A USP sediou o "Workshop Brasileiro da Primeira Fase do Projeto Basic", evento que tem por objetivo principal discutir possibilidades de ações sobre mudança climática nos quatro principais países emergentes no cenário internacional: Brasil, África do Sul, China e Índia. O projeto tem o Instituto de Estudos Avançados (IEA) como entidade associada no Brasil.
Depois de três dias de intensos debates, os especialistas brasileiros e estrangeiros chegaram a um resultado concreto: a elaboração do documento “Proposta de São Paulo para um acordo sobre a política climática internacional futura”. O Protocolo de Kyoto prevê que os países ricos reduzam suas emissões, até 2012, para 5% menos do que era emitido pelas partes em 1990.
Como não há metas para os países pobres, o documento é causa de tensas discussões internacionais e marcados conflitos de interesses. Estados Unidos e Austrália jamais assinaram o acordo.
Segundo o professor Jacques Marcovitch (FEA), que participou da organização do workshop brasileiro, a Proposta de São Paulo é a primeira a tentar um meio termo entre as posições divergentes no cenário internacional. “O documento determina que, com poucas emendas, o Protocolo de Kyoto pode continuar além de 2012. São reajustes que permitirão resolver os impasses que vêm surgindo”, diz Marcovitch.
O primeiro impasse, segundo o professor, trata dos prazos. “A proposta que se coloca é que a cada ano já se preveja as metas do sexto ano subseqüente. Então, em 2013 vai se determinar a meta de 2019. Com isso, cada país terá condição de se planejar para alcançar estas metas. Não haverá necessidade de, a cada 5 ou 10 anos, de repactuar as metas”, explica.
Com a revisão anual, as metas poderiam variar dependendo do grau de dificuldade que os países enfrentam. Se houver facilidade em atingir a meta, ela poderia se tornar mais exigente no ano seguinte. Haveria isenção da redução de emissões por um ano para países que tivessem queda de mais de 1% no PIB (produto interno bruto).
Outro impasse enfocado na proposta é o que se refere à questão dos países em desenvolvimento. Hoje, segundo o professor, existem dois grupos, os países desenvolvidos e os não-desenvolvidos, sendo que os primeiros têm uma responsabilidade maior.
A proposta sugere que haja uma terceira lista. “Os países que quiserem se comprometer a reduzir metas serão elegíveis para o acesso a certos recursos de financiamento para a área ambiental. Evidentemente isto dependerá dos países desenvolvidos, já que os recursos serão provenientes de fundos ou de dotações”, diz. A idéia é propor aos países desenvolvidos uma alternativa que atraia os países emergentes para aderir a compromissos.
Em novembro, no Quênia, acontecerá a próxima reunião dos membros do Protocolo de Kioto, quando se apresentará o documento. Países não-desenvolvidos, mas com grandes taxas de emissão – como Brasil, China e Índia, assumiriam então metas no futuro – de acordo com seu ritmo de crescimento – através de um cálculo que considera PIB per capita, emissões per capita e população.
O projeto Basic é dirigido por Farhana Yamin, pesquisadora do Institute for Development Studies (IDS) da Universidade de Sussex. Segundo ela, os quatro países foram escolhidos pelos idealizadores do Basic em razão de sua importância em termos ambientais, econômicos, sociais e políticos. "Espera-se que o projeto leve ao estabelecimento de um esforço cooperativo de longo prazo entre os quatro países em apoio às suas necessidades de capacitação sobre o assunto", disse, durante o evento.
Além de Marcovitch, participaram das discussões Luiz Gylvan Meira Filho (IEA) e o ex-reitor da USP José Goldemberg, secretário de Estado do Meio Ambiente.
Iniciado em janeiro de 2005 e com duração inicial prevista de dois anos, o Basic já realizou os workshops da África do Sul, Índia e China. Além da produção da Proposta de São Paulo, o evento apresentou o que está ocorrendo na Índia, China, África do Sul, EUA e União Européia em relação à ações contra as mudanças climáticas.
O principal financiador da iniciativa é Environment Directorate General da Comissão Européia. As equipes dos quatro países são apoiadas no trabalho pelo IDS, World Resources Institute, Ecofys e outras organizações internacionais especializadas em mudanças climáticas.
Por Fábio de Castro,
USP Online, 14/08/2006)