Ambientalistas criticam reflorestamento indiscriminado da espécie exótica no Planalto catarinense
2006-08-28
Áreas até pouco tempo atrás intocadas agora começam a dar espaço a florestas de pínus. Basta um breve passeio pelas estradas do interior de Campo Alegre e de São Bento do Sul, no Planalto Norte catarinense, para constatar que a espécie exótica ganha cada vez mais espaço entre a vegetação nativa.
Apesar de necessário para a economia da região, cuja base é a indústria mo-veleira, o aumento indiscriminado das áreas de plantio, e a falta de fiscalização e de projetos ambientais fazem com que a legislação seja desrespeitada. Exemplo disso é a devastação que ocorre na localidade de Rio Vermelho, em São Bento do Sul. O pínus ocupa grandes áreas em volta do manancial utilizado pela captação de água do município.
É a devastação da mata ciliar e da vegetação nativa próxima ao manancial que contribui para a diminuição do volume de água no rio, acredita o engenheiro sanitarista Valnei Beckhauser. Para ele, deveriam ser idealizados projetos de recuperação imediata da região. Caso contrário, nos próximos anos, a tendência é de que voltem a ocorrer novos problemas relacionados à falta de água. O manancial tem 36 quilômetros quadrados. É três vezes maior do que o manancial do rio Negrinho, utilizado para abastecer o município até 2004.
Entretanto, até hoje o rio Negrinho é usado para suprir a demanda de 12 milhões de litros diários consumidos pela população. Beckhauser foi o engenheiro que idealizou a captação do rio Vermelho, inaugurada no final de 2004, e que, de acordo com estudos, teria condições de abastecer as torneiras são-bentenses por, pelo menos, 20 anos. "A estiagem deste ano é pior que aquela de 2003, mas ainda assim o nível não deveria estar tão baixo", avalia.
Projeto previa recuperação de manancial
O engenheiro sanitarista Valnei Beckhauser conta que, quando foi construída a captação do rio Vermelho, em uma barragem que já existia há 50 anos, o objetivo era de indenizar famílias ribeirinhas, e replantar a mata nativa ao longo de todo o manancial. Beckhauser defende a intervenção severa de órgãos de fiscalização ambientais na região. "Existem pínus plantados dentro da área de preservação e em locais proibidos", denuncia.
O diretor-presidente do Serviço Municipal de Água e Esgoto (Samae) de São Bento do Sul, Juarez Mendes, disse que o município assinou termo de ajustamento de conduta (TAC) junto ao Ministério Público Estadual. No documento, o município se compromete a conscientizar os moradores da região quanto à importância da preservação da mata ciliar.
De acordo Mendes, reuniões estão sendo realizadas com a população e o replantio da mata nativa perto do rio será o próximo passo.
Polêmica sobre impacto ambiental
O plantio do pínus em áreas próximas a rios e córregos virou alvo de duas correntes. Os ambientalistas reclamam que a espécie, além de não ser natural da flora local, também absorve água em grande quantidade. Entretanto, não existem estudos conclusivos sobre a questão.
Segundo o engenheiro agrônomo Gilson Brunquell, de Campo Alegre, para se ter certeza sobre o impacto do pínus em áreas irrigadas, deveria ser feito estudo antes do local a ser devastado, e outro, depois que as árvores já estivessem maiores.
O maior problema, avalia o agrônomo, é o fato de que muitos proprietários de terras estão optando pelo plantio de pínus, por causa da crise na agricultura.
"Antes, o proprietário preferia arrendar a terra ao produtor, e ficava com 15% ou 20% da safra. Agora, como a rentabilidade está muito baixa, prefere plantar o pínus. Assim não deixa a terra parada", explica.
Para o agrônomo, o maior problema é a falta de controle sobre as áreas plantadas. Brunquell defende que deveriam existir limites, onde cada proprietário po-deria utilizar no máximo 60% de suas terras para o reflorestamento. O restante deveria ser preservado com mata nativa.
O ambientalista Henri Enkels afirma que os reflorestamentos com pínus interferem nos recursos hídricos. De acordo com ele, em 1998, por meio de lei municipal, a região do rio Vermelho foi declarada Área de Proteção Ambiental (APA), mas o projeto não passou disso. So-mente com a realização do Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) do local é que será possível delimitar a área onde o pínus poderá ser plantado.
O ZEE está previsto na implantação da APA, mas não foi feito. Com o estudo, a atividade agrícola e econômica na região não será proibida, apenas delimitada, de forma a causar menos agressão ao meio ambiente. "Falta a criação de um conselho gestor e o levantamento da área. A APA, do jeito que está, é a mesma coisa que nada", critica.
(Por Marcelo Miranda, A Notícia, 28/08/2006)
http://portal.an.uol.com.br/2006/ago/28/0ger.jsp#11