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2006-08-01
Em meio às turbulências causadas pela alta no preço do gás natural argentino, o Chile anunciou sua intenção de desenvolver a indústria do biocombustível, a fim de continuar diversificando sua matriz energética. A notícia foi divulgada na quinta-feira durante o Seminário Internacional sobre Agroenergia e Biocombustíveis, organizado pelo Escritório Regional para a América Latina e o Caribe, da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), que terminou no sábado (29/07).

Os biocombustíveis, considerados limpos para o meio ambiente, são produzidos a partir de matérias-primas agrícolas ou florestais como cana-de-açúcar, beterraba, milho, plantas herbáceas energéticas, sementes oleaginosas (como a colza), dejetos agrícolas, resíduos florestais e esterco. “A questão energética é um assunto estratégico, fundamental para o desenvolvimento futuro do país. Aqui não cabem improvisações nem boas intenções”, disse a presidente do Chile, Michelle Bachelet, convidada para a abertura do encontro.

“Nesta matéria, simplesmente, não podemos falhar. Somente o trabalho sério, o planejamento, os estudos e a manutenção de um adequado clima de investimento garantem o sucesso”, acrescentou. O desenvolvimento da agroenergia é uma prioridade para o governo, por isso espera-se que até 2010 possa haver “algum grau de presença seja do biodiesel ou do etanol no mercado”, principalmente com base no milho, na beterraba e na colza, disse à IPS o ministro chileno da Agricultura, Álvaro Rojas.

“Queremos que este seminário seja um marco, um ponto de partida para esta indústria”, acrescentou Rojas, se referindo aos contatos que o governo estabeleceu com as delegações de diversos países da região, como Brasil e Argentina, mais avançados na matéria. Para isso, o governo criou um comitê interministerial formado pelas pastas da Agricultura, Mineração e Energia e Bens Nacionais e a Comissão Nacional de Energia (CNE), que deverá liderar a formulação de uma política nacional de agroenergia e biocombustíveis que requer uma aliança pública e privada.

Rojas disse que o país tem potencial para desenvolver esta indústria, sobretudo no centro e sul do país, em terrenos de baixa produção destinadas principalmente ao auto-consumo. A seu ver, isto beneficiaria tanto os pequenos produtores quanto a sociedade em seu conjunto. O ministro ressaltou que “já há pequenas usinas de colza trabalhando para atender a demanda de óleo para a alimentação de salmão produzido em cultivo, as quais podem ser uma primeira fase de um desenvolvimento voltado para o biodiesel”. Para este ano, o governo comprometeu 200 milhões de pesos para realizar diversas ações concretas.

Entre elas destaca a criação da Unidade de Desenvolvimento de Biocombustíveis dentro do Escritório de Estudos e Políticas Agrárias, dependente do Ministério da Agricultura; a realização de seminários ao longo do país, e a organização de viagem ao estrangeiro com delegações público-privadas para conhecer a realidade de outras nações. Também serão convidados especialistas do exterior e convocadas as faculdades de agronomia das universidades nacionais para que apóiem o desenvolvimento desta atividade com suas pesquisas. Em sua intervenção, Bachelet lembrou que até agora o Chile tem sido, principalmente, um comprador de energia.

“Hoje, cerca de 72% de nossa matriz energética são importados, razão pela qual se vê diretamente afetada pela volatilidade internacional dos preços e pela escassez que prevalece nos mercados de origem de nossas importações de combustíveis”, afirmou. O representante regional da FAO, o brasileiro José Graziano da Silva, disse que o fato de “os novos combustíveis poderem ser ‘plantados’ nos campos, e não extraídos do solo, indica uma transformação estrutural ampla e profunda. Esta exige que governo, autoridades e pesquisadores renovem seu olhar, suas agendas e avaliações sobre o futuro do espaço rural”, afirmou Graziano, considerando que a agroenergia incentiva a agricultura, a silvicultura e a indústria florestal.

O ministro da Agricultura, pecuária e Abastecimento, Luis Carlos Guedes Pinto, disse aos jornalistas que esta atividade deve ser vista não apenas com “olhos financeiros”, mas também, do ponto de vista social e ambiental, já que seu desenvolvimento requer a entrega de estímulos específicos, como créditos aos pequenos camponeses, como fez o governo brasileiro. O Brasil, pioneiro na região, produz etanol a partir da cana-de-açúcar e fabrica biodiesel a partir de sementes de leguminosas, óleo de rícino e palma. A Argentina também está produzindo biodiesel, mas a partir da soja. Além disso, há progressos com a cana-de-açúcar na República Dominicana e em Cuba.

Durante o seminário, a FAO mostrou sua proposta para a criação da Plataforma Internacional de Bioenergia (Ibep) “Como forma de coordenar o esforço mundial para avançar no desenvolvimento desta nova fonte energética”. Esta agência da Organização das Nações Unidas afirma que, apesar de muitos países já realizarem atividades na área de bioenergia, é necessário reduzir a considerável diferença de conhecimentos, tecnologia, capacidade e habilidade que existe entre os países mais ricos e os mais pobres do mundo.

Sara Larraín, do não-governamental Programa Chile Sustentável, disse à IPS que, “a princípio, é positivo o fato o país abrir novas fontes energéticas, que possam sem obtidas independentemente, que gerem empregos e evitem a dependência de combustíveis estrangeiros, caros e sujos”. Entretanto, advertiu que os biocombustíveis também têm seus riscos, com a propagação dos monocultivos, que podem deslocar a agricultura para a alimentação; o uso de fertilizantes e pesticidas e a utilização de produtos transgênicos, como milho e soja. Para evitar tudo isso, a seu ver, é necessário um contexto regulatório claro.
(Por Daniela Estrada, Eco Portal, 31/07/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=20395&edt=1

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