O governo terá dificuldades para entregar à iniciativa privada a concessão de novas usinas hidrelétricas no próximo leilão de energia, na primeira quinzena de outubro. Ações desencadeadas pelo Ministério Público e entidades ambientalistas podem impedir a licitação de pelo menos três empreendimentos no Paraná: as usinas de Baixo Iguaçu, Mauá e Salto Grande. Juntos, esses projetos totalizam 764 megawatts (MW) de potência instalada. A hidrelétrica de Dardanelos, com capacidade para gerar 251 MW, também sofrerá contestações na Justiça pelos promotores de Mato Grosso.
São seis os empreendimentos que o governo quer leiloar em outubro. Eles fazem parte da carteira de 17 projetos cujas concessões o Ministério de Minas e Energia planejava outorgar em dezembro do ano passado. A falta de licenciamento ambiental ou liminares de última hora só permitiram a licitação de sete projetos. Sobraram dez. Agora, apenas duas usinas localizadas no Rio de Janeiro - Barra do Pomba (80 MW) e Cambuci (50 MW) - não devem enfrentar grandes incertezas para o leilão.
Ontem, a Justiça Federal no Paraná acatou pedido de liminar contra o licenciamento de Baixo Iguaçu. Uma ação movida pela ONG Liga Ambiental argumenta que a autorização para a hidrelétrica deve ser dada pelo Ibama e não pelo órgão estadual de meio ambiente, pois ela está situada no entorno do Parque Nacional do Iguaçu, unidade de conservação de responsabilidade da União.
Segundo o governo, as dúvidas que cercam a outorga das novas usinas não vão interferir no sucesso do próximo leilão. As seis hidrelétricas somam 1.145 MW - muito pouco em relação aos mais de 24 mil MW de energia dos 171 empreendimentos cadastrados para o pregão. Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), observa que esse é um leilão feito "tipicamente para as usinas botox". Ele refere-se a hidrelétricas que já possuem concessão - algumas em obras, inclusive -, mas ainda não venderam ao mercado toda a energia que podem gerar. É o caso de Estreito, Foz do Chapecó, Serra do Facão, Salto Pilão e São Salvador.
A energia negociada deverá ser entregue a partir de 2011. "Em termos de segurança para o setor elétrico, essas usinas têm o mesmo valor de Mauá ou Baixo Iguaçu", compara. Na verdade, a capacidade das usinas botox é até maior do que boa parte das novas hidrelétricas. De certa forma, elas estão em estágio mais avançado e já são consideradas no planejamento dos analistas e do setor produtivo.
De acordo com a EPE, foram cadastrados para o leilão projetos que somam 8.732 MW de energia proveniente de fonte hídrica e 5.864 MW de energia oriunda de gás natural. O secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, lembrou ainda a forte presença da energia de biomassa - serão 1.051 MW. "Mas a nossa expectativa é poder licitar as usinas (hidrelétricas) novas também", diz o secretário.
Não será uma tarefa fácil. Uma liminar impede a concessão de Salto Grande. No caso de Mauá, o procurador federal Akira Omoto ajuizou uma ação civil pública, no dia 10, em que aponta uma "multiplicidade de indícios de fraude" no estudo de impacto ambiental da usina. Segundo ele, o próprio parecer dos técnicos recomendava à diretoria do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) que o EIA/Rima fosse complementado.
Amoto pede à Justiça a nulidade do estudo e o cancelamento da licença prévia expedida pelo IAP. No Mato Grosso, o Ministério Público Estadual prepara novas medidas para tentar barrar a concessão da usina de Dardanelos. Em dezembro, a outorga só não foi concedida devido a uma liminar. "Se a situação do empreendimento for idêntica à do leilão anterior, naturalmente o procedimento da Aneel se sujeita a questionamento judicial", diz o promotor Kledson Dionysio de Oliveira. A aposta do governo está nos chamados projetos "estruturantes", como o Complexo do Rio Madeira. Mas, nesse caso, o processo está atrasado.
(Por Daniel Rittner,
Valor Econômico, 29/08/2006)