SBPC divulga nota em apoio ao jornalista Lúcio Flávio Pinto, processado por empresário
2006-09-22
A liberdade de imprensa é um prato constante no menu de debates da intelectualidade brasileira, sobretudo entre aqueles que a encaram como condição indissociável ao exercício pleno da democracia.
Nesse contexto, vem sendo emblemática a sucessão de processos movidos contra o jornalista Lúcio Flávio Pinto, proprietário e editor do jornal paraense Pessoal, em cujas páginas se observa uma contínua batalha em prol da conservação ambiental.
Na semana passada, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Pará manteve a condenação que lhe fora imposta, no ano passado, pelo juiz Amílcar Guimarães, que acolheu a ação de indenização proposta pelo empresário Cecílio do Rego Almeida e condenou o jornalista a pagar-lhe oito mil reais, mais acréscimos.
“Meu crime foi uma matéria que escrevi no meu Jornal Pessoal, em 2000, comentando reportagem de capa da revista Veja de uma semana antes, que apontava o dono da Construtora C. R. Almeida como o maior grileiro do mundo”, diz Lúcio Flávio Pinto no texto “À opinião pública”, que AmbienteBrasil reproduziu no início desta semana.
"Com base em um título de terra que ninguém jamais viu e todos os órgãos públicos negam que exista, o empresário se declarava – e continua a se declarar – dono de uma área que poderia chegar a sete milhões de hectares no vale do rio Xingu, no Pará, região conhecida como “Terra do Meio”, na qual há a maior concentração de mogno da Amazônia (o mogno é o produto de maior valor da região)”, prossegue o jornalista.
Mas, em paralelo aos dissabores das contendas judiciais, Lúcio Flávio recebe, também, o apoio de organismos como a Rede Brasileira de Jornalistas Ambientais – RBJA – e, mais recentemente, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC -, instituição da qual integra o Conselho.
Ontem, a SBPC divulgou a seguinte nota, assinada por seu presidente, Ennio Candotti:
"A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Pará manteve a condenação imposta no ano passado pelo juiz Amílcar Guimarães ao conselheiro da SBPC, o jornalista Lúcio Flávio Pinto, por uso da expressão pirata fundiário ao se referir, em artigo de sua autoria, ao senhor Cecílio Rego de Almeida.
Examinando os autos do processo não encontramos razões que justifiquem os juízos e legitimem a sentença e tanto menos a manutenção da condenação. Lúcio Flávio Pinto é jornalista respeitado e suas sólidas denúncias sobre a apropriação ilícita de patrimônio público e devastação da natureza em terras da Amazônia encontram amplo respaldo na literatura especializada e documentação corrente.
Ao relevar os fatos e procurar na cor dos adjetivos razões para justificar sua sentença o juiz Amílcar Guimarães e aqueles que agora a confirmaram, desembargadores Luiza Nadja Nascimento e Geraldo Corrêa Lima, revelam a distância que, como juízes, os separam de um sereno exame do mérito da matéria em questão. Como cidadãos denotam alheamento às tragédias humanas e às agressões à natureza que Lúcio Flávio Pinto, com rigor e perseverança, tem denunciado no caso em questão no Jornal Pessoal e em tantos outros artigos em revistas especializadas e de ampla circulação.
Manifestamos nosso indignado protesto pela condenação ora referendada pela 3ª Câmara Cível de Belém.
A SBPC expressa sua solidariedade ao ilustre conselheiro de nossa Sociedade a quem acompanhará na busca de reparo à injustiça ora sofrida nas instâncias superiores dos tribunais da Nação."
Em novembro passado, Lúcio Flávio foi um dos quatro profissionais - o único brasileiro - premiados pelo Comitê de Proteção aos Jornalistas (Committee to Protect Journalists), que se classifica como “uma organização independente dedicada a proteger a imprensa livre no mundo”. Há quinze anos, a entidade entrega, anualmente, prêmios a quatro profissionais cuja rotina envolva o enfrentamento do autoritarismo e de perseguições de qualquer ordem.
A festa da premiação aconteceu em New York, mas Lúcio Flávio não compareceu. Respondia a 18 processos e, “em prisão domiciliar não formalizada” - como ele mesmo dizia -, viu-se impedido de deixar o Brasil.
(Por Mônica Pinto, AmbienteBrasil, 21/09/2006)
http://www.ambientebrasil.com.br/noticias/index.php3?action=ler&id=26918