Parece brincadeira, mas três anos após o grupo ambientalista Centro para as Ciências e o Meio Ambiente (CSE, sigla em inglês) denunciar elevada concentração de pesticidas nas bebidas fabricadas pela Coca-Cola e pela Pepsi na Índia, os produtos continuam sendo fabricados e comercializados no país.
Em nova investida em defesa ao meio ambiente e à saúde dos indianos, a organização não-governamental informou no início de agosto ter encontrado resíduos de pesticidas em 57 amostras de 11 marcas de refrigerantes fabricados pelas empresas. “Foi identificado um coquetel de três a cinco pesticidas aparentemente presentes na água utilizada para fabricar as bebidas”, segundo o CSE. A contaminação estava 24 vezes acima do limite de tolerância estabelecido pela Agência Indiana de Padrões.
Frente aos fatos, o Centro faz o alerta: “A ingestão por período prolongado das toxinas encontradas pode, entre outras coisas, causar câncer, afetar o sistema nervoso e prejudicar o sistema imunológico”. Sunita Narain, diretor da ONG, acrescenta: “Se refrigerantes são a escolha de milhões, o mínimo que pode ser feito é que essas duas bebidas sejam regulamentadas”.
Cientes da gravidade da situação, quatro Estados indianos (Rajasthan, Gujarat, Madhya Pradesh e Chattisgarh) baniram as vendas de refrigerantes das duas multinacionais em escolas, faculdades e departamentos governamentais.
O Estado de Kerala, ao sul do país, foi mais incisivo e optou por proibir tanto a venda como a fabricação desses refrigerantes. "Existem vários estudos que provam que essas bebidas contêm certos ingredientes que são prejudiciais ao corpo humano", declarou V. S. Achuthanandan, governador do Estado.
Multinacionais norte-americanas negam contaminação
Em nota divulgada na imprensa no início de agosto, a filial indiana da Coca-Cola negou que suas bebidas contenham pesticidas. “Em mais de 200 países ao redor do mundo nossos produtos atendem aos padrões locais e internacionais para bebidas. As bebidas que vendemos na Índia são produzidas com o mesmo compromisso inflexível com a segurança e a qualidade do produto”.
Infelizmente não é o que ocorre na prática. De acordo com reportagem do site de notícias espanhol
Eco Portal , desde 2005, em pelo menos 10 ocasiões, o governo norte americano rejeitou o envio de refrigerantes produzidos na Índia, alegando que não cumprem com as leis do país e que não são seguros para os norte-americano.
Problemas não se esgotam na quantidade de pesticidas
Em diferentes partes da Índia, desde Plachimada, no Sul, até Mehdiganj, no Norte, as comunidades que vivem nas cercanias das plantas industriais da Coca-Cola e da Pepsi têm reiterado que as empresas causam severa falta de água devido à extração excessiva. Soma-se a isso as denúncias de contaminação no pouco que ainda resta.
Relatos dão conta de que a água subterrânea já esteja inutilizada para o consumo humano, envenenando também os solos.
Levando em consideração que a maioria dos membros das populações atingidas pelas práticas indiscriminadas da Coca-Cola são também algumas das comunidades mais marginalizadas da Índia - populações indígenas, castas mais baixas, trabalhadores de baixa renda e trabalhadores rurais –, é fácil detectar os problemas sociais e ambientais ocasionados a estas famílias.
De acordo com o site
Índia Resource , a água e a terra são centrais para a agricultura no país. Tamanha importância se reflete na quantidade de indianos – mais de 70% - que vivem de alguma atividade relacionada à agricultura.
A escassez de água, somada à poluição do solo e da água resultaram na quebra das colheitas - levando milhares de pessoas à perda de sua sobrevivência. Mais da metade da população da Índia vive hoje abaixo da linha da pobreza e impedir a atividade agrícola é uma questão de vida e morte para muitos no país.
Ironicamente, as comunidades mais impactadas pelas operações da Coca-Cola e da Pepsi não têm sequer condições de comprar os produtos da empresa.
Além disso, a poluição dos recursos hídricos é um grande problema de longo prazo. É extremamente difícil, senão impossível, limpar as fontes de água subterrâneas através da tecnologia, e as futuras gerações estão agora sujeitas a consumir água poluída - por cortesia da Coca-Cola, é claro.
Outro problema apontado pelas comunidades indianas diz respeito à distribuição de lixo tóxico como fertilizante para agricultores localizados próximo às instalações das multinacionais. Ou seja, para uma comunidade que vive principalmente da agricultura, a escassez de água e a contaminação se traduzem em impactos dramáticos.
No início do mês, vários deputados indianos, sensibilizados com o drama vivido por estas comunidades, solicitaram a proibição da venda na Índia de bebidas produzidas pelas multinacionais americanas. "Estas companhias brincam com as vidas de milhões de pessoas e não podemos ignorar as advertências", disse Vijay Kumar Malhotra, membro do principal partido da oposição nacionalista hindu, o Bharatiya Janata (BJP).
O Rashtriya Janata Dal (RJD), partido membro da coalizão governamental de centro-esquerda que lidera o Partido do Congresso, também atacou as duas gigantes. "Além de conter pesticidas, estas bebidas comprometem a herança nacional e temos que proibi-las e propor bebidas nacionais com leite e iogurte", sustentou Devendra Singh Yadav, membro do RJD.
Principais acusações contra a Coca-Cola
- Causar severas faltas de água em comunidades da Índia;
- Poluir a água subterrânea e o solo nos arredores das suas plantas;
- Distribuir seu lixo tóxico como "fertilizante" aos agricultores;
- Vender refrigerantes misturados com pesticidas na Índia - em alguns casos, em quantidades mais de 30 vezes superiores aos padrões aceitos na União Européia.
(Por Tatiana Feldens, com informações de agências internacionais, 21/08/2006)