Medicina, controle ambiental e arqueologia são algumas das aplicações de reator nuclear português
2006-08-10
O reator nuclear experimental de Sacavém produz "pouquíssimos resíduos" e o urânio utilizado como combustível é periodicamente devolvido ao país de origem, os Estados Unidos, disse à Lusa o diretor da equipa científica do reator. Medicina, controle ambiental e arqueologia são algumas das aplicações do reator do Instituto Tecnológico e Nuclear, controlado por uma comissão independente desde a década de 1970, apesar de só este ano ter sido formalmente licenciado.
O físico nuclear José Marques disse à Agência Lusa que o reator ainda utiliza como combustível urânio comprado aos Estados Unidos em 1974 e "produz pouquíssimos resíduos". "Os elementos de combustível usados são devolvidos periodicamente aos Estados Unidos, não temos necessidade de armazenar resíduos em Portugal", afirmou.
José Marques explicou que quando foi construído, em 1961, o reator pertencia à Junta de Energia Nuclear, que era simultaneamente o órgão licenciador e que "não se auto-licenciou", mas mesmo antes de o reator funcionar já havia regras. Com o desmantelamento da Junta, nos anos 70, "não ficou claro quem era o responsável", mas o reator ficou sob o controle de uma comissão de segurança independente, que desde então assumiu "a aprovação de limites, a definição do que precisa de parecer e as inspecções".
A licença formal para funcionar foi exigida a partir de 2002 e o processo passou para a responsabilidade da Direção-Geral de Energia, com quem o ITN "entrou em conversações" até à atribuição da licença em Janeiro deste ano. A Comissão Independente para a Proteção Radiológica e a Segurança Nuclear, que "já tem quatro membros nomeados" vai controlar o funcionamento do reator, tal como todas as outras aplicações da radioatividade, como os diagnósticos médicos por raios X.
"A vantagem de termos um reator é podermos detectar concentrações muito pequenas, o que não se consegue com outros processos químicos", explicou José Marques. Utilizando uma técnica chamada análise por ativação com neutrões, o reator tem aplicações na medicina, como a produção de isótopos radioativos utilizados para simplificar exames médicos em que é preciso ver partes específicas do corpo humano.
Outra das aplicações no campo da saúde é conseguir detectar elementos essenciais presentes na dieta diária dos portugueses, mesmo em quantidades muito reduzidas. Para o ambiente, o reator serve para controlar a presença de metais pesados na atmosfera e foi utilizado para controlar as emissões da incineradora de resíduos urbanos de São João da Talha. Na arqueologia, o reator é usado para datar e identificar a origem de peças. Outra das aplicações do reator é o treino de pessoal para trabalhar com energia nuclear, um trabalho que poderá ser aproveitado caso venha a existir um "reator de produção de energia".
Embora o reator de Sacavém seja mais pequeno do que um reator de produção ("é como a diferença entre uma avioneta Cessna e um avião de passageiros Airbus"), o princípio básico de funcionamento é semelhante, adiantou José Marques. Apesar de Portugal não ter centrais nucleares, tem pessoas treinadas na utilização da tecnologia, o que permite integrar grupos de trabalho na União Européia que definem legislação que regula a produção de Energia Nuclear.
José Marques rejeitou qualquer tipo de "secretismo" em relação à atividade do reator, revelando que a instalação tem "mais de 2500 visitantes por ano", desde alunos do ensino secundário até militares, passando pelo público em geral, que uma vez por ano pode visitar livremente o reator, com marcação. A equipa que trabalha com o reactor do ITN é composta por quatro investigadores doutorados em Física Nuclear, bem como sete técnicos que receberam formação específica na área.
(Ciência Hoje, 09/08/2006)
http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=3859&op=all