Restaurar a camada de ozônio no Pólo Sul vai demorar 60 anos
2006-09-21
Outro gigante buraco na camada de ozônio surgiu sobre a Antártida, enquanto cresce a evidência de que 20 anos de esforços internacionais finalmente ajudaram a atmosfera a começar a se recuperar. O buraco do Pólo Sul – um afinamento anual da camada de ozônio que protege a Terra da radiação ultravioleta do Sol – mediu, no dia 8 de setembro, cerca de 24 milhões de quilômetros quadrados, quase o tamanho da América do Norte, segundo estimativa do renomado Estudo Antártico Britânico, organismo científico que faz pesquisas na região há 60 anos.
Além disso, a governamental Divisão Antártica Australiana afirmou que o buraco continuará crescendo este ano, provavelmente até se converter, provavelmente, em um dos maiores e mais profundos, com 28 milhões de quilômetros quadrados. O mais extenso já registrado foi de 30,3 milhões de quilômetros quadrados, em 2000.
Ao mesmo tempo que cresce o buraco, aumenta a evidência de que a camada de ozônio finalmente está começando a recuperar-se acima das latitudes médias nos dois hemisférios, segundo informou o Instituto de Tecnologia da Geórgia (EUA). “No estudo que acabamos de publicar, concluímos que o Protocolo de Montreal (1987), primeiro acordo global importante vinculado à mudança climática, está funcionando”, anunciou no dia 9 de setembro Derek Cunnold, cientista do instituto. O Protocolo de Montreal, assinado por 184 nações, foi concebido para fazer a camada de ozônio voltar à normalidade, ao determinar a eliminação paulatina do uso de clorofluorcarbonos e outra centena de produtos químicos que destróem as moléculas do ozônio atmosférico.
A camada de ozônio cobre todo o planeta a uma altitude entre 15 e 30 quilômetros, protegendo organismos vivos dos prejudiciais raios ultravioletas. Em meados de agosto, a Organização Meteorológica Mundial e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) divulgaram um estudo preparado por 250 cientistas que coincidiram em afirmar que a camada de ozônio está se recuperando, embora muito mais lentamente do que se acreditava. A camada voltará aos níveis anteriores aos de 1980, na maior parte do mundo, somente por volta de 2040, cinco anos depois do estimado em 2002. Na Antártida a recuperação será mais lenta, provalvemente, não antes de 2065, segundo o documento.
“A demorada recuperação é uma advertência de que não podemos dar como pronta a restauração da camada de ozônio e devemos acelerar nossos esforços para paulatinamente eliminar o uso dos produtos químicos prejudiciais”, disse Achim Steiner, diretor-executivo do Pnuma, por ocasião do Dia Mundial da Preservação da Camada de Ozônio, comemorado todo dia 16 de setembro. O constante estreitamento da camada no Pólo Sul preocupa, bem como a ineficácia no controle das substâncias que afetam o ozônio.
“Não existe nenhuma razão para comemorar. O buraco na Antártida está tão grande quanto sempre foi e a Terra está exposta a uma radiação ultravioleta sem precedentes”, disse ao Terramérica Alexander von Bismarck, da não-governamental Agência de Pesquisa Ambiental (EIA), com sedes em Washington e Londres. “Ainda não conhecemos os impactos completos desta exposição”, disse o especialista, afirmando estar “seriamente preocupado pelos obstáculos que há pela frente, entre eles o contrabando de produtos químicos”.
A EIA realizou investigações sigilosas sobre a venda ilegal de grandes quantidades de clorofluorcarbonos, principalmente da China para os Estados Unidos e outros países. A China prometeu investigar o assunto depois que, este ano, a EIA apresentou evidência em vídeo, mostrando funcionários de uma empresa química chinesa explicando como etiquetam mal e subdeclaram produtos para exportar a países onde estão proibidos, disse Von Bismarck. “Claramente, é muito difícil controlar a produção de clorofluorcarbonos na China”, acrescentou. Os países em desenvolvimento devem reduzir essa substância até 2010.
Além do contrabando, é preocupante a “isenção de uso crítico” de alguns produtos previstos no Protocolo, como o temido pesticida brometo de metila. Em 2005, os Estados Unidos pressionaram furiosamente para conseguir essa isenção para o uso de quase dez milhões de quilos de brometo de metila – muito mais do que todo o resto do mundo –, e conseguiram. Este ano, os Estados Unidos têm permissão para usar e fabricar oito mil toneladas. “O uso norte-americano dessa substância terá um impacto maior na camada de ozônio do que todos os clorofluorcarbonos produzidos no resto do planeta”, afirmou Von Bismarck.
O Protocolo de Montreal é considerado um dos tratados ambientais internacionais de maior sucesso, em parte porque o mundo agiu rapidamente para reduzir os clorofluorcarbonos, e também porque foram encontrados produtos químicos mais amigáveis com o ozônio: os hidroclorofluorcarbonos (HCFC) e os hidrofluorcarbonos (HFC). Embora estes produtos destruam menos ozônio, são gases que também provocam o efeito estufa (responsável pela mudança climática), além de extremamente potentes, de mil a dez mil vezes mais do que o dióxido de carbono. Os hidroclorofluorcarbonos, mais conhecidos como refrigerantes R-22, são usados em praticamente todas as casas, automóveis e sistemas de ar-condicionado. Sua produção mundial disparou, especialmente na China, segundo Von Bismarck.
Neste ritmo, “dentro de dez anos o impacto das emissões mundiais dos HCFC e HFC sobre o aquecimento global competirá com as emissões totais de gases causadores do efeito estufa de toda a União Européia”, previu o especialista. Um relatório da EIA estima que, para 2015, os HFCFC e os HFC acrescentarão à atmosfera o equivalente a três bilhões de toneladas de dióxido de carbono, o dobro, ou triplo, de todas as reduções estipuladas pelo Protocolo de Kyoto. Os hidroclorofluorcarbonos não serão reduzidos até 2040.
(Eco AgÊncia, 20/09/2006)
http://www.ecoagencia.com.br/index.php?option=content&task=view&id=1840&Itemid=2