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2006-08-11
O livro “Fidel, biografia a duas vozes” (Boitempo Editorial, 636 páginas, R$ 66, tradução de Emir Sader, introdução de Fernando Morais), de Ignacio Ramonet, é um portento. Mostra por inteiro o pensamento do mais influente líder mundial da segunda metade do século XX (ironicamente, dirigente de um país de quase nenhuma importância no cenário econômico internacional).

Dado como falido ou morto inúmeras vezes pela mídia internacional – nos últimos dez dias, todos os jornais e revistas tinham o obituário de Fidel na boca das rotativas –, o líder cubano não é sequer uma fênix. Não há cinzas das quais renascer. Até porque a luta desesperada do dirigente confunde-se, há quatro décadas, com a batalha infindável de seu país seguir sua rota soberana e altiva. Não renasce porque até agora não caiu.

Nas mais de cem horas de entrevista que Ramonet realizou, Fidel faz o que mais gosta: exibir sua inigualável loquacidade. E aqui se mostra como o grande intelectual da ação que é. Trata-se de um tipo de pensador que, como Simon Bolívar, marcará a História por ações e não apenas por palavras. Em Fidel, intenção e gesto fundem-se na atividade política, decidida muitas vezes à quente, como nas inúmeras crises que enfrentou. “A história me absolverá”, por exemplo, escrito após sua prisão motivada pelo assalto ao quartel Moncada, em 26 de julho de 1953, é um libelo contra a tirania do regime de Fulgêncio Batista que se tornou um brado contra a opressão oligárquica em todo o terceiro mundo.

Destacamos aqui trechos de um capítulo do livro de Ramonet, intitulado “Cuba e a globalização neolioberal”. Nele há desde o arguto historiador a detalhar suas opiniões sobre os escritos de Marx e as opções de Lênin, Stalin e Trotski, até o militante voltado para as questões do chamado pensamento único, da ecologia e da educação. Vale cada minuto gasto na leitura.

Cuba e a globalização neoliberal

Ramonet – Você acredita que a globalização está destruindo até o próprio capitalismo?
Fidel - Hoje não há capitalismo, não há concorrência. Hoje o que há é o monopólio em todos os grandes setores. Há algumas concorrências entre vários países na produção de televisores ou computadores, até automóveis o Banco Mundial os fez produzir, mas é que o capitalismo já não existe mais. Quinhentas empresas globais dominam hoje 80 por cento da economia mundial. Os preços não são competitivos, veja os preços a que se vendem, por exemplo, os medicamentos contra a Aids... Os medicamentos constituem um dos mais abusivos, extravagantes e exploradores ramos econômicos do mundo; o medicamento que vendem às pessoas vale, em muitos casos, dez vezes os custos de produção. A publicidade praticamente determina o que se vende e o que não se vende, quem não tem muito dinheiro não pode fazer nenhum tipo de publicidade para seus produtos, ainda que sejam excelentes. Depois da última chacina mundial na década de 1940, prometeram-nos um mundo de paz, a diminuição da distância entre ricos e pobres e que os mais desenvolvidos ajudariam os menos desenvolvidos. Tudo não passou de uma enorme falsidade. Impuseram-nos uma ordem mundial que não se pode sustentar nem suportar. O mundo está sendo conduzido para um beco sem saída. Nenhuma daquelas categorias em que acreditávamos que se baseava o capitalismo existe mais; não existe, portanto, a teoria que os Chicago Boys ensinam às pessoas. E, por outro lado, a teoria e a prática do socialismo ainda estão por ser desenvolvidas e escritas.

Ramonet – Você me disse em outra ocasião que já não havia “modelo” em matéria política e que, atualmente, ninguém sabia muito bem o que o conceito de socialismo significava. Você me contou que, em uma reunião do Fórum de São Paulo que se realizou em Havana, e que reuniu todas as esquerdas da América Latina, foi necessário ter cautela para não pronunciar a palavra “socialismo” porque é uma palavra que “divide”.
Fidel - Veja só, o que é o marxismo? O que é o socialismo? Isso não está bem definido. Em primeiro lugar, a única economia política que existe é a capitalista; mas a capitalista de Adam Smith. Então andamos fazendo socialismo muitas vezes com as categorias adotadas do capitalismo, o que é uma das grandes preocupações que temos. Porque se utilizarmos as categorias do capitalismo como instrumento na construção do socialismo, acaba obrigando todas as empresas a competir entre si, surgem empresas desonestas, piratas, que se dedicam a comprar aqui e acolá. Seria necessário fazer um estudo bem profundo. Uma vez Che criou algumas polêmicas sobre as conseqüências do uso do financiamento orçamentário, diante do uso do autofinanciamento. Ele, como ministro, estudara a organização de alguns grandes monopólios e viu que eles utilizavam orçamentos. Na União Soviética se empregava outro método: o autofinanciamento, e ele tinha fortes convicções sobre isso8. Marx fez apenas uma breve tentativa na Crítica do programa de Gotha9 de definir como seria o socialismo, porque era um homem muito sábio, muito inteligente e realista para imaginar que se poderia escrever uma utopia sobre como seria o socialismo. O problema foi a interpretação das doutrinas, e foram feitas muitas. Por isso os progressistas permaneceram tanto tempo divididos, e as polêmicas entre anarquistas e socialistas, os problemas depois da Revolução Bolchevique de 1917 entre trotskistas e stalinistas ou, digamos, para os partidários daquelas grandes polêmicas que foram geradas, a divisão ideológica entre os dois grandes dirigentes. O mais intelectual dos dois era, sem dúvida, Trotski. Stalin foi um dirigente mais de ordem prática, como conspirador, não foi um teórico e, uma vez ou outra, depois, quis agir como teórico... Lembro-me de uns livretos que eram distribuídos em que Stalin explicava o que queria dizer o materialismo dialético, e usava o exemplo da água... Quiseram transformar Stalin em um teórico. Ele era um organizador, de grande capacidade, penso que era um revolucionário, não acredito que alguma vez tenha estado a serviço do czar. Depois cometeu os erros que todos conhecemos, a repressão, as “limpezas” e tudo aquilo. Lênin era o gênio, morreu relativamente jovem, mas teria podido... Nem sempre a teoria ajuda. Na época da construção do Estado socialista, Lênin aplicou desesperadamente, a partir de 1921, a NEP [Nóvaya Economícheskaya Polítika], a nova política econômica… Já falamos disso, e eu disse que o próprio Che não simpatizava com a NEP. Mas Lênin teve uma idéia verdadeiramente engenhosa: construir o capitalismo sob a ditadura do proletariado. Lembre-se de que as grandes potências queriam destruir a Revolução Bolchevique, o mundo todo a atacou. Não se pode esquecer da história da destruição que fizeram naquele país subdesenvolvido; a Rússia era o país menos industrializado da Europa, e Lênin, além disso, acreditava, seguindo a linha de Marx, que não podia haver revolução apenas em um país e que a revolução tinha de ser simultânea em todos os lugares, a partir de um grande desenvolvimento das forças produtivas. Por isso o grande dilema, depois que se estabeleceu essa primeira revolução, foi seguir ou não em frente. Quando o movimento revolucionário fracassou no resto da Europa, não restou a Lênin mais que uma opção: construir o socialismo em um só país, a Rússia. Imagine a construção do socialismo em um país com 80 por cento de analfabetos e em uma situação na qual teriam de combater todos os que os atacassem, e na qual os principais intelectuais, todos os que tinham mais conhecimentos, se retiraram ou foram fuzilados. Percebe?

Ramonet – Foi uma época terrível, com intensos debates.
Fidel - Houve tantas polêmicas… Eu, por exemplo, vejo na União Soviética uma perda de tempo absurda nos dez anos que aplicaram a NEP sem sequer tentar cooperativizar pouco a pouco os camponeses. Como a produção individual deu o máximo que podia dar naquelas condições, quiseram fazer uma coletivização forçada. Perceba que nós nunca... Em Cuba sempre houve, no campo, mais de 100 mil proprietários individuais. A primeira coisa que fizemos, em 1959, foi conceder a propriedade aos que eram arrendatários e trabalhadores precários.

Não há soluções locais porque a dominação é global

Ramonet – Você considera que estamos atualmente em um momento de grande confusão ideológica?
Fidel - Sim. Há na ideologia uma confusão extraordinária. O mundo em que vivemos é muito diferente do de antes. Há muitos problemas que os grandes pensadores políticos e sociais não podiam, em tão longo prazo, prever, ainda que seus conhecimentos tenham sido decisivos para nos transformar em pessoas com idéias revolucionárias. As pessoas lutam contra o subdesenvolvimento, as doenças, o analfabetismo, mas o que se pode chamar de solução global dos problemas da humanidade ainda não foi encontrada. Os problemas da humanidade não têm solução em níveis nacionais porque a dominação se dá hoje em níveis globais: a chamada globalização neoliberal. A OMC [Organização Mundial do Comércio], o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional estabelecem as regras de uma situação de dominação e exploração de fato, que pode ser escravista, feudal. E muita gente está procurando maneiras de se livrar dessa dominação. Você é testemunha de quantas pessoas foram ao Fórum Social Mundial de Porto Alegre ou de quantas foram a Bombaim em 2004. E nem sei quantos artigos sobre a globalização liberal já li na sua revista [Le Monde Diplomatique]. Também li artigos das publicações norte-americanas, das inglesas, leio todas. Durante muitos anos nossos companheiros selecionavam, de revistas como a sua, de revistas de centro, de revistas de direita também, durante toda a semana, os artigos fundamentais sobre os problemas econômicos. De forma que, sim, podemos dizer que é muito difícil para as pessoas entender os problemas, porque, na maioria dos países, não recebem uma educação econômica, não recebem uma educação histórica, não recebem uma educação política.

Ramonet – Contudo, você não tem a impressão de que a globalização liberal recebeu golpes duros e já é menos arrogante que há alguns anos?
Fidel - Sim, eu também tenho essa impressão, porque houve o caso da Argentina, a vitória em maio de 2003 de Néstor Kirchner, e a derrota do símbolo da globalização neoliberal que houve ali, precisamente, nesse momento crítico, de crise econômica internacional. E já não é apenas uma crise no Sudeste Asiático, como a de 1997, é uma crise mundial, mais a Guerra do Iraque, mais as conseqüências de uma enorme dívida, mais o fatalismo de que o dinheiro fuja. O problema é mundial, e por isso mundialmente também se está formando uma consciência, e por isso será um dia de glória esse dia em que outro mundo seja finalmente possível. E observe que vem ganhando força essa frase que acho que você mesmo propôs: “Um mundo melhor é possível”. Mas quando tivermos alcançado um mundo melhor, que é possível, teremos de continuar repetindo: um mundo melhor é possível. E tornar a repetir depois: um mundo melhor é possível. Porque sempre será preciso melhorá-lo. Eu acredito nas idéias e acredito na consciência, nos conhecimentos, na cultura e especialmente na cultura política, tenho uma fé cega nisso. Nós dedicamos muitos anos na formação de uma consciência, e temos uma grande fé, digamos, na educação e na cultura, sobretudo na cultura política. Vivemos em um mundo carente de cultura política. Você deve saber melhor que ninguém, porque lutou para semear uma cultura política em meio a problemas tão complicados como a nova ordem econômica, a globalização neoliberal. O que se ensina, em quase todas as escolas do mundo, são dogmas; até aqui se ensinaram dogmas. (...)

Ramonet – Você é sensível ao problema da proteção do meio ambiente?
Fidel - Há trinta anos não se falava do que hoje sabemos sobre esse tema. Havia o Clube de Roma10, que reunia algumas pessoas que faziam previsões e falavam de diferentes temas, eram criticados, diziam que eram “utópicos”, catastrofistas etc. Foram os primeiros. E acho que isso não tem mais de trinta anos. A questão ecológica foi se desenvolvendo verticalmente, a toda velocidade, no último quarto de século. E talvez o verdadeiro drama esteja na ignorância sobre esses riscos na qual vivemos durante tanto tempo.

Ramonet – Você acredita que não se sabia, ou não se queria saber, porque havia uma confiança cega na ciência e na técnica?
Fidel - Veja, penso que a totalidade das pessoas que, 25 anos depois de terminada – em 1945 – a Segunda Guerra Mundial, fazia uso da razão e sabia ler e escrever, nunca escutou uma única palavra sobre a cega marcha humana, inexorável e acelerada rumo à destruição das bases naturais de sua própria vida. Nenhuma outra das muitas gerações que precederam a atual conheceu o amargo risco, nem sentiu sobre si uma responsabilidade tão grande. Há apenas trinta anos, insisto, a humanidade não tinha a menor consciência da grande tragédia. Na época se acreditava que o único perigo de extinção estava na quantidade gigantesca de armas nucleares prontas para ser disparadas em questão de minutos. Hoje, sem que no entanto tenham cessado ameaças desse tipo, um perigo adicional, aterrador e dantesco a ronda. Você mesmo só deve ter ouvido falar da camada de ozônio e das mudanças climáticas vários anos depois de ter se formado na universidade. São muitos os problemas novos. Hoje se sabe que o petróleo, que foi uma maravilha da natureza, e que levou 300 milhões de anos para se formar, terá liquidadas as suas reservas comprovadas e prováveis em apenas 150 anos... Esse desastre é tão grande como o maior dos desastres ecológicos, porque, se de repente faltar energia, todos os automóveis do mundo vão parar. E ainda não existe um substituto para o petróleo; já se chegou a acreditar que seria a energia nuclear. Aquelas mesmas pessoas do Clube de Roma diziam que seriam necessários não sei quantos milhares de centrais nucleares, e os territórios contaminados já aterrorizavam, mas ainda incentivavam a energia nuclear. (...)

Ramonet – A França pôde desenvolver sua indústria nuclear, mas o Irã, por exemplo, hoje quer produzir combustível nuclear, e os Estados Unidos não permitem, originando uma crise mundial. Qual a sua opinião sobre essa situação que se criou com o Irã?
Fidel - O Irã reclama seu direito de produzir combustível nuclear como qualquer nação industrializada, e não quer ser obrigado a destruir a reserva de uma matéria-prima que serve não apenas como fonte energética, mas também como fonte para produzir inúmeros produtos: fertilizantes, têxteis e uma infinidade de materiais que hoje têm uso universal. O império ameaça atacá-lo se produzir esse combustível nuclear. Combustível nuclear não são armas nucleares, não são bombas nucleares. Proibir um país de produzir o combustível do futuro é como proibir alguém de explorar petróleo, o combustível do presente e que está destinado a se esgotar. Que país do mundo é proibido de produzir combustível, carbono, gás, petróleo? Com mais de 70 milhões de habitantes, o Irã está se dedicando a um desenvolvimento industrial e considera com toda razão que é um grande crime comprometer suas reservas de gás ou de petróleo para alimentar o potencial de bilhões de quilowatts/hora que requer, com a urgência de um país de Terceiro Mundo, seu desenvolvimento industrial. O império quer proibi-lo e o está ameaçando com bombardeios. Hoje [dezembro de 2005] já se discute na esfera internacional que dia e que hora, ou se será o império, ou se se utilizará – como se utilizou no Iraque – o satélite israelense para o bombardeio preventivo e de surpresa de centros de investigação que procuram obter a tecnologia de produção do combustível nuclear. E veremos o que vai acontecer se resolverem bombardear o Irã.

Ramonet – Vocês estão sendo acusados de ajudar o Irã com tecnologia.
Fidel - Sim, fomos acusados – nos acusam de tudo – de estarmos colaborando com o Irã, transferindo tecnologia com esse objetivo. E o que estamos construindo, em sociedade com o Irã, é uma fábrica de produtos anticancerígenos! Isso é o que estamos fazendo. O Irã assinou o Tratado de Não-Proliferação Nuclear, como fez Cuba. Nós nunca pensamos em fabricar armas nucleares, porque não precisamos delas. Mesmo sendo tecnicamente acessíveis, quanto custaria produzi-las? E de que adianta produzir uma arma nuclear diante de um inimigo que tem milhares de armas nucleares? Ninguém deve ter direito a produzir armas nucleares. E menos ainda o privilégio que o imperialismo assumiu de impor seu domínio hegemônico aos países do Terceiro Mundo e de arrebatar seus recursos naturais e suas matérias-primas. Já os denunciamos várias vezes. E defenderemos a todo custo, em todos os palanques do mundo, sem nenhum temor ou medo, o direito dos povos de produzir combustível nuclear. Têm de acabar no mundo a estupidez, os abusos, o império da força e do terror, cada vez são mais povos que se rebelam e o império não poderá sustentar o sistema infame que sustenta. Um dia Salvador Allende falou de “mais cedo ou mais tarde”, pois acredito que mais cedo ou mais tarde esse império se desintegrará.

Ramonet – De certa forma, essa crise é uma primeira conseqüência do esgotamento atual do petróleo e das mudanças que isso está produzindo.
Fidel - Sem dúvida, porque 80 por cento do petróleo está atualmente nas mãos de países do Terceiro Mundo, já que os outros esgotaram o seu, entre eles os Estados Unidos, que tinham imensas reservas de petróleo e gás. Mas essas reservas vão durar apenas mais alguns anos, motivo pelo qual estão procurando garantir a posse do petróleo onde quer que seja e da forma que puderem. Essa fonte energética, no entanto, como já vimos, está se esgotando, e daqui uns 25 ou 30 anos só restará, para a produção em massa de eletricidade – além da solar, da eólica, da biomassa etc. –, uma fonte de energia fundamental: a nuclear. Porque ainda estamos longe do dia em que o hidrogênio, mediante processos tecnológicos muito incipientes, vai ser a fonte mais adequada de combustível, sem a qual a humanidade não poderá viver. Uma humanidade que adquiriu determinado nível de desenvolvimento técnico. Esse é um sério problema do presente. Assim anda este mundo. Há uma série de problemas ecológicos que nem sequer são conhecidos, as catástrofes avançam uma a uma, e há desastres maiores, como o câncer.

Ramonet – Ou a Aids.
Fidel - Há 25 anos, a aids não existia, e hoje há mais de 40 milhões de doentes ou infectados pelo vírus HIV da aids. E os que possuem os melhores laboratórios estão dedicados à terapêutica, não à prevenção, não às vacinas, porque um tratamento – sabemos muito bem – que é vendido a 10 mil dólares por ano, e que a cada ano o doente tem de repetir, gera mais lucros. A medicina terapêutica gera muito mais lucros do que a medicina preventiva. E agora também apareceu o vírus da pneumonia atípica, a Sars [Síndrome Respiratória Aguda Grave], quando ninguém esperava; ou o da febre do Nilo, que veio do noroeste dos Estados Unidos, evidentemente trazido de algum lugar do mundo; ou a famosa dengue, tão mencionada, que tem quatro formas diferentes de vírus, e a combinação entre eles dá lugar a complicadas doenças como a dengue hemorrágica; e pode se alastrar o vírus da gripe aviária e provocar uma epidemia terrível, inédita... Todos esses problemas não eram conhecidos; hoje se tem consciência de que há uma forte relação entre todos esses temas: economia, indústria, demografia, desenvolvimento, ecologia… (...)

Ramonet – Você estabelece alguma relação entre a globalização liberal e a aceleração da destruição do meio ambiente?
Fidel - Penso que todo esforço para preservar o meio ambiente é incompatível com o sistema econômico imposto ao mundo, essa impiedosa globalização neoliberal, com as imposições e condicionamentos com que o FMI sacrifica a saúde, a educação e a seguridade social de bilhões de pessoas. E com a forma cruel pela qual, mediante a livre compra e venda de divisas entre as moedas fortes e as fracas moedas do Terceiro Mundo, arrebatam deste fabulosas somas todos os anos. Em síntese, acredito que preservar o meio ambiente é incompatível com a política da OMC, concebida para que os países ricos possam invadir o mundo com suas mercadorias sem restrição alguma, e para liquidar o desenvolvimento industrial e agrícola dos países pobres, sem outro futuro senão o de fornecer matérias-primas e mão-de-obra barata; com a Alca [Área de Livre Comércio das Américas] e outros acordos de livre comércio entre os tubarões e as sardinhas; com a monstruosa dívida externa, que algumas vezes consome até 50 por cento dos orçamentos nacionais, absolutamente impagável nas atuais circunstâncias; com o roubo de cérebros, o monopólio quase total da propriedade intelectual e o uso abusivo e desproporcional dos recursos naturais e energéticos do planeta. A lista de injustiças seria interminável. O abismo se aprofunda, o saque é maior… (...)

Ramonet – Devemos desacreditar do ser humano? Ou ainda podemos conservar um pouco de esperança na sua capacidade de deter a corrida para o abismo?
Fidel - Hoje sabemos o que acontece. Do meu ponto de vista, não há tarefa mais urgente do que criar uma consciência universal, levar o problema à massa de bilhões de homens e mulheres de todas as idades, incluindo as crianças, que habitam o planeta. As condições objetivas e os sofrimentos de que padece a imensa maioria deles criam as condições subjetivas para a tarefa de conscientização. Tudo está associado: analfabetismo, desemprego, pobreza, fome, doenças, falta de água potável, de moradias, de eletricidade; desertificação, mudanças climáticas, desaparecimento de áreas verdes, inundações, ciclones, secas, erosão dos solos, biodegradação, pragas e demais tragédias que você conhece bem. Que resultados conseguimos desde a Cúpula do Rio em 1992? Quase nenhum. Ao contrário. Enquanto o Protocolo de Quioto é vítima de um arrogante boicote, as emissões de dióxido de carbono, longe de diminuir, aumentaram 9 por cento; e o país mais poluidor – os Estados Unidos –, em 18 por cento! Os mares e os rios estão hoje mais envenenados do que em 1992; 15 milhões de hectares de florestas são devastados a cada ano, quase quatro vezes a superfície da Suíça… A sociedade humana cometeu erros colossais e continua cometendo, mas estou profundamente convencido de que o ser humano é capaz de conceber as mais nobres idéias, conservar os mais generosos sentimentos e, superando os poderosos instintos que a natureza lhe impôs, é capaz de dar a vida pelo que sente e pelo que pensa. Assim demonstraram muitas vezes ao longo da história. (...)

Ramonet – Quantos estudantes há em Cuba?
Fidel - Atualmente há mais de 500 mil estudantes em nossas universidades, de todos os ramos da ciência, e que podem ser qualificados e requalificados, podem passar de uma atividade para outra e serão capazes de muitas coisas. Entre esses estudantes, mais de 90 mil eram jovens que não tinham matrícula nem emprego, muitos deles de origem humilde, que hoje estão obtendo excelentes resultados nos estudos universitários. Existem já 958 universidades. Há 169 universidades municipais, do Ministério de Educação Superior; há 84 universidades em comunidades açucareiras; 18 em prisões, unidades de ensino superior que têm centenas de matriculados em licenciatura de estudos socioculturais. E isto é novidade: universidades nas prisões. Existem também 169 universidades de saúde pública, 1352 unidades de clínica geral, unidades de saúde e bancos de sangue, nos quais se estudam diferentes licenciaturas associadas à saúde pública. E há quase 100 mil professores entre titulares e assistentes. Muitas pessoas que faziam parte da máquina burocrática das centrais açucareiras e de outros lugares hoje estão dando aula, são professores-assistentes. Entre ambos, estudantes e professores – sem mencionar os funcionários das universidades – há em torno de 600 mil.
(Por Gilberto Maringoni, Agência Carta Maior,10/08/2006)

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