Para fazer o arroz com feijão diário e ou mesmo o bolo de mandioca dos fins de tarde, é comum que uma dona-de-casa do Semi-Árido nordestino precise antes cortar a lenha que será usada no fogão. Além de demandar mais trabalho e tempo, isso é prejudicial ao meio ambiente e à própria saúde do cozinheiro e de sua família — de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a intoxicação crônica por fumaça de queimada de lenha em ambientes fechados é a oitava causa de morte no mundo. Para evitar esse problema, um projeto no Brasil distribuiu 220 ecofogões — fornos que reduzem até pela metade o consumo de madeira — para escolas e assentamentos rurais da Bahia, Paraíba e Ceará.
O utensílio é formado por uma chapa de ferro sobre uma caixa metálica, revestida por uma lâmina galvanizada. Dentro, ela é preenchida por um isolante térmico e tem uma entrada de cerâmica, por onde se coloca a lenha. O equipamento, segundo o fabricante, é construído de maneira a melhorar a queima e produzir menos fumaça; a pouca fuligem que sai é direcionada para fora da casa, por meio de uma chaminé de três metros de altura. A madeira aquece chapa de ferro, que esquenta as panelas sem contato com o fogo.
“Achei isso ótimo, porque não suja mais as panelas, e eu economizo até no bombril. Só preciso usar uma buchinha agora”, comemora Maria do Socorro Brito Ferreira, coordenadora da creche São Miguel, uma das contempladas pelo projeto. “Além disso, o fogão funciona com gravetos, com aquele pau que ninguém quer. Então, as próprias famílias saem buscando e trazem”, completa.
A instituição, localizada no município do Crato (CE), atende diariamente a cerca de 850 crianças (que freqüentam não apenas a creche, mas também da pré-escola até a 4º série do ensino fundamental) e oferece todo ano cursos de xaropes, chás medicinais e de alimentos à base de farinha de mandioca para 3.590 mulheres de povoados e bairros pobres da cidade.
Mais de 200 fogões ecológicos foram distribuídos em escolas, creches e assentamentos rurais dos municípios de Curaçá (BA), Santa Terezinha (PB) e Barbalho e Jardim (ambos no Ceará). “Deu-se preferência a escolas públicas e assentamentos de reforma agrária, que são lugares em que se faz mais comida”, afirma Nelson Wendel, do núcleo de qualidade ambiental do Fundo Nacional do Meio Ambiente, um dos realizadores do projeto. A iniciativa contou ainda com a parceria da Embaixada dos Países Baixos, Fundação Araripe, Instituto Jurema, da organização Agendha, do Fundo Global para o Meio Ambiente (Global Environment Facility/GEF) e do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUD).
Wendel destaca que o ecofogão não traz apenas vantagens práticas para os beneficiados. “O objetivo principal do projeto é a questão ambiental”, diz. De acordo com ele, a madeira representa 75% da energia utilizada nessas regiões. “Grande parte da comida feita na Caatinga usa lenha. Com o ecofogão, não é preciso desmatar porque ele usa gravetos também, e reduz em 50% a necessidade da madeira, já que a queima é muito boa e se aproveita a lenha muito melhor”, ressalta.
Junto com a entrega dos utensílios, o projeto realizou cursos para ensinar a forma correta de operação do fogão, a importância do desenvolvimento sustentável, da preservação da floresta e do manejo florestal. Além disso, foram feitas oficinas práticas, conta o coordenador do projeto na região do Araripe, Geraldo Leal Júnior.
(Por Talita Bedinelli,
PNUD notícias, 24/08/2006)