Mineração de areias negras custa caro ao meio ambiente
2006-07-25
Milhares de quilômetros quadrados de areias e solos contendo alcatrão debaixo das
florestas boreais do Canadá são objeto do insaciável apetite petrolífero dos Estados Unidos e de outros países, gerando
importantes impactos ambientais. Trata-se de um esforço industrial de proporções titânicas que cresce a um ritmo vertiginoso.
E o meio ambiente sofre em um nível semelhante. Extrair petróleo de areias impregnadas por alcatrão – ou petrolíferas –
a cerca de 60 metros abaixo do tapete aparentemente infinito de abetos, lagos e mangues, ao norte da meridional província
de Alberta, não só custa caro. Também é altamente contaminante. “O petróleo dessas areias tem maiores impactos ambientais
do que qualquer outro método de produção petroleira”, assegurou ao Terramérica Dan Woynillowicz, pesquisador do
não-governamental Instituto Pembina, em Calgary, Alberta.
As areias com alcatrão são encontradas em três importantes áreas abaixo dos 140,8 mil quilômetros quadrados do nordeste
de Alberta. Desde 1973, apenas 2% deste total estiveram envolvidos na produção de petróleo, segundo dados do governo
dessa província. Esta enorme superfície é a segunda maior reserva provada de petróleo do mundo, depois da Arábia Saudita,
de acordo com o Departamento de Energia dos Estados Unidos. A Associação Canadense de Produtores de Petróleo e a
anglo-holandesa Shell Oil afirmam que as reservas dos canadenses são as maiores do mundo.
O Canadá se converteu no maior provedor de petróleo dos Estados Unidos. Mais de 2,1 milhões de barris são enviados a
cada dia, representando cerca de 10% do total de petróleo e gasolina norte-americanos. A metade dessa quantidade procede
das areias com alcatrão de Alberta. Seu desenvolvimento já é o maior projeto industrial do mundo. E com os preços da
energia nas nuvens, empresas petrolíferas de todo o mundo planejam investir US$ 110 bilhões para expandir as operações,
esperando triplicar a produção nos próximos 10 a 15 anos. Em breve, mais oleodutos atravessarão Alberta para exportar
todo esse ouro negro.
Na semana passada uma empresa canadense propôs construir tubulações de 3,3 mil quilômetros de comprimento, ao custo de US$
3,6 bilhões, com conexão no Texas, para que 400 mil barris diários de petróleo retirado de areias com alcatrão sejam
transformados em gasolina, até 2011. A China propôs que um oleoduto de 1,16 mil quilômetros e custo de US$ 2,5 bilhões
transporte petróleo de Alberta, através das Montanhas Rochosas, até a costa ocidental do Canadá.
Existem oito ou nove propostas sobre a mesa, incluindo oleodutos na Califórnia, disse Greg Stringham, vice-presidente
da Associação Canadense de Produtores de Petróleo. Algumas já começaram como uma expansão das tubulações até o meio-oeste
dos Estados Unidos e a costa ocidental canadense, disse ao Terramérica. “Não há nenhuma outra parte do mundo onde se
invista tanto dinheiro” neste setor, afirmou Woynillowicz.
A mineração a céu aberto tem sido a principal técnica para levar as areias com alcatrão a este ponto. As escavadoras
hidráulicas retiram entre 80 e 90 toneladas de rochas e areia e as colocam nos maiores caminhões basculantes do mundo,
os Caterpillar 797B, que medem 7,5 metros de comprimento e pesam 623,69 toneladas, quando vazios. Muitas operações também
utilizam enormes sistemas de esteiras para transportar o material até unidades processadoras, onde o alcatrão é literalmente
evaporado da areia com água fervendo.
Aproximadamente 90% do alcatrão é recuperado. Precisa ser processado, com a adição de hidrogênio, aplicação de calor
extremo (até 500 graus) e pressão, além da eliminação do nitrogênio e do enxofre, antes que se converta no que se conhece
como petróleo sintético leve e doce. “É descartar o fundo do barril para obter petróleo das areias com alcatrão”,
disse Woynillowicz. A mineração não só destrói grandes áreas, como também o processo, muito intenso em matéria de
consumo de energia e água, emite enormes volumes de gases que causam o efeito estufa, responsável pelo aquecimento global.
Também produz enormes quantidades de resíduos. Quase duas toneladas de areia devem ser escavadas e processadas para fazer
um barril, ou 158 litros de petróleo. Para cada mil litros de óleo embarcado para o sul, ficam para trás seis mil litros
de dejetos. O Syncrude, o maior operador de areias com alcatrão e um empreendimento conjunto entre oito empresas de
energia dos Estados Unidos e do Canadá, tem 300 milhões de metros cúbicos de dejetos estocados em sua Unidade de
Armazenamento de Areia. E mais líquidos são armazenados no depósito de resíduos, de 22 quilômetros quadrados, na bacia
do Lago Mildred.
Como se trata de uma zona onde as aves abundam, é preciso usar salva de tiros e espantalhos para mantê-las afastadas,
disse Rick Schneider, da Sociedade Canadense para os Parques e a Natureza em Edmonton, Alberta. Stringham disse que as
ompanhias de petróleo trabalham em novas técnicas para usar menos água e solucionar o problema dos dejetos. No entanto,
especialistas do Conselho Nacional de Energia do Canadá disseram, em 2004, que esse desafio é “assustador”, já que não
existe uma técnica conhecida. Até 2020, apenas duas companhias produzirão mais de um bilhão de metros cúbicos de dejetos,
segundo informe do Instituto Pembina intitulado “Febre de Areias Petrolíferas”, publicado em novembro do ano passado.
"Os impactos ambientais das areias com petróleo são astronômicos”, disse Lindsay Telfer, do Clube Sierra do Canadá,
em Edmonton, Alberta. As emissões de gases causadores do efeito estufa, a destruição e a fragmentação de florestas e
mangues, poluição do ar e da água, dejetos tóxicos e os impactos sanitários e sociais, tudo está nas areias com petróleo
de Alberta, disse Telfer em uma entrevista. Inclusive, o ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, insistiu na
importância dessas areias. Em uma entrevista à revista Rolling Stone, em junho, Al Gore disse que usar as areias com
alcatrão de Alberta para abastecer os Estados Unidos de petróleo é “verdadeira loucura”, por causa de seus impactos
ambientais. “Esta é a maior questão ambiental no Canadá”, concordou Telfer.
(Envolverde, 24/07/2006)
http://www.envolverde.com.br/materia.php?cod=20099&edt=1