Indústria de Itaqui recebe primeiro pagamento por créditos de carbono da agroindústria brasileira
2006-07-19
A Camil Alimentos S/A, líder em distribuição e comercialização de arroz e feijão na América Latina, recebeu 1,5 milhões de euros - equivalentes a 207.298 toneladas de carbono – do Bioenergy Investment Fund (Fundo de Investimentos em Bioenergia), pela contribuição na redução de emissão de gás CO2 na camada atmosférica, decorrente da implantação de um projeto de termelétrica que opera a partir da queima de casca de arroz. A iniciativa marca o primeiro pagamento real de créditos de carbono certificado do setor agroindustrial brasileiro. A cerimônia de entrega da quantia aconteceu durante o Seminário Internacional de Lançamento do Fundo de Investimentos em Bioenergia, realizado ontem (18/07), em Porto Alegre.
Os créditos recebidos são retroativos ao período de julho de 2001 até dezembro de 2005. Eles foram gerados de duas formas: através da produção de energia pela queima da casca de arroz na termelétrica UTE Itaqui (4,2 MW), e pela ausência de contato destes detritos com o solo – no processo de decomposição do lixo, as cascas fermentadas liberam o gás metano, cuja emissão na atmosfera contribui para o efeito estufa. O diretor-financeiro da Camil, Luciano Quartiero, afirma que a termelétrica gerou empregos diretos e indiretos na região. "Além disso, resolvemos a questão ambiental. Produzimos 600 mil toneladas de arroz por ano. Vinte e dois por cento do peso de um grão de arroz é casca. Todo ano tínhamos que achar áreas específicas para depositar esses detritos. Conseguimos dar um fim mais digno à casca de arroz", comenta.
A Camil conta, atualmente, com 150 representantes de venda, 750 funcionários e 18 filiais pelo país, sendo seis plantas industriais. "A expectativa é que a empresa gere, em média, 60 mil toneladas de créditos de carbono por ano, o que dá cerca de 400 mil euros em créditos de carbono", prevê Quartiero. Hoje, a indústria de Itaqui é auto-suficiente em energia. Embora a produção da termelétrica seja de 4,2 MW, apenas 3,5 MW são consumidos. "Temos planos de vender esse excedente", declara.
O contato da indústria com o Fundo de Investimentos em Bioenergia se deu através da PTZ Bioenergy, que é a representante do negócio no Brasil. Inicialmente, a empresa de Itaqui investiu R$ 6 milhões. "Foram eles que elaboraram o projeto da termelétrica, entre 1999 e 2000. Agora pretendemos implantar outra usina geradora de energia na unidade de Camaquã, com potencial de 3MW", comenta Quartiero. A Camil pretende gastar R$ 10 milhões na construção da segunda hidrelétrica, que passará a operar em dois anos. "Só seria possível dar continuidade ao projeto - através da implantação da nova usina – com o dinheiro dos créditos de carbono que receberemos hoje", comemora.
Fundo de Investimentos em Bioenergia
O BioEnergy Investment Fund, ou Fundo de Investimentos em Bioenergia, é voltado a empresas privadas do setor agroindustrial ou detentoras de resíduos ou óleos vegetais, que tenham interesse em investir na geração de energia, dependendo exclusivamente de seus próprios resíduos industriais.
O Fundo é liderado pela empresa Holandesa BTG – Biomass Technology Group, além de diversos investidores europeus que operam através da empresa brasileira PTZ Bioenergy. O objetivo é beneficiar empresas que possuam projetos em bionergia consistentes e com viabilidade econômica comprovada, além de projetos tecnicamente adequados às condições previstas para o desenvolvimento da tecnologia que comprovem a possibilidade de sustentabilidade dos padrões de geração a longo prazo. "Além disso, a energia gerada precisa ser limpa, ou seja, não pode causar impacto negativo de ordem econômica ou social no país", disse Geert de Haas, co-investidor do Fundo em palestra, ontem (18/07), no Seminário Internacional. Ele ressaltou, ainda, que o Fundo não admite a participação das indústrias papeleiras nos projetos.
Atualmente a iniciativa conta com mais de 1,5 mil projetos espalhados pelo mundo, focados especialmente na substituição dos combustíveis fósseis pela bioenergia. "Fazendo esta substituição, temos um ciclo de carbono curto - cujo impacto no meio ambiente é menor", relata o co-investidor Geert de Haas. No Brasil, os projetos são desenvolvidos sob a responsabilidade da PTZ Bioenergy. Todos os equipamentos e serviços são, obrigatoriamente, de nacionalidade brasileira. A idéia é incentivar a geração de empregos no país, promover a indústria e aprimorar a mão-de-obra regionalmente.
O investimento em geração de energia a partir da biomassa apresenta, em geral, bons retornos financeiros, já que acaba eliminando os custos com energia elétrica através do uso de um combustível abundante na região e que pode ser obtido gratuitamente. Uma empresa que deseja participar do Fundo deve ter um capital de até US$ 10 milhões para começar. "O que torna o Fundo interessante aos credores é a garantia da compra dos créditos de carbono e os empréstimos flexíveis. Nada impede que uma empresa pague o Fundo com o que lucra após a implantação do projeto", afirma Geert de Haas.
O Secretário de Energia, Minas e Comunicações do Estado, José Carlos Elmer Brack, também esteve presente no Seminário Internacional de Lançamento do Fundo de Investimentos em Bioenergia. Em discurso, ele destacou que estimular fontes alternativas de energia é meta do governo. "A conquista da Camil mostra o quanto somos pioneiros na questão dos créditos de carbono, que ainda é praticamente desconhecida no Brasil, mas representa o futuro. Através da energia, estamos ajudando a economia gaúcha e, ao mesmo tempo, contribuindo para diminuir os impactos ambientais", relata.
(Por Ana Luiza Leal Vieira, 19/07/2006)