Cientistas pesquisam conseqüências da mudança climática nas geleiras polares do Ártico
2006-08-15
Durante os próximos dois anos, uma equipe de cientistas navegará no
gelo do Oceano Ártico, a bordo da veleiro francês Tara, para estudar
as conseqüências da mudança climática nas geleiras polares. O Tara
zarpou no dia 11 de julho, do porto francês de Lorient, rumo ao Mar
do Norte. Após escalas em Oslo e no terminal russo de Murmansk, o navio
fez sua última parada continental no porto siberiano de Tiksi, a cerca
de 1,6 mil quilômetros do Pólo Norte. Sua tripulação é composta por 15
especialistas em ecologia, fauna e flora árticas, marinheiros e
pessoal médico.
“Nossa intenção é identificar o mais detalhadamente possível as
mudanças que ocorrem atualmente nas geleiras, atmosfera e oceano do
Pólo Norte, como conseqüência do aquecimento da atmosfera, para
melhorar a capacidade científica de simular as mudanças futuras”,
disse ao Terramérica Etienne Burgeois, proprietário do navio Tara e
co-diretor da expedição. “Acreditamos que nossas pesquisas permitirão
avaliar com precisão os diferentes impactos que o degelo do Oceano
Ártico terá sobre o ambiente do pólo e, em conseqüência disso, em todo
o hemisfério norte”, acrescentou.
A expedição, oficialmente chamada Arctic-Damocles, faz parte do quarto
Ano Polar Internacional que, sob patrocínio do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), coordenará estudos internacionais
multidisciplinares em oceanografia polar, sociologia, economia e
ecologia, a partir de março de 2007. O Ano Polar também vai comemorar
os 125 anos do primeiro evento dessa natureza, que aconteceu em
1982/1983 por iniciativa do marinheiro e explorador austríaco Karl
Weyprecht. A odisséia do Tara rumo ao Ártico também faz parte do
programa europeu de pesquisa polar Damocles, centrado na pesquisa do
derretimento no Pólo Norte.
Burgeois disse ao Terramérica que “a observação via satélite do Pólo
Norte permitiu estabelecer um degelo do Ártico entre 8% e 10% durante
o verão nos últimos 30 anos”. Observações feitas por submarinos
norte-americanos, no final da década passada, sugerem uma redução de
até 40% na espessura das geleiras no mesmo período, acrescentou. “Estas
alterações no Oceano Ártico fornecem uma indicação precoce das futuras
conseqüências climáticas e sociais do efeito estufa”, afirmou
Burgeois. Se o derretimento do Oceano Ártico continuar nesse ritmo, em
algumas décadas suas geleiras desaparecerão durante o verão,
provocando graves desordens climáticas e ambientais, incluindo uma
dramática elevação do nível do mar e o provável desaparecimento de
milhares de espécies.
Para estudar estes fenômenos, o Tara possui o equipamento eletrônico
mais moderno disponível, que permitirá coletar e analisar amostras de
gelo, ar e água durante os próximos dois anos. O navio possui uma
enorme prancha a vela feita em alumínio, dispõe também de turbinas de
vento para gerar energia limpa e pode armazenar até 200 toneladas de
equipamento, material médico e alimentos. Apesar do degelo do Pólo
Norte, durante o inverno o Ártico se congela. Isto fará com que o Tara
fique preso no gelo, devendo seguir, por vários meses, as correntes
naturais da região. Durante os dois invernos que passar no gelo, o
navio se converterá em uma plataforma de observação e pesquisa sobre
as degradações do ambiente ártico.
O Tara será visitado regularmente por cientistas e equipes médicas e
estará em contato regular com os centros de coordenação do Pnuma,
Damocles e outros programas científicos europeus. Para Achim Steiner,
diretor-executivo do Pnuma, “a expedição do Tara permitirá compreender
as mudanças climáticas que ocorrem na região ártica e disseminar a
mensagem de que tais fenômenos nas regiões polares interessam a toda a
raça humana”. O Tara é um veleiro construído especialmente para se
deixar levar por correntes marinhas e pertenceu ao lendário marinheiro
neozelandês Robert Blake. Com o nome de Seamaster, serviu a Blake,
representante especial da Organização das Nações Unidas que foi
assassinado por piratas em dezembro de 2001 durante uma expedição na
Amazônia.
Em 2003, após esta trágica morte, Burgeois, um apaixonado marinheiro de
45 anos, adquiriu a embarcação para utilização em expedições
científicas, como a atual. Durante o verão de 2005, por exemplo,
Burgeois passou várias semanas na Antártida a bordo do Tara, junto com
o fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado. Desta vez, está acompanhado,
entre outros, pelo marinheiro e ativista francês Bernard Buigues, de
51 anos, que organizou numerosas expedições ao Pólo Norte e à Sibéria
em quase duas décadas, e Christian de Marliave, de 53 anos, autor de
vários livros sobre a ecologia do Oceano Ártico e considerado um dos
mais importantes especialistas em regiões polares.
O chefe da expedição é o neozelandês Grant Redvers, doutor em ciências
ambientais, de 33 anos, que, apesar da juventude, possui longa
experiência em explorações marinhas científicas, tanto em seu país de
origem quanto na Antártida, Patagônia e Geórgia do Sul. Outros membros
da tripulação científica do Tara são os ambientalistas marinhos Hevé
Le Goff, da Damocles; Sergey Pisarev, do Instituto Russo de
Oceanologia, e a jornalista russa Svetlana Murashkina.
(Por Julio
Godoy, Agência Envolverde/IPS, 14/08/2006)
http://www.ecoagencia.com.br/index.php?option=content&task=view&id=1779&Itemid=2