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2006-08-01
Com muito esforço, o jornalista Luis Felipe Cesar conseguiu cinco minutos num encontro da Associação Mundial de Moradores de Montanhas realizado em 2002, em Quito, no Equador, para falar sobre as montanhas brasileiras. Os outros participantes desconfiavam da participação dele, para dizer o mínimo. Afinal, a lista de itens que fazem fama do Brasil no Exterior passa longe de qualquer formação de alta montanha. O primeiro slide da apresentação de Luis Felipe foi uma foto da serra de Urubici, em Santa Catarina. O espanto foi geral.

Luis Felipe é integrante da organização não governamental Crescente Fértil, que coordena um projeto chamado “Mobilização Nacional pelos Ecossistemas de Montanhas”, criado naquele mesmo ano de 2002. A intenção é pressionar o governo por uma política pública de proteção a essas regiões no Brasil, além de promover estudos sobre a situação desses locais – em grande parte desconhecidos – quanto a sua ocupação e seu status de conservação.

Quinze por cento do território nacional encontra-se acima dos 600 metros de altitude, sendo que a resolução nº 3.003 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), de 2002, considera montanha uma “elevação do terreno com cota em relação à base superior a 300 metros”. Mas há pouca informação sobre a população e o meio ambiente específicos dessas regiões.

A ação do movimento, que reúne outras entidades, grupos de pesquisa em universidades e montanhistas baseia-se no capítulo XIII da Agenda 21, o documento produzido na Rio 92 que lista metas ambientais para o século atual. O texto descreve as montanhas como uma “fonte importante de água, energia e diversidade biológica” que também são opções de lazer. Diz que 10% da população do mundo dependem diretamente dos seus recursos e “uma porcentagem muito maior” se utiliza da água proveniente delas.

O ano de 2002 foi declarado pela ONU o Ano Internacional de Montanhas. Governos e entidades se uniram sob coordenação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) para discutir políticas específicas para as áreas de montanha do planeta, que ocupam 25% de sua superfície. O Brasil não participou das discussões, que resultaram num fórum existente até hoje, a Aliança para as Montanhas.

Segundo Luis Felipe, a Aliança inclui países como Cuba, que tem menos formações montanhosas do que o Brasil. Mas, ao contrário deles, nós ainda estamos longe de uma mobilização em favor desses ecossistemas. As reivindicações do movimento foram encaminhadas mais de uma vez ao Ministério do Meio Ambiente, que ainda não aderiu à idéia, apesar de, segundo ele, simpatizar com o projeto.

Para o ambientalista, é preciso antes de tudo que o Brasil se reconheça como um país de montanhas, o que ainda não acontece. Para ele, a maior conquista da mobilização foi ter falado pela primeira vez no assunto. “Nós criamos uma referência”, diz.

Imagem distante

A historiadora e montanhista Alessandra Izabel de Carvalho acredita que o Brasil não desenvolveu uma “cultura de montanhas”, ao contrário de outros países. É como se essas formações servissem apenas de cenário para a prática da escalada, e outros esportes radicais.

“É uma noção um pouco midiática, distante da montanha como uma fuga para o estresse da cidade grande”, explica ela. Nos estados do Sul e Sudeste ainda haveria uma imagem um pouco mais forte, por conta da proximidade com os maciços brasileiros mais importantes. Mas no Norte e no Centro-Oeste, segundo ela, a idéia é muito vaga, e a falta de informação seria um dos principais motivos pelos quais as pessoas não atentam para a importância dessas regiões, ou mesmo para a sua existência.

Alessandra, que tem uma pesquisa sobre os marumbistas – pessoas que praticavam o montanhismo no Marumbi, Paraná, entre as décadas de 1940 e 1960 –, defende que as montanhas de lá foram as primeiras do Brasil a serem escaladas para fins esportivos, em 1879.

No estudo, Alessandra diz que o motivo pelo qual as pessoas começaram a subir as encostas das montanhas foi a busca por experiências sublimes ou informações cientificas. Com o tempo, elas perceberam o prazer que a subida poderia proporcionar. Estaria aí a origem do esporte.

Mas apesar dessa forte ligação com a natureza, a pesquisadora acredita que não se pode ligar automaticamente as figuras do montanhista e do ambientalista. “Há 20 anos, quando se subia as trilhas de escalada, era possível descer com quilos de lixo”, conta. “E até hoje, não é todo montanhista que se preocupa com a preservação das áreas que visita”.

Se nem entre esses esportistas é unanimidade a consciência de que é preciso preservar os ecossistemas de montanha, que dirá entre quem raramente (ou nunca) freqüenta essas áreas. Para Alessandra, só com um envolvimento maior das pessoas com os parques nacionais e outras áreas preservadas será possível criar a consciência de um país montanhoso. O brasileiro, segundo ela, não está acostumado a visitar unidades de conservação e talvez por isso a ligação dele com as montanhas seja tão fraca. Levar as pessoas aos parques, com educação ambiental, seria o primeiro.
(Por Eric Macedo, O Eco, 29/07/2006)

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