Lester Brown, fundador do Earth Policy Institute, com sede em Washington,
é da opinião que a estratégia atualmente adotada pela indústria
automobilística de concentrar-se na fabricação de veículos flex, que usam
etanol derivado do milho em lugar de carros elétricos, está errada.
"Acho que ela se baseia na idéia de que teremos condições de produzir
gigantescas quantidades de combustível derivado desta cultura, mas não
tenho certeza de que teremos estas condições", afirmou.
Mesmo dando um grande impulso à produção de etanol do milho nos Estados
Unidos, a produção desse combustível ainda corresponde a 3% do consumo
dos automóveis deste país, disse Brown. Obviamente, isto não contribui
para reduzir a demanda de gasolina a ponto de provocar uma queda dos
preços, observou. "Duvido que venha a causar um efeito deste gênero",
acrescentou.
Em uma coletiva por telefone com os repórteres, Brown disse que um estudo
publicado pela National Academy of Sciences concluiu que, se todo o milho
e a soja produzidos nos Estados Unidos fossem usados para a fabricação
de etanol e biodiesel, estes só cobririam 12% da demanda de gasolina e 6%
da de biodiesel. Conseqüentemente, prosseguiu, o uso de produtos à base
de álcool extraído de grãos com a finalidade de substituir o combustível
automotivo extraído do petróleo não irá fazer muita diferença.
Além disso, segundo ele, a transformação de quantidades maciças de grãos
para mover veículos acabaria reduzindo os recursos a serem usados na
alimentação e em rações animais. Conseqüentemente, os preços dos alimentos
subiriam, tornando-se um problema crucial para as populações mais pobres
das regiões em desenvolvimento que já lutam para comer.
A questão já está criando uma competição no mundo entre 800 milhões de
pessoas que querem abastecer seus veículos a fim de preservar sua
mobilidade e os 2 bilhões das pessoas de renda mais baixa, afirmou.
Brown disse que a quantidade de grãos necessária para encher o tanque de
combustível de cerca de 90 litros de um carro utilitário esportivo com
etanol alimentaria uma pessoa durante um ano. O grão necessário para
encher o tanque a cada duas semanas ao longo de um ano alimentaria 26
pessoas.
Outra alternativa ao etanol derivado de grãos é o emprego de uma gramínea
(Panicum virgatum), que pode ser cultivada em terreno de qualidade mais
pobre, sujeito à erosão e lascas da madeira do choupo de rápido
crescimento para fazer aditivo de combustíveis, disse Brown.
Os defensores do etanol argumentam que o milho cultivado para a produção
de etanol é diferente do grão comestível. "Os seres humanos não comem
milho do campo", afirma Monte Shaw, porta-voz da Associação de Produtores
de Combustíveis Renováveis de Iowa. Segundo ele, o processo de destilação
do etanol usa apenas o amido contido no núcleo do milho, e as partes
restantes são vendidas aos pecuaristas para ração animal.
"As mais
recentes pesquisas mostram que é possível produzir cerca de 57 bilhões de
litros de etanol derivado do milho antes que haja um impacto acima de 1%
a 2% sobre os custos das rações animais", disse Shaw. "No ano passado,
os Estados Unidos produziram uma quantidade recorde de etanol, e houve
ainda uma sobra recorde dos estoques de milho anteriores". Ele observou
que alguns ambientalistas utilizam determinados dados estatísticos para
respaldar seu ponto de vista catastrofista.
Calcula-se que a produção mundial de etanol em 2005 chegou a 46,3 bilhões
de litros, disse a Associação de Combustíveis Renováveis, do setor. Os
EUA foram os maiores produtores com 16,2 bilhões de litros, seguidos pelo
Brasil com 16,07 bilhões, informou o grupo.
Brown disse que o segredo da despoluição do meio ambiente e o fim do
esgotamento dos recursos representados pelos grãos para a alimentação é a
promoção dos carros elétricos. "Estes vaículos tem um enorme potencial,
e é cada vez maior o número de pessoas que os consideram uma solução
provável para o nosso futuro".
A maneira mais rápida de despoluir o ambiente e os carros que usam
combustível de uma forma barata e eficiente é desenvolver a eletricidade
gerada por turbinas eólicas e usar esta energia para impulsionar carros
elétricos que podem ser ligados a uma tomada e recarregados, ele disse.
Brow, formado em Ciências Agrícolas pela Rutgers University, foi analista
agrícola internacional para o Departamento da Agricultura e administrador
do Serviço Internacional de Desenvolvimento Agrícola. É autor ou co-autor
de 50 livros.
Kicker: Se todo o milho produzido nos Estados Unidos fosse usado para
fabricar etanol, este só cobriria 12% da demanda de gasolina.
(
Gazeta Mercantil, 19/07/2006)