para transportar 200 pessoas quase fez com que pais e alunos esquecessem de todo aquele lixo acumulado nas margens do rio. "A coleta do lixo passou de 70 para 80%; o tratamento da água saltou de 24 para 64% e a mancha de poluição recuou 120 quilômetros", informou aos navegantes João Nojiri, criador do projeto Navega São Paulo que pretende "resgatar a identidade do rio promovendo ações educativas com crianças, jovens e adultos".

A idéia é simples: educar as crianças hoje para que elas, no futuro, preservem o rio que percorre 22 quilômetros dentro da maior cidade da América Latina. Mas o objetivo é ambicioso: cuidar do rio a ponto de ele vir a ser um local de lazer assim como acontece hoje com o Sena, em Paris (França). Para que esse sonho vire realidade, acredita o empresário, é preciso educar as crianças para que elas cuidem do rio.

"Nossa, olha lá um rato morto!", dizia uma das crianças. "Quanta garrafa pet!", lamentava outra. "Um sofá, olha gente, tem um sofá bem ali!", se surpreendia uma terceira. Esse era o objetivo: fazer com que as crianças percebessem que o lixo acumulado no rio é resultado da ação do homem. "Quando eles tiverem 20 anos, vão estar tinindo", entusiasmava-se o diretor da escola, Eduardo Roberto da Silva, imaginando o bem que o colégio fazia às crianças ao colocá-las em contato direto com o lixo e o mau cheiro.

Logo que o barco partiu para as duas horas de navegação, as crianças do Gracinha receberam várias informações sobre como o rio poderia vir a ser utilizado. Maquetes montadas no andar superior mostravam as possibilidades de transportar carga (alimento, papel, ferro) e pessoas pelo rio e um instrutor contava o que poderia vir a ser feito ao longo do Tietê em termos culturais e de lazer. Mas, a paisagem degradada e o mau cheiro quase bloquearam a imaginação daquelas crianças. Em blocos, propositadamente distribuídos para a garotada, os estudantes registraram suas impressões.

"O rio tem cachorro morto; rato morto; garrafas pet; muito, muito, muito lixo e fede muito", dizia o texto de Laís, de 12 anos, que continuava: "o rio não tem movimento; tem embalagens, brinquedos, panela, capacete". E finalizava: "Mas é uma oportunidade única de melhorar". Ela não foi a única a captar a mensagem. Frederico Inácio, de 11 anos, apresentava a solução: "É preciso parar de jogar esgoto no rio". "Acho que deveriam colocar placas nas ruas e ensinar nas escolas que não pode sujar o rio", sugeria Mônica Fumagalli, também de 11 anos. "A opção mais óbvia é limpar o rio", dizia Pedro Lima, de 11 anos.

"Dá para fazer aula dentro do barco. Montar uma banda de instrumentos de sopro. A Universidade Livre de Música Tom Jobim pode ceder os professores", imaginava o músico e pai de aluna do Gracinha, Arrigo Barnabé. Era apenas uma das várias idéias tidas pelos chamados "pais do Gracinha" que, em outubro, vão se reunir para montar um projeto educacional com o Navega São Paulo. Uma parceria com a organização não-governamental Cidade Escola Aprendiz deve ensinar crianças e adolescentes a fazer mosaicos durante o percurso para que, mais tarde, venham a ser instalado ao longo da calha do rio.
(Envolverde, 28/09/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=22962&edt=1

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