Florianópolis na rota das aves migratórias
2006-09-04
A movimentação começa a se intensificar. Enquanto alguns visitantes encerram sua estada e se preparam para voltar para casa, outros grupos chegam para passar a temporada. Apesar da semelhança, não se trata de turistas, mas de aves migratórias que procuram no território catarinense um local seguro para a busca de alimento e preparação para um novo período reprodutivo. Para aqueles que gostam ou têm interesse no assunto, a época se torna bastante propícia para a observação destes visitantes que trazem um novo colorido para os céus e praias do Estado.
A bióloga ornitóloga da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fatma) Lenir Alda do Rosário, autora do livro "As Aves de Santa Catarina", explica que nesta época do ano há uma maior movimentação das aves pois ocorre um encontro entre dois movimentos migratórios. Enquanto as espécies do Hemisfério Norte começam a migrar em direção ao Sul para fugir do inverno que se aproxima, as aves do Hemisfério Sul, que ainda estão na região, fazem o movimento contrário, retornando para seus locais de origem.
Primavera
As espécies típicas do Hemisfério Norte começam a chegar na Grande Florianópolis a partir da segunda quinzena de agosto e início da primavera, ficando por aqui até meados de março e abril. Com a aproximação do inverno na América do Norte e Europa, estas espécies fogem do frio intenso e da neve, vindo buscar alimento nos territórios mais ao Sul, onde a primavera começa em breve.
Durante a estada em território catarinense, estas aves aproveitam o alimento abundante para se preparar para um novo período reprodutivo. O mesmo ocorre com as espécies do Hemisfério Sul, principalmente de regiões do Círculo Polar Antártico e Patagônia. Durante o rigoroso inverno, a partir do mês de maio, elas buscam áreas mais quentes ao Norte, chegando ao litoral brasileiro, e agora retornam para suas áreas próprias de reprodução.
Lenir afirma que entre as espécies da América do Norte, as mais comuns nesta época do ano em Santa Catarina são os maçaricos, batuíras e as tesourinhas. Da Europa vem os puffinus, popularmente conhecidos como bobos, que têm hábitos marinhos. Outra rota de migração é proveniente da região amazônica, de onde chegam os gaviões-tesoura e os suiriris. Já do Hemisfério Sul as aves que chegam até o litoral brasileiro são de espécies oceânicas, ou seja, em geral são observadas em alto-mar e se aproximam da costa somente quando estão debilitadas. Entre as espécies mais presentes estão os albatrozes e os pingüins.
Aves podem ser observadas até em áreas urbanas
Segundo a ornitóloga Lenir do Rosário, algumas das espécies que estão chegando na região podem ser vistas até nas áreas urbanas. "Os suiriris, as tesourinhas e o gavião-tesoura vivem em ambiente urbano e é fácil as pessoas começarem a observar sua presença. Já os massaricos são espécies marinhas e podem ser vistos em ambientes aquáticos", afirmou. A bióloga diz que praias como Pinheira, em Palhoça, ou Daniela, no Norte da Ilha, são consideradas bons locais de observação, pois as ondas são mais calmas, formando uma lâmina de água onde os pássaros costumam ficar. Outros pontos são áreas próximas a mangues e banhados. No Centro, Lenir indica como melhor local a Via-expressa Sul. "É uma região excelente para a observação porque tem a influência de estuários e do manguezal. O aterro acabou sendo colonizado por algumas espécies", completou.
Em Santa Catarina estão catalogadas 596 espécies de aves, sendo que deste total, 85 são espécies migratórias. Lenir explica que o conjunto de espécies observadas em uma determinada região é resultado da soma entre as espécies nativas e as migratórias, pois estas últimas utilizam este território como lar em parte de suas vidas. "As espécies que vivem no Norte, por exemplo, não teriam condições de sobreviver em seu território durante o rigoroso inverno, por isso migram para o Sul em busca de alimento", esclareceu. Embora venham para a região a procura de alimento, estas aves não concorrem com as espécies nativas. "Cada espécie tem seu nicho e suas próprias estratégias para a busca do alimento. Todos maçaricos, por exemplo, têm mesmo hábito alimentar, competem entre si e não com outras espécies locais", exemplifica Lenir.
Saiba mais
Hemisfério Norte - (a partir da segunda quinzena de agosto até meados de março)
América do Norte:
Maçarico (Maçarico-pintado e Maçarico-solitário) - Aves da família Scolopacidae, que se reproduzem na América do Norte e migram durante o inverno para áreas mais quentes. Neste período pode ser encontrado desde o sudeste dos Estados Unidos até a Argentina e em todo o Brasil. Habita praticamente qualquer local com água, tanto na costa como nas águas interiores, tais como manguezais e margens de rios e lagos.
Batuíra (Batuíra-de-coleira e Batuíra-de-esporão) - Aves da família Charadriidae encontrada desde o México até a Argentina. Vive em pequenos grupos em locais arenosos, como em praias de grandes rios, na orla marítima, lamaçais e, com menos freqüência, em campos com gramíneas baixas.
Tesourinha - Ave da família Tyrannidae, encontrada desde o leste dos Estados Unidos até a Argentina. Durante a migração se reúne em bandos de milhares de indivíduos, é localmente comum em cerrados, campos com árvores e arbustos esparsos, pastagens ou mesmo jardins em áreas urbanas. Conhecida também como tesoura e tesourinha-do-campo.
Região Amazônica:
Gavião-Tesoura - Ave da família Accipitridae presente em todas as regiões brasileiras onde existam florestas úmidas. Vive solitário ou em bandos de até 30 indivíduos, sobrevoando, em círculos, florestas e capoeiras, em busca de alimento. Pode ser observado também no ambiente urbano e raramente é visto pousado, ocasiões em que escolhe árvores altas e desfolhadas.
Suiriri - Ave da família Tyrannus, que de longe lembra o bem-te-vi, mas é imediatamente identificado quando vocaliza o inconfundível "suiriri". É comum em bordas de florestas e capoeiras, clareiras, campos com árvores e arbustos, cerrados e áreas urbanas. Vive solitário e é bastante agressivo com outros pássaros que se aproximam de seus poleiros favoritos.
Europa:
Bobos - Popularmente conhecidos como Bobos, os Puffinus são aves marinhas, geralmente presentes na região norte da Inglaterra e Escócia. Habitam regiões afastadas de aglomeração humana e, por isso, não estão condicionadas a fugir do homem, permitindo até uma certa aproximação. É provável que o nome popular tenha surgido desta característica.
Hemisfério Sul -(a partir da segunda quinzena de maio até final de agosto)
Albatroz - Habita em todo o Hemisfério Sul, desde os gelos antárticos até o Trópico de Capricórnio. Durante o inverno, pode se dirigir em direção ao Norte, aparecendo nas costas continentais da América do Sul, principalmente na Argentina e no Brasil. Ave oceânica, é mais facilmente observada em alto-mar, concentrando-se em ilhas.
Pingüim de Magalhães - Ave da família Spheniscidae, é um pinguim sul-americano característico de águas temperadas. A espécie habita as zonas costeiras da Argentina, Chile e Ilhas Falkland, migrando por vezes até ao Brasil. Após o período reprodutivo e com a aproximação do inverno, estas aves marinhas costumam procurar águas mais quentes em busca de alimento. Retornam ao Sul no final de agosto para um novo ciclo de reprodução.
(Por Natália Viana, A Notícia, 03/09/2006)
http://portal.an.uol.com.br/ancapital/2006/set/03/1ger.jsp