Complexidade do licenciamento ambiental é debatida em Novo Hamburgo
2006-08-11
A complexidade e os desafios dos processos de licenciamento ambiental em áreas urbanas esteve em foco ontem nas diversas palestras realizadas dentro das atividades de seminário técnico promovido pela Associação Brasileira de Engenharia Santitária e Ambiental (Abes), no campus II do Centro Universitário Feevale, em Novo Hamburgo. As atividades do evento iniciaram-se com uma abordagem da Compatibilização entre Legislações Ambiental e Urbana, tendo como debatedores a procuradora da Prefeitura Municipal de Porto Alegre Vanesca Bruzelato Prestes e o ex-chefe da Assessoria Jurídica da Fepam e da Metroplan, José Luiz Moura.
Segundo Vanesca, que apresentou um histórico das legislações e os desafios que o poder público tem de enfrentar, uma das dificuldades encontradas pelas administrações municipais é que a legislação urbanística não contempla o esgotamento de recursos naturais. "A questão do esgotamento dos recursos naturais não está na pauta do planejamento urbanístico-ambiental", assinalou. Nem mesmo empreendimentos públicos possuem sistemas de redução de impacto ambiental, como os que possibilitam a reutilização das águas das chuvas, exemplificou.
Também falta um banco de informações nos municípios que possibilite a sugestão de outros locais para a instalação de um empreendimento que tenha um licenciamento negado. "As secretarias do meio ambiente têm fama de ser as secretarias do não. É preciso uma atitude pró-ativa", sugeriu.
O presidente da Abes, Geraldo Portanova Leal, também presente no painel de abertura, destacou a importância de que as discussões sobre licenciamento ambiental permeiem também os pequenos negócios. Vanesca afirmou que, diferente dos pequenos empreendimentos, nos grandes é possível aplicar medidas mitigadoras e compensatórias.
O ex–chefe da Assessoria Jurídica da Fepam e Metroplan, José Luiz Moura, também participou do painel, coordenado pelo supervisor de Meio Ambiente da Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre (SMAM), Walter Koch.
Capacitação
No primeiro painel da tarde, o arquiteto da Metroplan Luiz Merino Xavier falou a respeito das ações desenvolvidas há dois anos pelo órgão na capacitação técnica de municípios do interior que buscam a elaboração de seus planos diretores – considerados essenciais para uma boa estruturação das normas de licenciamento ambiental. "A cidade não pode ser vista como um grande vilão em termos de impacto ambiental. É uma estrutura que permanece, mas comporta uma diversidade grande de aspectos da vida humana, não só como suporte ambiental, mas cultural, artístico, de convivência", refletiu. Segundo ele, os maiores problemas do espaço urbano mal-aproveitado são os loteamentos de grande porte, as favelas e o zoneamento equivocado de indústrias.
Complexidade
A bióloga Magda Arioli, da Secretaria do Meio Ambiente da Prefeitura de Porto Alegre, relatou a complexidade implicada nos processos e licenciamento ambiental da Smam, os quais envolvem um entrelaçado complexo de relações com outras secretarias e órgãos municipais da capital. "O licenciamento é uma grande agulha de costura que reúne pedaços de diversar partes e que, ainda assim, é um instrumento de gestão", disse. Magda ressaltou que a Smam consegue ter termos de referência muito bem estruturados e "amarrados" entre as demais secretarias e órgãos municipais que têm competência de avaliar processos de licenciamento.
Estado
Já a mestre em Direito Rosângela Motiska Bertolo, conselheira do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, apontou a importância do papel do Estado como garantidor de direitos sociais nos processos de arbitragem sobre o meio ambiente. "É preciso tomar os diretos do cidadão a sério", frisou, citando que os processos de licenciamento ambiental devem não apenas observar a legislação ordinária desse segmento, mas espelharem o que está na Constituição Federal. "O artigo 3º da Constituição, por exemplo, fala sobre a garantia do desenvolvimento nacional, da erradicação da pobreza e da redução das desigualdades como um princípio", apontou.
Localização
No primeiro painel da tarde, a arquiteta presidente do Grupo de Análise e Projetos Habitacionais da Prefeitura de São Paulo, Cibele Rumel, apontou as contradições enfrentadas pelos órgãos licenciadores quanto às discrepâncias de terem que se usar leis de zoneamento rural para a gestão territorial urbana. "Os códigos de águas (1934) e florestal (1965) são diretrizes criadas para o meio rural, dizem respeito ao aumento da fronteira agrícola e não fazem alusão a áreas urbanas; porém, são aplicados ao planejamento territorial urbano", criticou.
De acordo com Cibele, é preciso acabar com conflitos entre as visões dos urbanistas e dos legisladores.
Muitas leis
A promotora Ana Maria Marchesan Moreira, do Ministério Público do Rio Grande do Sul, ao falar no painel sobre Gestão Urbano-Ambiental Compartilhada, ressaltou o excesso de leis e resoluções que precisam ser observadas na avaliação dos pedidos de licenciamento, bem como na ação do Ministério Público, quando acionado em litígios que envolvem o meio ambiente. "A questão ambiental é complexa porque muitos impactos não ficam na esfera municipal, e mesmo assim são usadas leis municipais como diretrizes", notou.
Detalhamento
Para o secretário de Meio Ambiente de Porto Alegre, Beto Moesch, "nenhum empreendimento de grande porte é sustentável, ao mesmo tempo, do ponto de vista ambiental, econômico e social". Ele discorreu sobre os recentes grandes projetos a cargo do licenciamento municipal, como o Conduto Forçado Álvaro Chaves, a Terceira Perimetrla - empreendimento de US$ 115 milhões -, o Projeto Integrado Entrada da Cidade, o Loteamento Jardim Germânia - atualmente embargado pela Justiça Federal - e o projeto do Teatro da Ospa.
Balanço
O presidente do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema/RS), Valtemir Bruno Goldmeier, falou a respeito da municipalização do licenciamento ambiental, assinalando a situação de destaque do Rio Grande do Sul perante outros Estados, por ter 133 de seus 496 municípios aptos ao licenciamento de atividades de impacto local. "Nossa meta é chegar ao final do ano com 200 municípios tendo condições de assumir o licenciamento municipal e, na próxima reunião do Consema, semana que vem, teremos a análise de mais três pedidos", disse.
Goldmeier foi interpelado por representantes do Movimento Roessler que, no seminário, questionaram a indicação da ONG Amigos da Floresta para ter assento no Consema, o que foi realizado em desarcordo com resolução do Consema que delega a indicação das ONGs com participação no conselho à Apedema, órgão que reúne entidades de defesa do meio ambiente no Rio Grande do Sul. Goldmeier explicou que a decisão de indicar a Amigos da Floresta para o Consema - o que provocou protesto e retirada de todas as demais ONGs ambientalistas do Consema - é uma decisão que passa pela Casa Civil do Governo do Estado e cuja tramitação teve início antes de ele assumir mandato como presidente do Conselho. "Esperamos ter uma resposta para isso em breve", disse, afirmando que o assunto estava sendo analisado em âmbito jurídico, na Casa Civil do Estado.
Medo
O último painelista do dia, engenheiro Otávio Okano, diretor-presidente da Cetesb/SP e vice-presidente da Associação Brasileira de Entidades Estaduais do Meio Ambiente, afirmou que o Estado de São Paulo enfrenta dificuldades de colocar em prática o licenciamento ambiental municipalizado porque "os municípios têm medo de assumi-lo". "Eles receiam não ter estrutura e ter que arcar com o ônus legal da fiscalização, pois o artigo 23 da Constituição Federal, que trata da possibilidade de os municípios assumirem essa tarefa, não está regulamentado", justificou.
Okano disse que as tentativas de municipalização recentes realizadas neste ano em Santo André e Bertioga não foram felizes. "Há uma demanda por comissões tripartites para capacitar os municípios", disse. Okana ainda ressaltou o problema dos erros na localização de projetos habitacionais - como foi o caso de Barão do Mauá, onde um loteamento erguido sobre uma área de passivo ambiental ainda está causando prejuízos sérios, humanos e econômicos, ao Estado.
O seminário prossegue na manhã de hoje com painéis sobre Equipamentos Urbanos e a Sustentabilidade do Ambiente e Controle da Poluição e Questão Urbana. O encerramento está previsto para as 16h.
(Por Cláudia Viegas, 11/08/2006)