O sufocante efeito de ilha térmica no Japão
2006-09-04
Os brilhantes arranhas-céus que povoam a paisagem urbana japonesa representam o poder econômico do Japão, mas também constituem enormes canhões que capturam o calor e aumentam a temperatura ambiente, no que é conhecido como efeito de ilha térmica. O calor emitido por condicionadores de ar, motores de combustão interna e outros aparelhos não encontram via de escape, o que provoca aumento de vários graus na temperatura, especialmente no verão. Ao mesmo tempo, os edifícios impedem a circulação dos ventos. Isso obriga as autoridades japonesas a buscar constantemente novas maneiras de refrescar uma cidade que ferve.
Há anos, a lei determina a plantação de arbustos e outras espécies nos terraços de edificações altas, mas o crescimento da selva de cimento foi tão acelerado que se contrapôs ao efeito dessa medida. “Tóquio se converteu em um pesadelo por causa da política do governo, que prioriza a economia acima da proteção ambiental”, disse a especialista no efeito de ilha térmica Komichi Ikeda, subdiretora do Instituto de Pesquisa Ambiental, organização acadêmica privada. Ikeda explicou que o auge da construção do Japão tem suas raízes no estímulo ao valor dos imóveis, o que rendeu altos ganhos aos proprietários de terrenos e às empresas construtoras, às custas do meio ambiente e da saúde dos moradores.
Um relatório divulgado este ano pelo governo metropolitano da capital japonesa mostra que a temperatura média em Tóquio aumentou três graus durante o século XX. “Acompanhando este aumento da temperatura, o consumo de eletricidade aumentou quatro vezes desde os cinco milhões de quilowatts de 1975, em grande parte por causa dos aparelhos de ar-condicionado”, afirmou Takako Yamaguchi, funcionária municipal encarregada de controlar o efeito de ilha térmica. Yamaguchi também disse à IPS que desde 1975 aumentou de 14 para 35 o número de dias do ano com temperaturas superiores a 35 graus.
Com uma umidade em torno dos 70%, os verões se tornaram tórridos e incômodos para os 12,5 milhões de habitantes de Tóquio. A população da cidade quase duplica durante as horas do dia, quando recebe trabalhadores e pessoal de escritório. As mortes relacionadas com o esgotamento por causa do calor no centro da capital aumentaram de 17 para 23 entre 2003 e 2005, segundo o Ministério da Saúde. Em Tóquio vivem cerca de 600 mil pessoas com asma, e este problema se agrava por causa dos gases expelidos pelos automóveis. Em todo Japão, há três milhões de asmáticos. Neste verão, enquanto os japoneses estão sufocados pelo calor e pela umidade, o efeito de ilha térmica está na boca de todos.
As altas estruturas dos edifícios que formam uma muralha na Baía de Tóquio agora impedem que a cidade se refresque durante a noite. O muito admirado brilho do néon da costa de Shinagawa obstrui a brisa fresca noturna que antes fluía pela cidade. O distrito de Shinagawa, antes cheio de depósitos, hoje está lotado de centros comerciais. Ali foi construída uma nova estação de trens-bala. Em 1997, havia apenas cinco prédios com mais de 13 andares. Em 2003, havia mais 84. As áreas próximas ao mar agora estão mais amenas à noite do que antes, segundo o governo metropolitano. A temperatura também baixa em zonas vizinhas aos parques.
Yamaguchi disse que, além das regulamentações sobre a instalação de jardins nos arranhas-céus, as estradas deveriam ser construídas com um emaranhado de tubulações abaixo da superfície para circulação de água do mar fresca bombeada desde a Baía de Tóquio. Outras soluções caras em estudo incluem o armazenamento de neve transportada desde a ilha japonesa de Hokkaido. “Pela primeira vez na historia oferecemos subsídios, por até US$ 20 milhões para o presente ano fiscal, que representam um terço do orçamento destas instlações’, explicou. Porém, Ikeda não se impressiona com esses ambiciosos planos. “Todos esses passos são importantes, mas como de costume, o governo se nega a tratar as causas do efeito da ilha térmica, restringindo a construção de edifícios altos ou a circulação de automóveis”, afirmou.
(Por Suvendrini Kakuchi, Envolverde, 01/09/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=22129