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2006-08-23
O crescimento da carcinicultura é notório. Segundo dados da Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC), em 2002, existiam no Brasil 680 fazendas. Em 2004, este número aumentou para 997, com maior concentração na região Nordeste, que concentra 883 viveiros. Esses cultivos consumiram, até 2004, 16.598 hectares.

Os índices, no entanto, são acompanhados de outros fatores também crescentes: destruição da área de mangue, conflitos nas comunidades pesqueiras, perseguição aos pescadores, pesca precária. É dentro desse contexto que se iniciou, nesta segunda-feira, 21 de agosto, em Fortaleza, Ceará, o seminário "Manguezais e Vida Comunitária - Os impactos socioambientais da carcinicultura", que acontece até amanhã (24/08).

Durante a abertura, no salão de eventos da Casa de Retiro Nossa Senhora das Graças, cerca de 200 pescadores e pescadores foram saudados com músicas e uma mística pelas entidades organizadoras. O objetivo de promover maior protagonismo e estratégias de enfrentamento é direcionado a todos os que formam as comunidades pesqueiras, principais afetadas pelo surgimento e crescimento da indústria da carcinicultura.

Luciana Queiroz, do Instituto Terramar, salientou, durante a abertura, que o espaço proposto pelo seminário é o da troca de experiências. "Com essa problemática que estamos enfrentando, temos experiências de resistências que valem a pena ser passadas à frente. Aqui vamos ver como é que a gente consegue lutar contra isso", afirmou.

O encontro reúne pescadores e pescadoras dos dstados brasileiros mais afetados, os mesmos que constam no ranking de maior produção da Associação Brasileira de Criadores de Camarão: Bahia, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte, Piauí, Maranhão, Pará, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo, Ceará e Rio Grande do Sul.

"Reunimos vocês aqui, para juntos encontrarmos meios de proteção de defesa para nós mesmos e para o mangue", ressaltou Angelaine Alves, integrante do Conselho Pastoral dos Pescadores - Ceará, acrescentando que representantes da ABCC também foram convidados para o evento. "Eles agradeceram muito o convite, mas não garantiram a presença", disse.

Da mesma forma, representantes do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) e de outros órgãos institucionais ligados ao meio ambiente também foram convidados, mas, pelo menos no dia da abertura, não compareceram ao evento.

No Brasil, encontra-se a segunda maior área de manguezal do mundo. Estima-se que mais de 1 milhão de hectares de mangue estão distribuídos ao longo da zona costeira brasileira.

Organização é essencial, diz coordenador

O Movimento Nacional dos (as) Pescadores (as) (Monape) é um dos promotores do seminário. Em entrevista à Adital, o coordenador nacional, José Alberto, fala da importância da organização, de como é possível construir alternativas de sustentabilidade para as comunidades pesqueiras afetadas pelo crescimento do cultivo de camarão em cativeiro e afirma que a modalidade trabalha com um foco equivocado de geração de empregos.

"Estamos numa sociedade onde um dos grandes problemas é a falta de emprego e um dos argumentos de convencimento proposto pela carcinicultura é a geração de emprego. Mas, em momento algum, eles avaliam que naqueles espaços onde eles estão cultivando, já existem pessoas trabalhando", afirma Alberto.

Adital - Qual a importância de eventos como este para uma melhor organização dos pescadores e pescadoras?

José Alberto - Hoje, um movimento como este que o Monape está realizando com outros parceiros é um momento em que as comunidades de vários estados do Brasil vão ter oportunidades de trocar experiências, de se fortalecer, no sentido de buscar caminhos para um pesca sustentável, rumo à sustentabilidade das comunidades. No caso desse tema específico da carcinicultura, a gente vai ver várias experiências e realidades de muitas comunidades, que estão mais pobres e sofrendo com essa questão que vem ocorrendo de forma desumana e desordenada.

Adital - O avanço da carcinicultura é fato. Os pescadores estão mobilizados para acompanhar esse crescimento?

Alberto - Os pescadores e a sociedade ainda não estão preparados da forma como deveriam estar. Estamos numa sociedade onde um dos grandes problemas é a falta de emprego e um dos argumentos de convencimento proposto pela carcinicultura é a geração de emprego. Mas, em momento algum, eles avaliam que naqueles espaços onde eles estão cultivando, já existam pessoas trabalhando e que lá, nessas áreas, há um habitat natural de várias espécies. Por isso, nós precisamos cada vez mais nos fortalecer nessa questão de mostrar que não é isso que queremos e buscar alternativas de uma forma que a gente não vá destruir o meio ambiente. Hoje, nós temos pessoas que dependiam diretamente daquele espaço, catando caranguejo, pegando mariscos e que estão passando fome.

Adital - E que alternativas podem ser trabalhadas?

Alberto - Temos o turismo comunitário, o próprio cultivo de ostra, o incentivo que se pode ter em cultivo de peixes, sem ter que destruir o manguezal e, até mesmo, o reordenamento deste recurso que já está nas áreas. Todas são formas viáveis de garantir o sustento das comunidades pesqueiras e preservar o meio ambiente.

Adital - Como os pescadores podem estar mais organizados em suas comunidades?

Alberto - O que nós esperamos é que, a cada dia, as comunidades do litoral brasileiro possam, em forma de rede, estar se comunicando e se fortalecendo. Não só dizendo que é contra isso ou aquilo, mas propondo alternativas que venham a trazer menos prejuízos não só para as comunidades de pescadores, mas para a sociedade. Sabemos que na hora em que se destrói o manguezal, não só as comunidades saem prejudicadas. É toda a sociedade que sai perdendo.
(Por Rogéria Araújo, Adital, 21/08/2006)

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