As cicatrizes são sem dúvida de origem humana. Grandes áreas de retângulos, milhares de acres, aparecem ao longo da floresta amazônica, como valas laceradas rodeadas por finas linhas vermelhas e por estradas sujas e ilegais que ladeiam essas clareiras gigantes. Do alto, essa simetria medonha mostra a invasão das plantações de soja que hoje aparecem como uma das principais ameaças à floresta tropical.
No chão, um ecossistema próspero que sustentava pelo menos 300 árvores por hectare, parece agora terra devastada. Ficaram raízes mortas e grama sobre a poeira de um solo erodido. A três horas de carro além da cidade de Santarém, no Pará, pode-se ver a ação de madeireiras ilegais em uma vasta área de monocultura dentro do Parque Nacional de Tapajós. Campos de soja ladeiam áreas de terra marrom em todas as direções.
Na Freguesia de Edilberto Sena, uma paróquia emerge como local crítico para reunião de arrendadores, fazendeiros e multinacionais de agronegócios que tentam ir cada vez mais para dentro da floresta tropical.
A bacia amazônica é lar para um em cada dez mamíferos do mundo e 15% das espécies de plantas terrestres do planeta. Concentra mais da metade das reservas de água potável do mundo e suas vastas florestas funcionam como o maior poço de carbono do mundo, tendo papel vital na questão do efeito estufa.
O Brasil superou os Estados Unidos como o maior exportador mundial de soja. Esse grão se tornou o vínculo lucrativo da cadeia de processamento de alimentos, e 80% da produção mundial vai para a alimentação animal. A soja brasileira está servindo para alimentar a crescente demanda por substitutos de carnes na Europa, e tem superado o desflorestamento e a criação de gado como o maior motor da devastação florestal.
Há três anos, a gigante Cargill, a maior empresa privada do mundo, abriu um porto de exportação de soja em Santarém. E a comunidade de Pai Edilberto viu-se em colisão com a multinacional de Minnesota que, conforme ela, a comunidade, representa o que existe de pior no capitalismo. A Rádio Rural de Santarém, fundada pela igreja local, passou a ser o meio de Edilberto lutar contra as madeireiras ilegais, os produtores rurais e os produtores de soja, que armazenam de grãos a gigante.
"Somos pequenos e lutamos contra multinacionais como Cargill – pessoas que usam a soja como commodity. Tenho certeza de que pelo menos 200 mil pessoas estão nos ouvindo. Nosso objetivo é educar as pessoas, com informações críticas e objetivas”, diz ele, no programa da comunidade.
Há menos de 18 meses, outra ativista da floresta tropical, a irmã Dorothy Stang, foi assassinada à luz do dia em Anapu, a leste do Pará. Após ameaças de morte, a norte-americana naturalizada brasileira foi assassinada por um pistoleiro aliado a fazendeiros locais.
Santarém, uma cidade ribeirinha com milhares de margens para a bacia do Amazonas, é conhecida como centro do boom da soja no Norte do Brasil. No ano passado, o país produziu mais de 50 milhões de toneladas do grão em cerca de 23 milhões de hectares, em uma área de aproximadamente o tamanho do Reino Unido. A produção de soja está relativamente contida no bioma da Amazônia. Nos últimos três anos, 70 mil quilômetros quadrados de floresta tropical amazônica foram destruídos e esse tipo de ação continua. Cerca de 75% da devastação é de origem ilegal.
(Compilado do The Independent, 19/07/2006)