Escassez de água prejudica cultivo da papoula no Afeganistão
2006-08-10
Uma prolongada seca e o avanço das plantações de papoula para fabricar drogas sobre os cultivos de trigo provocou uma onda de fome que afeta milhões de afegãos. A produção de trigo caiu de 4,4 milhões de toneladas para 3,7 milhões este ano. O Ministério da Agricultura atribui a seca à sensível redução da área plantada com a principal fonte de alimento para a maioria dos afegãos.
Mas especialistas afirmam que essa seca não é o único fator da atual crise do trigo. Na equação – dizem - é chave o cultivo de papoula, (matéria-prima do ópio, da morfina e da heroína). Os produtores afegãos conseguem lucro muito melhor com este produto. Assim, poucos querem cultivar trigo. Os agricultores afegãos não conseguem mercados para sua produção por causa das importações de farinha de trigo procedente de países vizinhos, mais barata do que a nacional.
Um agricultor da província de Herat disse ao The Killid Group que se o mercado de trigo continuar nestas condições os agricultores que ainda não o fizeram não terão outra opção que não seja voltar a plantar papoula, atividade em crescimento desde 2005. A prolongada seca contribuiu com a crise agrícola no Afeganistão, onde 13 províncias enfrentam problemas alimentares devido à escassez de chuva e ao calor. Agricultores da província de Dai Kundi se arriscam a perder uma valiosa colheita de amêndoa para a seca.
Em Helmand, milhares de pessoas abandonaram suas aldeias em busca de comida. O grande rio que dá nome à província secou. Em uma época de aquecimento planetário, a escassez de água, a seca e as calamidades naturais são causas reais de preocupação. Mas com um planejamento adequado e uma resposta pontual do governo isto pode ser abordado. O governo federal deveria dispor a construção de novas represas e sistemas de distribuição de água e reabilitar os existentes.
Pelo menos, dois terços dos estabelecimentos agrícolas do país dependem da água de irrigação. O Ministério da Agricultura tem a responsabilidade de ajudar os agricultores, fornecendo sementes melhoradas e fertilizantes, melhor acesso à água, novas tecnologias e equipamento mecanizado, créditos e materiais, além de acesso a mercados internos e externos. Os produtores afegãos merecem maior proteção governamental, que pode ser concretizada através de novas leis e da regulamentação das importações de trigo barato de países vizinhos.
Os agricultores se queixam da lentidão do governo para abordar seus problemas. Há dificuldades de acesso à informação sobre o preço das matérias-primas e os mercados agrícolas dentro e fora do país. Tampouco há créditos financeiros ou materiais, nem sementes melhoradas, fertilizantes ou pesticidas disponíveis. Os produtores dizem que estes problemas são a raiz da escassez de alimentos. Por causa da queda nos preços, não vale a pena colher e vender. Muitos analistas vêem o plano qüinqüenal do ministério como um passo na direção certa. Mas as estratégias e os planos geralmente ficam no papel.
No dia 25 de julho, em uma entrevista coletiva em Cabul, o segundo vice-presidente e presidente do comitê de ajuda para a emergência, Mohammad Karim Khalili, disse que as pesquisas revelavam que 2,5 milhões de afegãos sofriam graves problemas alimentares. A Organização das Nações Unidas e o governo afegão solicitaram conjuntamente US$ 76,4 milhões em assistência alimentar. O país necessita importar 1,2 milhão de toneladas de trigo para reverter a queda da produção.
Até agora, a maior contribuição partiu da Agência para o Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (Usaid), que prometeu US$ 20 milhões ao Programa Mundial de Alimentos (PMA). O Japão prometeu US$ 3 milhões. Segundo o ministro da Agricultura e Irrigação, Obaidullah Ramin, são necessários US$ 7 milhões para a manutenção do fornecimento hídrico, US$ 9 milhões em ração animal e US$ 50 milhões em outros alimentos. A soma restante será destinada a outros programas.
A economia agrária não se recuperou da severa seca entre 1998 e 2001. Apenas 15% da terra cultivável do país, a maior parte em vales dispersos, são realmente cultivados. Anos de seca e instabilidade aumentaram o endividamento rural. Se o governo não encontrar uma maneira de abordar rapidamente a crise do trigo, os produtores afegãos se dedicarão a plantar papoula em uma escala muito maior. Isto colocaria o governo diante de um dilema real a longo prazo.
(Por Análise de Sediqullah Bader, Envolverde, 09/08/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=20877&edt=1