Passivo ambiental do biodiesel merece cuidados, sugerem pesquisadores
2006-07-07
Embora surja no cenário nacional como alternativa sustentável ao passivo causado pela energia gerada através dos combustíveis fósseis, o biodiesel também deve ser estudado de forma cautelosa, segundo avaliação da doutoranda em biotecnologia na questão do biodiesel pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Roberta Bussamara. Ela sugere que ainda não há estudos quanto aos problemas ambientais causados por esta alternativa. “Por enquanto, todo mundo está se preocupando apenas em construir a usina”, analisa.
O cuidado necessário, segundo Roberta, diz respeito aos catalisadores químicos utilizados no tratamento de efluentes, além de alguns produtos retirados na lavagem e eliminados posteriormente no ambiente. “Forma muito sabão e sais. Na maioria das vezes, esses produtos restantes podem ser tóxicos e prejudiciais tanto aos recursos hídricos e ao solo, como aos seres humanos”.
A solução apontada pela pesquisadora seria produzir biodiesel através de catalisadores biológicos (biodegradáveis), na tentativa de evitar problemas ao ecossistema. “Nós (o centro de biotecnologia da Ufrgs) já desenvolvemos o catalisador e agora estamos produzindo o biodiesel com esse catalisador. Isso está trazendo bons rendimentos. É mais viável porque reduz o custo de produção e, além disso, para o meio ambiente é muito melhor por que não produz nenhum tipo de rejeito que possa ser tóxico ao ecossistema quando eliminado”.
O assunto foi debatido ontem (06/07) no espaço “Verdes Debates”, evento promovido pela Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul. Estiveram presentes também a geóloga e coordenadora do NAT/Brasil Lucia Ortiz, o engenheiro mecânico da Fundação Estadual de Proteção Ambiental do Estado (Fepam) Antenor Pacheco Neto e o membro do Comitê de Bioenergia e representante da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Marcio Magnani.
Selo Combustível Socioambiental
Situando os presentes no evento sobre as medidas tomadas pelo Governo Federal no programa, como o lançamento do Selo Combustível Social – conjunto de medidas específicas visando estimular a inclusão social da agricultura na cadeia produtiva do biodiesel – Lucia Ortiz reivindicou a necessidade de se obter também um Selo Ambiental na produção desta energia alternativa. “Todos os esforços iniciais foram concentrados na questão social. Mas a gente espera obter resultados na parte ambiental também”.
Para isso, no início deste ano, o NAT elaborou um documento, traduzido para o inglês, com o objetivo de propor critérios de sustentabilidade para a produção de biodiesel e para todas as energias obtidas através da biomassa. Ela informa que o assunto já está sendo discutido em nível internacional, tanto por países produtores como por nações consumidoras de biodiesel. No país, o debate ocorre com a Petrobrás.
Outro aspecto abordado pela representante do NAT é sobre a necessidade de se estabelecer critérios na forma de produção da fonte energética. A ONG rechaça toda e qualquer forma de cultivo transgênico das oleanoginosas, tanto para a produção de energia, como para o cultivo de alimentos. “Nós somos contrários à biotecnologia para qualquer finalidade”. Embora não haja pesquisas que confirmem o passivo causado pelos transgênicos à saúde humana e à biodiversidade, Lucia questiona a possibilidade de contaminação do solo e, conseqüentemente, na produção de outros alimentos.
Já Márcio Magnani, da Embrapa, afirma que a instituição está olhando a questão agronômica do programa. Para isso, procura espécies de oleaginosas adequadas à agricultura familiar e às cooperativas. “Nossa preocupação é que a política do biodiesel realmente beneficie a pequena agricultura”.
Ele ressalta que a questão ambiental também é tratada pela Embrapa, na medida em que os processos de plantios, nas condições adequadas de tecnologia, preservam o ecossistema. “Nesse aspecto, o ambiente da agricultura familiar é muito mais propício na questão de preservação do ambiente do que das grandes culturas”.
Ele aponta a mamona como uma lavoura viável, tanto para as pequenas agriculturas quanto para as pequenas cooperativas. Ela apresenta, segundo Magnani, maior rendimento de óleo na comparação com as outras oleanoginosas, tais como a soja, o amendoim, o dendê ou o girassol. Além disso, o subproduto dela, que é a torta de mamona, pode ser aproveitada pelos próprios agricultores. Ele sugere ainda que a produção de mamona pode se tornar, futuramente, uma alternativa aos fumicultores do Estado. “A gente entende que vai haver a possibilidade de desenvolver esta agricultura de forma sustentável, preocupada com a questão ambiental”.
Combustível biodegradável
Biodiesel é um combustível biodegradável derivado de fontes renováveis, que pode ser obtido por diferentes processos tais como o craqueamento, a esterificação ou pela transesterificação. Pode ser produzido a partir de gorduras animais ou de óleos vegetais, existindo dezenas de espécies vegetais no Brasil que podem ser utilizadas, tais como mamona, dendê, girassol, babaçu, amendoim, pinhão manso e soja, dentre outras.
O biodiesel substitui total ou parcialmente o óleo diesel de petróleo em motores automotivos de caminhões, tratores e ônibus, ou ainda em geradores de eletricidade e calor. Segundo a Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005, biodiesel é um “biocombustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a combustão interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento, para geração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil”.
A transesterificação é processo mais utilizado atualmente para a produção de biodiesel. Consiste numa reação química dos óleos vegetais ou gorduras animais com o álcool comum (etanol) ou o metanol, estimulada por um catalisador, da qual também se extrai a glicerina, produto com aplicações diversas na indústria química.
O biodiesel, segundo Roberta Bussamara, apresenta vantagens em relação aos combustíveis fósseis: é 100% natural, provém de uma fonte renovável, é biodegradável e possui baixa emissão de poluentes. Por outro lado, apresenta baixa volatilidade, aumento nas emissões de NOx e alto custo de produção.
Além disso, a produção de oleanoginosas não necessita de licenciamento. De acordo com Antenor Pacheco Neto, a Fepam efetua licenciamentos apenas para atividades irrigatórias ou para a plantação de árvores (Silvicultura). “Um cultivo de soja, portanto, não necessita de autorização. O licenciamento é independente do tipo de cultura. Respeita apenas esses dois aspectos”.
Por Tatiana Feldens