O Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) está na mira dos ambientalistas. Há
um mês circulam na internet mensagens do Fórum Brasileiro de Organizações
Não-Governamentais e Movimentos Sociais (Fboms) com críticas ferrenhas ao
órgão de financiamento do Ministério do Meio Ambiente (MMA). A razão do
descontentamento é a decisão do Conselho Deliberativo do FNMA de interromper
o fomento a projetos de demanda espontânea. Ou seja, este ano, apenas
propostas que se enquadrem nos editais de políticas governamentais serão
contempladas com dinheiro do fundo.
“A luta pelo meio ambiente perde qualidade e diversidade”, pondera
o presidente da Maternatura, Paulo Pizzi, considerado um grande especialista
nas questões do FNMA. Segundo ele, parar com a demanda espontânea fecha
portas para ONGs e prefeituras de menor porte. A prioridade aos editais
direcionados, ele observa, vai dar um caráter nacional e restrito à temática
ambiental. “Não podemos abandonar o lema
pense globalmente e aja
localmente”. Já Écio Rodrigues, da Associação Andiroba e representante da
Região Norte no FNMA, relata uma quebra das expectativas. “Desde a entrada
do novo governo tínhamos expectativa de dar mais valor aos projetos de
demanda espontânea, mas acabou a criatividade”.
O FNMA foi criado através de lei em 1989 para ser um braço financeiro do MMA
e atender tanto instuições independentes quanto governamentais. No início da
atividade do fundo, os projetos de demanda espontânea e os de induzida
equilibravam-se. Desde 1998, no entanto, a balança começou a pender para os
editais direcionados ao cumprimento de políticas governamentais. Até a
interrupção do financiamento às propostas livres, o fomento induzido estava
recebendo cerca de 55% do recurso. Em seus primeiros 14 anos de atuação, o
fundo distribuiu R$ 100 milhões para aproximadamente mil projetos. Os
recursos provêm do próprio orçamento da União e também de empréstimos
internacionais, em especial de um acordo com o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID). Nos últimos três anos, sob a gestão petista, o fundo
executou um orçamento de R$ 70 milhões, os quais foram divididos em 200
projetos.
Mesmo com o aumento de recursos, a diretoria do FNMA comunicou aos membros
da sociedade civil que compõe o Conselho Deliberativo, a decisão de neste
ano não receber mais projetos fora dos editais dirigidos. De acordo com o
diretor do fundo, Elias Araújo, a orientação se baseou na constatação de que
há um acúmulo de 100 pedidos esperando para serem analisados e que grande
parte desses projetos tem deficiências que tornam dificil a liberação verba.
“A análise pode durar mais de um ano e isto custa muito ao governo”, diz ele
ao explicar um interminável procedimento de revisão dos projetos com os
candidatos ao financiamento.
Os representantes das ONGs na FNMA não aceitaram de início a idéia de cortar
a demanda espontânea. Por duas reuniões deliberativas do Conselho eles
faltaram para impedir a formação de quórum. Foi apenas depois de um
encontro, em maio, com o secretário-executivo do MMA, Claudio Langone, onde
o governo se compromoteu a retomar, em fevereiro do ano que vem, o
financiamento aos projetos não induzidos que foi possível aprovar a
suspensão. Entretanto, todo o buchicho que agora se vê nas ONGs se deve à
descofiança de que o governo possa ter blefado, pois até agora a resolução
que estabelece a volta da demanda espontânea não foi publicada no Diário
Oficial da União.
Araújo garante que a suspenção vai ser temporária. Segundo ele, um problema
de redação impede que se publique a resolução do Conselho Deliberativo. Os
artigos do texto fazem mais críticas ao modelo de demanda espontânea do que
estabelecem regras para a volta dos editais. Mas é exatamente dessas
críticas que sairam as determinações de que, até fevereiro, o Conselho
Deliberativo do FNMA tornará mais fácil a participaçao de pequenas ONGs e
prefeituras. Para que isso ocorra, os projetos de demanda espontânea não vão
mais necessitar ser tão detalhados logo de início. Ao invés de um documento
citando todas as fases de execução do projeto, algo que muitos não fazem com
exatidão, o fundo passará a analisar idéias e ao mesmo tempo assessorar
pequenas organizações a elaborar os planos. Araújo reconhece, contudo, que
tal modelo ainda não está claramente definido. “Precisaremos ser criativos”,
afirma.
Luiz Mourão, presidente do Instituto para o Desenvolvimento Ambiental (IDA),
organização que representa o Centro-Oeste no Conselho Deliberativo, diz que
não vê “má fè” do governo em suspender a demanda espontânea. Ele acredita,
que o MMA tem como estratégia repassar a função de fomento indenpendente aos
fundos municipais e estaduais. “Falta vontade política para resolver o
problema em nível federal”, afirma. Em sua visão, o governo quer cada vez
mais concentrar recursos do orçamento no FNMA, pois isso tornaria mais fácil
a execução de suas políticas. O instrumento para isso seria exatamente os
editais dirigidos.
A estratégia de fortalecer os fundos municipais e estaduais é realmente
prioridade do FNMA este ano. Além de ter estabelecido a Rede Nacional de
Fundos Socioambientais, que conta com 900 fundos, o órgão federal lançou um
edital de R$ 3 milhões para firmar parcerias e capacitar fundos locais.
“Existem fundos estaduais mais ricos que os nossos graças aos royalties do
petróleo. Eles só precisam começar a funcionar”, argumenta Elias, ao citar o
Fundo Estadual do Rio de Janeiro, que recebe R$ 40 milhões por ano em
compensações.
Ainda assim, o diretor do FNMA defende que as mudanças que serão feitas até
fevereiro nos critérios para projetos de demanda espontânea fortalecerão as
pequenas ONGs e prefeituras. Segundo sua estimativa, nas chamadas por
demanda espontânea, 20% das organizações escolhidas são “clientes fiéis” do
fundo. Nada de errado com isso, mas enquanto as pequenas têm seus projetos
revisados diversas vezes durante longos meses, as grandes ONGs ganham as
concorrências. “Enquanto umas estão sempre na Ferrari, outras estão no
fusca. Não há combate”, garante Araújo.
(Por Gustavo Faleiros,
OEco, 19/08/2006)