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2006-08-22
O consumo exagerado e o desperdício de água não são privilégios de nenhuma cidade ou estado brasileiro. Tanto é assim que até mesmo Curitiba, a “capital ecológica” do país, vem passando por um programa de racionamento de água.

O racionamento teve início em 04/08 e, pelo jeito, já dá sinais de que não vai durar muito mais tempo. A imprensa vem acompanhando e a própria empresa que está por trás de tudo isso, a Sanepar (Companhia de Saneamento do Paraná), tem produzido um pequeno noticiário sobre o sistema de abastecimento de água da Região Metropolitana de Curitiba (RMC).

Nesse noticiário, aliás, é possível encontrar, entre outras coisas, as seguintes manchetes:

“FALTA DE CHUVA obriga Sanepar a implantar rodízio no abastecimento de água na RMC”; e

“O rodízio no fornecimento de água POR CAUSA DA SECA, retorna para o Grupo 1” [a região atendida pelas barragens Piraquara e Iraí foi dividida em sete grupos, um para cada dia da semana; a região atendida pela barragem do Passaúna não foi incluída no rodízio].

De acordo com a Sanepar, a produção média necessária para atender a demanda diária da Região Metropolitana de Curitiba é de aproximadamente 500 mil metros cúbicos de água. Com o rodízio, a empresa espera reduzir o consumo diário em 15 por cento ou cerca de 70 mil metros cúbicos de água. Se esse percentual for alcançado, a cada sete dias de rodízio consegue-se economizar o equivalente ao volume extraído das barragens em um dia.

Em busca da causa perdida
O clima do estado do Paraná se caracteriza por um verão (dezembro a março) quente e chuvoso, e um inverno (junho a setembro) frio e seco. Em certos anos, os valores máximo e mínimo podem estar um pouco deslocados, mas esse é o padrão geral para o estado. Trocando em miúdos, a escassez de chuvas durante o inverno é um fenômeno natural, conhecido e perfeitamente previsível.

Isso implica, entre outras coisas, no seguinte: todo e qualquer empreendimento humano que seja influenciável (ainda que remotamente) por essa variação sazonal deve necessariamente incorporá-la ao rol das variáveis sob prévia consideração. Em outras palavras, a escassez sazonal de chuvas não é ela própria a causa de nenhum apagão ou racionamento que ocorra ou venha a ocorrer, seja no fornecimento de energia elétrica ou de água.

A origem do problema está ligada a outros fatores, dois dos quais merecem especial atenção: consumo excessivo e desperdício. Se esses hábitos permanecem inalterados, principalmente na época do ano durante a qual os recursos são mais escassos, podemos então apostar que situações como a que Curitiba vem enfrentando hoje serão cada vez mais freqüentes nos anos vindouros. É preocupante. Afinal, se temos racionamento de água em uma cidade tida como exemplo para os demais centros urbanos do país, como será que as coisas andam em lugares ainda mais caóticos?

Nas últimas duas décadas, por exemplo, moradores da cidade de São Paulo – o maior aglomerado urbano do país – se habituaram a viver sob um regime semipermanente de racionamento: no inverno, por causa da “estiagem”; no verão, por causa da elevação na taxa de consumo per capita. A exemplo dos congestionamentos de automóveis, parece que o racionamento de água vai se convertendo mesmo em mais um tormento rotineiro na vida dos paulistanos.

Quando governantes e administradores falam em racionar – e isso vale não só para Curitiba ou São Paulo, mas para qualquer cidade do país –, eles não estão propriamente falando em racionalizar o sistema (o que talvez viesse a contornar o problema de modo efetivo). Na verdade, estão apenas dizendo que é necessário dosar temporariamente o acesso (anárquico) a uma fonte finita de recursos (espaço, água etc.). Como se não bastasse, há por trás do racionamento um acentuado ingrediente classista: bairros pobres tendem a ficar sem água mais freqüentemente do que bairros ricos instalados em zonas topograficamente equivalentes de uma mesma cidade.

Algumas medidas corretivas
A questão da falta de água tende a se tornar um problema crônico nos grandes centros urbanos, principalmente naqueles lugares onde medidas apropriadas não são devidamente implementadas. E essas medidas corretivas não dependem nem um pouco da construção de novos reservatórios ou barragens. Algumas têm a ver, por exemplo, com o restabelecimento da recarga natural do estoque subterrâneo de água. Nesse sentido, cedo ou tarde vamos ter de enfrentar (e reverter) a questão da impermeabilização excessiva do solo urbano. Outro importante conjunto de medidas tem a ver com a proteção de áreas ecologicamente sensíveis, como nascentes e o entorno dos cursos d´água.

Por fim, um outro conjunto de medidas terá de lidar seriamente com a questão do desperdício. No caso dos centros urbanos, não há o menor sentido em continuarmos gastando tanta água tratada para fazer fluir o sistema de coleta de esgoto. Também não tem cabimento continuar tolerando o desperdício de água subterrânea não-tratada, como o que é promovido pelos postos de combustível que oferecem uma “ducha grátis” aos seus clientes. Nesses casos, a ducha só é grátis porque a água está sendo captada por meio da exploração de poços artesianos irregulares. De resto, o “grátis” só vale para consumidores individuais no presente; em um futuro que se avizinha cada vez mais próximo, a conta que será rateada entre muitos.
(Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação, 21/08/2006)
http://www.redeprouc.org.br/acontece.asp?codigo=107

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