Em fevereiro deste ano, a Copasa, companhia de saneamento básico de Minas Gerais, colocou à venda 30% de suas ações ordinárias (aquelas que conferem ao seu titular o direito de voto na Assembléia Geral dos Acionistas). Dessas, 73% foram adquiridas por empresas estrangeiras. De acordo com Murilo Torres, gerente da área de finanças da Copasa, a intenção é reinvestir o lucro na própria empresa. A empreitada vem sendo acusada de ser o início de um processo gradual de privatização da estatal.
“A privatização da Copasa tem sido um processo lento desde fevereiro com a venda de ações”, afirma Marilia Noronha, presidente da organização não-governamental Nova Cambuquira. Segundo ela, a valorização das ações na bolsa e os convênios firmados com empresas privadas, como a alemã Berlinwasser, são indícios de uma futura privatização. “No Estado, o [governador] Aécio [Neves] é a favor de privatizar tudo e fazer parcerias público-privado”, observa.
Para a deputada Elisa Costa (PT-MG), a privatização se concretiza quando a iniciativa privada passa a compartilhar o poder de decisão. “A Copasa caminha segundo uma visão de mercado e não social. Ela tem que ter papel de justiça social com tarifa social, levando e subsidiando a água para lugares que são carentes. A Copasa é uma empresa pública. O Estado tem que agir em áreas de pobreza, com políticas públicas de qualidade e subsidiar os municípios carentes. Mas cada vez mais ela assume uma visão de empresa que dá lucros para ser avalista de investimentos internacionais”, afirma.
Segundo o presidente do Sindágua, José Maria dos Santos, "saneamento e saúde devem ser tratados pelo poder público. Quem tem que fazer é o governo. Na nossa visão, está acontecendo uma privatização branca, porque há leis na nossa Assembléia que impedem a privatização”, afirma.
Envasamento de água no Sul de Minas também causa polêmica
As estâncias hidrominerais do sul de Minas Gerais são conhecidas pela qualidade e pela propriedade terapêutica de suas águas. Se o Projeto de Lei do governador Aécio Neves, que autoriza a criação de subsidiárias da Copasa, for aprovado na Assembléia Legislativa, a exploração e o envasamento das águas dos municípios de Araxá, Cambuquira, Caxambu e Lambari, serão feitos por uma dessas subsidiárias da estatal. A iniciativa preocupa a sociedade civil, que teme pela superexploração e pelo dano ambiental.
A empresa Superágua era responsável pela exploração e pelo engarrafamento das águas. O contrato acabou e ela perdeu os direitos de exploração. Desde então, as estâncias não estão sendo exploradas. De acordo com o deputado Laudelino Augusto (PT-MG), 200 pessoas perderam suas funções e continuam desempregadas. “Os quatro municípios do circuito das águas saíram do mercado”, diz o deputado.
Após a saída da Superágua da região, a Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) colocou os direitos da exploração e do envasamento para licitação. Mais de 80 editais foram vendidos para empresas diversas, mas segundo a Codemig não houve nenhuma proposta por parte delas. “Foi estranho e a Comissão de Meio Ambiente tentou discutir o motivo. As empresas alegaram que os royalties eram muito altos. Isso não foi muito aceito”, conta o deputado Laudelino.
De acordo com ele, em março, o governador anunciou que a Copasa exploraria a região após a Codemig ter oferecido os direitos à empresa. A Copasa aceitou e o procurador geral da empresa, Marco Aurélio Vasconcelos, diz que o maior interesse nessa exploração é agregar o valor das águas à marca da Copasa.
Vasconcelos afirma que as subsidiárias já estão prontas para serem implantadas. A empresa apenas aguarda a aprovação do projeto de lei, prevista para outubro deste ano.
O deputado Laudelino diz que as administrações regionais “gostaram muito” de a gestão das águas ser feita pela subsidiária da Copasa, mas a sociedade civil ficou apreensiva. O deputado atribui esse temor às diretrizes que a estatal vem tomando em relação à abertura de capital e à compra de ações por empresas estrangeiras. Segundo ele, a exploração predatória das águas no município de São Lourenço (MG) pela indústria alimentícia Nestlé foi uma péssima referência.
A presidente da organização não-governamental Nova Cambuquira, Marília Noronha, diz que a sociedade civil teme a superexploração das estâncias, a exemplo do que aconteceu em São Lourenço. A Copasa declara que serão explorados 150 milhões de litros de água em dois anos e diz que não há perigo de danos ambientais, porque a “vazão da água é natural”. “Nós consideramos um dado muito elevado. Queremos o patrimônio hídrico sem desmineralização e sem superexploração e que tenha uma gestão sustentável e responsável”, afirma. Para ela, a exploração ideal é a artesanal que não visa ao mercado externo, mas que seja capaz de atrair o turismo.
Porém, o deputado contrapõe e diz que o fato de a Copasa ainda ser uma empresa pública torna possível o controle social sobre ela e sobre suas ações, pois teoricamente é uma empresa que não deveria apenas visar lucros.
O deputado espera que o retorno do envasamento das águas possa gerar emprego e renda para as comunidades locais. Contudo, a sua maior expectativas é que o marketing dessas águas seja um incentivo para o turismo da região, que seria o principal responsável por captar recursos. Ele não acredita que a exploração das águas passe para alguma empresa estrangeira porque, para ele, a Copasa está preocupada em associar a sua imagem à qualidade da água dessas cidades. “Coisa de neoliberal”, afirma.
(Por Natália Suzuki,
Agência Carta Maior 1, e
Agência Carta Maior 2,16/08/2006)