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2006-08-28
Após coletar uma amostra do líquido do Rio Gravataí, o técnico Paulo Sérgio Santos Vieira, 45 anos, decide a dose diária de remédio a aplicar. Há 25 anos na função, cada vez mais tem de reforçar o tratamento da água, porque as bacias do Rio Grande do Sul são castigadas por um infindável despejo de lixo e de esgoto.

Castigados pelo despejo contínuo de lixo e de dejetos, os rios do Estado estão se voltando contra a população. Cada vez exigem um volume maior de recursos para recuperar a água. As caras estações de tratamento de esgoto são escassas em território gaúcho, mas essenciais para conter a poluição. Se houvesse mais, o trabalho do técnico da Corsan Paulo Sérgio seria facilitado.

- Não dá mais para nadar e pescar nas praias do rio. Se os mananciais não forem preservados, teremos de adicionar muitos produtos químicos, e o custo da água pode ser alto no futuro - alerta.

Além de tratar o líquido consumido por 205 mil moradores de Gravataí, Paulo Sérgio passa diariamente por 70 pontos do município e testa a qualidade do produto que sai das torneiras. A peregrinação o tornou conhecido na comunidade.

No comando de uma estação da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), Paulo Sérgio é responsável pelo controle de bactérias e do teor de cloro de cerca de 25,8 milhões de litros de água processados por dia. Ele define:

- É um trabalho sério. Temos a vida de muita gente nas mãos.

Aos 18 anos, ele aprendeu o ofício com o pai, Hipólito, auxiliar de tratamento da Corsan aposentado em 1986. Mescla os conselhos paternos com o conhecimento adquirido em cursos e compartilhado com estudantes em palestras.

- Percebo quando a água está se tornando pior pela cor e pela presença de matéria orgânica. Em dias de chuva, é preciso adicionar mais produtos químicos - afirma.

No mais recente Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (Idese), o Estado obteve a nota 0,565 em saneamento. Ela indica um desenvolvimento médio na área, beirando o nível baixo.

É o pior indicador entre os quatro temas do estudo da Fundação de Economia e Estatística (FEE) divulgado este mês (os outros são educação, renda e saúde). O levantamento mostra a situação por município.

Em Gravataí, em 71º lugar em saneamento entre as 496 cidades, apenas um em cada cinco moradores dispõe de esgoto coletado e tratado. O quadro no Rio Grande do Sul inteiro é ainda pior. Dos 343 municípios atendidos pela Corsan, 86% não têm nenhum tratamento de esgoto porque a instalação é muito cara, confirma o diretor de operação da estatal, Jorge Accorsi.

Em 2000, 78% do Estado era desprovido do serviço, aponta o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Como agravante, onde havia coleta, não existia separação de esgoto doméstico e da chuva, na maior parte dos casos.

Quando não há o sistema, a água usada para lavar louça, tomar banho e dar a descarga do vaso sanitário é destinada a uma fossa, fica a céu aberto ou acaba poluindo um arroio ou rio. A situação aumenta a incidência de doenças. Mesmo assim, a rede de esgoto nem sempre evita o problema. É preciso haver também coleta de lixo e escoamento adequado da água da chuva.

- Eu me preocupo com quem mora na beira do rio e com o crescimento populacional. Ao fazer um passeio de barco pelo Gravataí, vejo pontos maravilhosos. Em outros, há lixo, sofá e até TV jogados. É preciso educar as pessoas - relata Paulo Sérgio.

Além de melhorar a rede de esgoto em cada cidade gaúcha, é necessário universalizar o abastecimento de água e evitar o racionamento em determinadas localidades.

Como fornecer serviços básicos para preservar a água dos gaúchos?

É preciso...
A resposta:

... buscar financiamentos

Preparar projetos e pleitear recursos em fontes financiadoras para ampliar o abastecimento de água e o tratamento de esgoto.

... avaliar o impacto na saúde

Em meio à crise nas finanças estaduais, construir uma rede esgoto é muito caro, o que desestimula o Estado. O gasto é até quatro vezes maior do que uma obra para tratamento de água. A Corsan investiu recentemente pelo menos R$ 17,8 milhões em estações de tratamento de esgoto, mas é insuficiente. Só em Passo Fundo, foram gastos R$ 5,1 milhões. Mas é um investimento que renderá economias futuras, lembra Antônio Domingues Benetti, professor de pós-graduação em recursos hídricos e saneamento ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O que o Estado deixa de colocar em saneamento acaba gastando cinco vezes mais no tratamento de doenças, segundo a Organização Mundial da Saúde.

... fortalecer o Pró-Guaíba

O maior programa de gestão ambiental da história do Rio Grande do Sul está em ritmo lento. Entre 1994 e 2004, foram investidos US$ 220,5 milhões em saneamento, manejo da terra, recuperação de reservas e educação ambiental em 251 municípios. Os recursos foram financiados pelo BID. Em agosto de 2005, foi lançado o Módulo II. Até o momento, não há previsão de obras em razão da falta de dinheiro. Um relatório está sendo preparado para o governo estadual prestar contas ao BID e tentar um segundo aporte de verbas.

Obstáculos
1) O Rio Grande do Sul superou a capacidade de endividamento, e a União reluta em dar aval para novos financiamentos internacionais. Como resolver: negociação.

2) Nem sempre há linha de crédito aberta para rede de esgoto, uma das principais demandas. O recomendável é sempre ter um projeto pronto na gaveta.

3)De acordo com o diretor de operação da Corsan, Jorge Accorsi, a estatal não conseguiu dinheiro da Caixa nos últimos três anos e meio para esgoto.

... programa de educação

Intensificar palestras em escolas e nas periferias para orientar as pessoas sobre os cuidados com o ambiente e tentar reduzir a contaminação de arroios e rios.
(Por Marciele Brum, Zero Hora , 26/08/2006)

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