Áreas de preservação são transformadas em depósitos clandestinos de lixo em Passo Fundo
2006-09-26
A falta de planejamento urbano e respeito à natureza são problemas enfrentados pelos médios e grandes centros do país. Passo Fundo há muito enfrenta o problema da invasão de construções em áreas de preservação, o descuido e a transformação desses locais em depósitos clandestinos de lixo.
O banhado da Vergueiro, infelizmente, engloba todas essas características. Entre as décadas
de
80 e 90, o próprio poder público despejava resíduos da limpeza do cemitério da Vera Cruz
naquela área.
Para reverter essa cena, na tarde de sábado (22/09), o Gesp (Grupo Ecológico Sentinela dos
Pampas) realizou um mutirão de limpeza e recolhimento do lixo depositado nos terrenos. A
idéia
era comemorar os 26 anos da entidade, completados no último dia 21, e promover a
conscientização ambiental, além de chamar a atenção do poder público para que a
concretização
do Parque Municipal Ambiental Banhado da Vergueiro saia do papel.
Já existe para isso um recurso do governo estadual de cerca de R$ 290 mil que servirá para a
desapropriação das áreas privadas. O Fundo Municipal do Meio Ambiente, segundo o presidente
do
grupo, Paulo Fernando Cornélio, já sinalizou que seus recursos poderão ser aproveitados na
consolidação do projeto. No entanto, o Gesp, que luta desde a década de 80 por essa causa,
tem
consciência de que o projeto depende de grandes investimentos. Como o local será de
preservação ambiental, lazer e recreação, além dos recursos financeiros, dependerá de
políticas adequadas para a preservação.
De acordo com Cornélio, a administração municipal está comprometida com a criação do parque
e
para isso, através de um ajustamento de conduta entre a prefeitura e o Ministério Público,
já
deverá construir no próximo ano uma praça, um dos elementos do parque. "Não queremos que
aconteça com essa área o mesmo que ocorreu com o Parque da Gare, que ainda não foi concluído
e
ao qual não foi dada a devida importância. Agora temos essa área e queremos efetivar a
construção do parque. O projeto já está incluído nas discussões do PDDI e consideramos isso
uma vitória," conta Paulo Fernando.
Antes da construção, deverá ser realizado um estudo para o projeto de recuperação das áreas
que ainda podem ser preservadas. Outras áreas deverão ser adicionadas, mas com projetos que
respeitem os elementos que ainda têm. "Temos cerca de um metro e meio de lixo,
principalmente
doméstico e entulho de construção e alguns locais já não há mais esperança de recuperação
ambiental. Por isso, queremos aliar a área de recreação e lazer com a de preservação,"
revelou.
A maioria das pessoas que reside no entorno da área é aliada ao grupo ecológico e quando
verifica caminhões despejando lixo, imediatamente os denunciam aos órgãos competentes.
Há 40 anos
A geógrafa e militante do Grupo Ecológico Sentinela dos Pampas, Lucinda Gonçalves Pinheiro,
conta que a primeira casa de alvenaria construída na rua Tupinambás foi a de sua família.
Havia apenas o quartel e uma casa em outra rua. Por isso, há 40 anos ela acompanha a
degradação do banhado da Vergueiro. Lucinda Conta que seu pai tinha uma leiteria e que
quando
iam até aqueles terrenos para recolher algumas vacas se deparavam com os recrutas do quartel
fazendo treinamento naquele lodo. O local também tinha pontos de onde brotava água. "Os
passo-fundenses não têm mais o privilégio de ver isso na cidade," revela com tristeza.
O banhado era um manancial que abastecia o rio Passo Fundo, talvez o mais significativo pela
sua extensão. Havia um grande canal que saía do local, passava por onde hoje é o
supermercado
da Vergueiro, que se encontravam com outro que vinha do centro, assim o volume de água que
chegava ao rio passo Fundo era enorme.
Para ela, a falta de cultura quanto à preservação de banhados e a especulação imobiliária,
que
foi intensa nas décadas de 80 e 90, são as principais causas de os terrenos estarem em
situação de degradação. "Hoje vemos que o rio Passo Fundo sofre com todas essas perdas. Mas,
ainda temos alguns resquícios. Na área pública tem um olho d`água, do qual brota
aparentemente
água limpa."
A geóloga diz ainda que os condomínios da rua Teixeira Soares largam seu esgoto no arroio do
Combate, que há seis anos foi drenado e canalizado. "Naquela época vim aqui e dava para
enxergar o perfil do solo, com uma argila colorida. Acredito que hoje temos apenas cerca de
2%
da área original."
Banhados
De acordo com Lucinda, os banhados são reguladores do clima e funcionam como uma espécie de
esponja. Na época das chuvas dão vazão à água para o lençol freático e nas épocas de seca
seguram a umidade. Nos períodos de chuva, quando não existem os banhados e as calhas dos
rios
vão desaparecendo, a água não tem como infiltrar e escoar. A grande causadora disso é a
urbanização sem planejamento das cidades, que impermeabiliza tudo e acaba por compactar a
terra e não permitindo a passagem da água. Por isso, vemos que os grandes centros urbanos
alagam com freqüência. As áreas de banhado também são ricas em fauna e flora.
(O Nacional, 25/09/2006)
http://www.onacional.com.br/