Castigado desde sua criação pela carência técnica e de pessoal que o tornaram um órgão público vulnerável a toda sorte de desvios de conduta, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) segue sua marcha rumo à reabilitação. Dias depois de concluir no Amapá uma operação, em parceria com a Polícia Federal, que resultou na prisão de 46 funcionários públicos, empresários e policiais acusados de contrabando de madeira e falsificação de documentos, o Ibama realizou esta semana uma grande operação de limpeza interna do órgão no Rio de Janeiro e iniciou um processo de reestruturação de seu pessoal no Estado.
Considerada a maior operação coordenada contra crimes ambientais já realizada fora da Amazônia e batizada de Operação Euterpe – em homenagem ao gênero de planta ao qual pertencem os palmitos – a ação conjunta que o Ibama e a Polícia Federal efetuaram durante dois dias (30 e 31 de agosto) no Rio resultou na prisão de 32 pessoas envolvidas num esquema de emissão fraudulenta de laudos ambientais e de recebimento de propinas para a facilitação de pesca predatória e de construções em área de proteção ambiental, entre outros crimes. Entre os presos, 25 são servidores do Ibama no Estado, o que equivale a mais de um quarto do efetivo de fiscalização do órgão em terras fluminenses, que conta com 87 fiscais.
Também foram presos pela PF três consultores de construção civil – um deles ligado à Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema), órgão de fiscalização ambiental do Governo do Rio de Janeiro –, dois empresários do setor de pescados e duas mulheres de servidores do Ibama que atuavam no esquema. Os acusados, dependendo de seu envolvimento, deverão responder a processos por corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha, concussão, advocacia administrativa e violação de sigilo funcional, além dos crimes ambientais.
Passado o primeiro momento da limpeza interna, cabe agora ao gerente-executivo do Ibama no Rio, Rogério Rocco, dar seqüência à reestruturação do órgão. Ele anunciou na sexta-feira (01/09) os integrantes da comissão que irá coordenar o processo administrativo disciplinar contra os servidores envolvidos no esquema de fraude: "A comissão iniciará seus trabalhos na próxima segunda-feira (04/09) e já vai começar pedindo o afastamento prévio por 60 dias, renováveis por mais 60, de todos os servidores envolvidos. Aqueles que tiverem comprovada a sua participação no esquema serão todos exonerados", diz.
Rocco determinou que sejam investigados todos os laudos ambientais, multas e demais procedimentos administrativos dos 25 servidores presos pela PF, o que demandará a análise de quase três mil pareceres emitidos pelo Ibama. Além da investigação dos integrantes do esquema já identificados, mais coisa, segundo ele, pode estar vindo por aí: "A lista não se encerra nesses 25 servidores do Ibama nem nessas sete pessoas externas ao órgão. A Polícia Federal, com nosso apoio, está reunindo provas e pode chegar a mais gente", diz. O principal objetivo das investigações agora é chegar a um maior número de corruptores: "Estamos convictos de que existem mais empresários envolvidos", afirma Rocco.
Reforço de outros Estados
Outra tarefa urgente para o gerente-executivo do Ibama no Rio é manter a fiscalização funcionando depois de tantas baixas. Para tanto, ele já obteve a garantia do presidente nacional do Ibama, Marcus Barros (que esteve no Rio acompanhando a operação da PF), de que serão deslocados nos próximos dias para o Rio fiscais vindos de outros estados: "Espero a chegada de pelo menos outros 25 servidores, de forma a igualar o quadro que havia antes da Operação Euterpe. É um remanejamento provisório, mas pode se tornar permanente", diz Rocco, que afirma contar em breve também com chegada de novos analistas ambientais aprovados em concurso público: "Após as eleições, o Ibama deve convocar 305 pessoas aprovadas no concurso de 2005. Espero que pelo menos 10% desse pessoal venha para o Rio. Aí, sim, teremos uma ampliação real do quadro", diz.
Também vinda ao Rio de Janeiro para acompanhar de perto a ação da PF, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, confirmou a adoção de "uma medida emergencial" que possa suprir a carência de fiscais no Ibama fluminense e comemorou o avanço das ações contra funcionários públicos que comentem crimes ambientais: "Nós queremos expurgar o mau funcionário da instituição. Estamos atuando no combate às práticas ilegais, no desmonte de quadrilhas organizadas e no apoio a atividades produtivas sustentáveis. Tudo isso com uma articulação integrada com vários setores", disse a ministra.
Marina Silva ressaltou que a Operação Euterpe é a 12ª grande operação que a PF realiza em conjunto com o Ibama desde o início do atual governo para combater a corrupção de servidores públicos ou desmantelar quadrilhas especializadas em crimes ambientais: "Não se protege o meio ambiente apenas com repressão e força. As ações de comando e controle são fundamentais. Os criminosos têm que saber que não podem contar com a certeza da impunidade. Aqueles que acham que essa ação no Rio é apenas uma operação esporádica já podem verificar que essa é a 12ª e o nosso trabalho vai continuar", disse a ministra.
Com as 32 prisões efetuadas na Operação Euterpe, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, chegou a 357 – sendo 93 servidores do Ibama e 15 servidores públicos de outras instituições – o número de pessoas presas nas doze operações conjuntas com a PF realizadas até aqui.
(Por Maurício Thuswohl,
Agência Carta Maior, 01/09/2006)